"Desembarcamos": por que o alocador de fundos da SulAmérica deixou a classe de crédito privado
Marcel Andrade diz em entrevista à Exame que categoria perdeu a atratividade e que fundos multimercados ainda são uma boa alternativa para portfólios de longo prazo
Marcel Andrade, head de Investiment Solutions da SulAmérica Investimentos: "o crédito privado perdeu a atratividade" (SulAmérica/Divulgação)
Os retornos expressivos nos últimos meses têm impulsionado a captação de investimentos para o crédito privado. Estima-se que, desde o início do ano, mais de R$ 300 bilhões foram alocados em fundos de dívida corporativa. No entanto, para um dos principais gestores da indústria, o momento é de reduzir essa exposição.
Marcel Andrade, Head de Investment Solutions da SulAmérica Investimentos, é responsável pela gestão de investimentos de fundos de pensão e de grandes fortunas. Ele administra R$ 7 bilhões dos R$ 80 bilhões da gestora do grupo SulAmérica. Nos últimos meses, uma parte considerável desse valor foi transferida de fundos de crédito privado para títulos do governo.
“Saímos da categoria de crédito privado, porque os prêmios de crédito não justificam mais a alocação”, afirma Marcel Andrade em entrevista ao Vozes do Mercado.
A forte captação em fundos de crédito elevou o preço desses ativos no mercado e, consequentemente, reduziu o prêmio de risco, que é o retorno acima do CDI. Essa valorização resultou em maior rentabilidade para os fundos, devido ao efeito da marcação a mercado. No entanto, Andrade prevê que os retornos serão menores daqui para frente.
Com excesso de liquidez e necessidade de alocação do capital captado, empresas com boas classificações de crédito – as chamadas high grade – têm emitido dívidas a CDI + 0,4%. Andrade destaca que essa remuneração deve levar os fundos de crédito a render menos que o CDI nos próximos meses, considerando o custo da taxa de administração.
“Não queremos correr risco de crédito, por melhor que seja, se o título não paga uma taxa de juros compensatória. Essa categoria perdeu atratividade”, diz.
Por outro lado, Andrade enxerga com otimismo a remuneração dos títulos do governo atrelados ao IPCA, que chegam a oferecer 6,7% mais a inflação. “É um prêmio bastante relevante para manter essas posições, além de oferecer proteção contra a inflação. É uma excelente oportunidade no segmento de renda fixa.”
Andrade acrescenta que esses títulos governamentais ainda podem se beneficiar da marcação a mercado, caso o prêmio caia no futuro, o que aumentaria seu valor presente. “Não esperamos uma queda significativa desses prêmios nos próximos dois anos, mas movimentos pontuais nesse sentido podem ocorrer.”
"Multimercados ainda são uma boa"
Marcel Andrade também defende os fundos multimercado, que têm sofrido resgates significativos. “Os gestores não desaprenderam a investir. A falta de tendências de mercado nos últimos dois anos tornou a gestão mais desafiadora, mas, em um horizonte de cinco anos, ainda entregam retornos acima do CDI.”
Outro fator que impactou negativamente o desempenho dos fundos multimercado foi a expansão das áreas de atuação após a captação de mais de R$ 200 bilhões em 2021. “Alguns gestores criaram estruturas fora de sua expertise. Agora, essas casas estão retornando ao básico, o que é positivo. Não adianta abraçar o mundo apenas por causa de um forte fluxo de dinheiro.”
Apesar de uma leve melhora na perspectiva dos multimercados, o head da SulAmérica acredita que esses fundos ainda enfrentarão resgates, devido à reestruturação dos fundos exclusivos após a perda da isenção do come-cotas.
Esses fundos tinham uma parte significativa dos recursos alocados em multimercado e, com o desmonte, muitos investidores estão optando por direcionar o capital para outras alternativas, como produtos e fundos isentos. “Migrar para o CDI é tentador, mas, para quem tem um horizonte de longo prazo, os multimercados ainda são uma boa composição para o portfólio”, conclui.