Dólar: força da moeda americana tem origem na alta de juros implementada pelo Fed (Manuel Augusto Moreno/Getty Images)
Bloomberg
Publicado em 28 de julho de 2022 às 16h33.
Última atualização em 28 de julho de 2022 às 16h42.
George Boubouras estava em sua casa em Melbourne, na Austrália, assistindo a uma partida de críquete em meados de julho, quando de repente seu telefone não parava de tocar.
Em uma enxurrada de ligações e mensagens de texto, gestores de fundos e operadores do mercado de câmbio queriam saber o que Boubouras, chefe de pesquisa da K2 Asset Management, recomendava que fizessem após o euro despencar para a paridade com o dólar. Sua resposta foi simples: “Não lute contra o dólar agora”.
Pouco mais de 1 hora depois, veio outro solavanco. O Banco do Canadá, lutando como o Banco Central Europeu e outras autoridades monetárias para manter suas moedas estáveis em relação ao dólar, elevou juros em 1 ponto percentual. Quase ninguém previu isso. Dez horas depois, outro choque: o BC de Singapura interveio no mercado de câmbio para se defender contra uma desvalorização da moeda do país.
“Tudo estava acontecendo em um curto período insano”, disse Mitul Kotecha, estrategista da TD Securities em Singapura, que também não parava de receber chamadas e mensagens de texto enquanto descansava com sua esposa na praia de um resort na Tailândia, para comemorar 25 anos de casados. “Não dava para acreditar no caos.”
O dólar, a moeda que impulsiona o comércio global, está em uma alta que tem poucos paralelos na história moderna. Sua força, que resulta principalmente do aumento agressivo de juros do Federal Reserve, já deixou um rastro de devastação: uma disparada nos custos de importação de alimentos que aprofundou a pobreza em boa parte do mundo; um default de dívida que derrubou o governo no Sri Lanka; e perdas para investidores em renda variável e títulos em capitais financeiras de todo o mundo.
É uma alta histórica, de acordo com alguns indicadores que medem a força do dólar contra cestas de moedas. Um desses índices registra um salto de 15% desde meados de 2021. E com o Fed determinado a continuar elevando juros para conter a inflação — mesmo que isso signifique afundar as economias dos EUA e do mundo em recessão — os observadores de longa data do mercado de câmbio internacional não veem muito que se possa fazer para frear esta escalada.
Tudo isso lembra um pouco a campanha anti-inflacionária do Fed liderada por Paul Volcker no início dos anos 1980. É por isso que crescem rumores sobre a possibilidade de um novo Plaza Accord, o acordo que bancos centrais das principais economias industrializadas alcançaram para conter o dólar naquela época.
Um acordo semelhante pode parecer improvável hoje em dia, mas com algumas métricas de mercado sugerindo que o dólar poderia facilmente subir o mesmo tanto novamente — ganhos que causariam convulsões no sistema financeiro global e desencadeariam todo tipo de danos — provavelmente é apenas uma questão de tempo para esse debate esquentar.