Nicos Anastasiades: presidente do Chipre chegou a ameaçar renunciar, no domingo, se fosse pressionado a ir longe demais, disse uma fonte. (REUTERS/Yiannis Nissiotis)
Da Redação
Publicado em 25 de março de 2013 às 17h48.
Bruxelas/ Nicósia - O Chipre chegou a um acordo de última hora com seus credores internacionais para fechar o segundo maior banco do país e causar grandes perdas a depositantes não assegurados, incluindo russos ricos, em troca de um resgate de 10 bilhões de euros.
O acordo aconteceu horas antes do prazo final para evitar um colapso do sistema bancário em negociações difíceis entre o presidente do Chipre, Nicos Anastasiades, e chefes da União Europeia (UE), Banco Central Europeu (BCE) e Fundo Monetário Internacional (FMI).
Sem um acordo, o sistema bancário do Chipre teria entrado em colapso e o país poderia ter se tornado o primeiro deixar a zona do euro.
Endossado pelos ministros das Finanças da zona do euro, o plano irá poupar a ilha mediterrânea de um colapso financeiro ao fechar o estatal Banco Popular do Chipre, também conhecido como Laiki, e passar depósitos abaixo de 100 mil euros para o Banco do Chipre para criar um "banco bom".
Depósitos acima de 100 mil euros em ambos os bancos, que não são garantidos pela lei da UE, serão congelados e usados para solucionar as dívidas do Laiki e recapitalizar o banco do Chipre por meio de uma conversão de depósitos/ações.
A incursão nos depositantes não garantidos do Laiki deve levantar 4,2 bilhões de euros, afirmou o presidente do Eurogroup, Jeroen Dijssebloem.
O Laiki será efetivamente fechado, com milhares de empregos perdidos. Autoridades disseram que detentores sêniores de títulos no Laiki serão extintos e aqueles no Banco do Chipre terão que fazer uma contribuição.
Um porta-voz da UE disse que nenhuma taxa será imposta sobre depósitos em bancos cipriotas, embora o golpe sobre grandes contas nos dois maiores bancos do país deva ser muito superior do que o inicialmente planejado. Uma primeira tentativa de acordo na semana passada fracassou quando o Parlamento cipriota rejeitou a proposta de um imposto sobre todas as contas bancárias.
Uma fonte do banco central do Chipre afirmou que a maioria dos bancos do país vai reabrir na terça-feira, mas o Banco do Chipre e o Banco Popular farão isso apenas na quinta-feira.
"Todos os bancos, com exceção do Popular e do Banco do Chipre, irão reabrir na terça-feira", disse a fonte.
O Popular e o Banco do Chipre vão reabrir em 28 de março e as restrições de retirada de 100 euros por dia em caixas eletrônicos, adotadas no domingo, permanecerão até lá, completou a fonte.
Consequências
Christos Stylianides, porta-voz do governo cipriota, disse que "evitamos uma falência desordenada que teria levado a uma saída do Chipre da zona do euro, com consequências imprevisíveis".
Ele afirmou a uma rádio estatal que ainda não é possível estimar os prejuízos para correntistas não segurados do Banco do Chipre. "A avaliação é de que será inferior a ou em torno de 30 %. Mas essa é uma estimativa um pouco arbitrária".
O BC do Chipre também disse que o acordo evitou um default desordenado do Laiki.
A Rússia sinalizou que irá apoiar o resgate mesmo que ele imponha grandes perdas a depositantes russos, que têm bilhões em bancos cipriotas.
O presidente Vladimir Putin ordenou ao seu governo que negocie a reestruturação de um empréstimo de resgate concedido ao Chipre em 2011 --após ter rejeitado o pedido de Nicósia por termos mais brandos durante as discussões da crise na semana passada.
Entre os cipriotas comuns, havia um clima de desconfiança com o acordo.
"Quanto tempo irá durar?", questionou Georgia Xenophontos, 23 anos, recepcionista de hotel em Nicósia. "Por que alguém deveria acreditar em algo que esse governo diz?" A chanceler alemã, Angela Merkel, disse que o acordo é o correto para o Chipre porque garante que aqueles que contribuíram para a crise tenham de pagar por sua resolução.
"Estou muito satisfeita que uma solução tenha sido encontrada na noite passada e que tenhamos conseguido evitar uma insolvência", disse Merkel.
Lefteris Christoforou, vice-presidente do partido governista Comício Democrático, disse que o importante é que o Chipre evitou uma bancarrota caótica. "É um mau acordo, mas o cenário extremo com o qual teríamos de lidar era pior".
Ameaça de renúncia
Uma fonte graduada em Bruxelas disse que o presidente do Chipre, Anastasiades, chegou a ameaçar renunciar, no domingo, se fosse pressionado a ir longe demais. Ele deixou a sede da UE sem fazer comentários.
O conservador, que está há cerca de um mês no cargo e enfrenta a pior crise no Chipre desde a invasão turca de 1974, foi forçado a recuar nos seus esforços para blindar grandes correntistas.
Diplomatas dizem que o presidente estava empenhado em preservar o modelo de negócios do país como um centro financeiro "offshore", atraindo enormes quantias de russos e britânicos ricos.
A UE e o FMI exigiram que o Chipre levantasse 5,8 bilhões de euros do seu setor bancário para o seu próprio resgate financeiro, em troca de 10 bilhões de euros em empréstimos internacionais. O chefe do fundo de resgate da UE disse que o Chipre deve receber em maio a primeira verba emergencial.
CONFIANÇA A diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, disse que o acordo é "um plano abrangente e confiável", que lida com o problema central do sistema bancário.
"Esse acordo oferece a base para restaurar a confiança no sistema bancário, que é a chave para amparar o crescimento", disse ela em nota.
O setor bancário do Chipre, com ativos oito vezes maiores do que o tamanho da economia, foi prejudicado pela exposição à Grécia.
Sem um acordo até o final desta segunda-feira, o Banco Central Europeu disse que cortaria os fundos emergenciais aos bancos, potencialmente levando o país a deixar a zona do euro.
Mas nesta segunda-feira o BCE decidiu dar aos bancos cipriotas acesso a fundos de emergência após o país ter selado o acordo.
"Hoje, o Conselho Diretor decidiu não se opor ao pedido de provisão da Assistência de Liquidez Emergencial (ELA, na sigla em inglês) do banco central do Chipre, de acordo com as regras correntes", disse o BCE em comunicado. "O BCE continuará a monitorar a situação de perto", acrescentou a autoridade monetária.