Supermercado Carrefour em São Paulo: Abilio Diniz e um fundo soberano surgem entre os potenciais compradores da oferta privada (Paulo Fridman/Bloomberg)
Da Redação
Publicado em 13 de março de 2014 às 17h22.
São Paulo - O Carrefour avalia uma captação de recursos no Brasil por meio de uma colocação privada de até 5 bilhões de reais em vez de uma oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês), com o empresário Abilio Diniz e um fundo soberano surgindo entre os potenciais compradores, disse à Reuters uma fonte com conhecimento direto do assunto.
Segunda maior rede varejista do país, o Carrefour vê a busca por um investidor privado como uma alternativa mais viável no momento, disse a fonte, que pediu para não ser identificada em função das negociações estarem em curso.
As ofertas públicas de ações no Brasil estão no pior nível desde 2004, segundo dados da Thomson Reuters, refletindo a diminuição da confiança de investidores em meio à deterioração das contas públicas e a oportunidade de investimentos considerados mais atraentes em outras regiões. E não há expectativa de melhora significativa do mercado de capitais local no ano que vem.
Se for adiante, a operação privada representaria uma reaproximação entre o Carrefour e Abilio, após o atual presidente do Conselho de Administração da empresa de alimentos BRF ter tentado costurar em meados de 2011 uma fracassada união entre a rede francesa no Brasil e o Grupo Pão de Açúcar (GPA).
A operação também marcaria um retorno de Abilio ao varejo supermercadista, após a transferência em 2012 do controle da companhia fundada por seu pai, o GPA, ao grupo francês Casino, arquirrival do Carrefour.
No ano passado, Abilio deixou o GPA, vendeu uma parte significativa de suas ações e abriu mão de todos os direitos políticos na maior varejista do país, sendo liberado da cláusula que estabelecia não competição com a empresa.
Agora, o empresário teria se unido à gestora Tarpon Investimentos e a um outro investidor para o negócio com o Carrefour, disse a fonte, acrescentando que as conversas com o grupo estariam "em estágio bem avançado".
Outro interessado em uma fatia do Carrefour seria um fundo soberano estrangeiro, disse a fonte, sem identificá-lo. Uma segunda fonte afirmou que, dependendo da estrutura da oferta, o Carrefour levantaria no mínimo 4 bilhões de reais na transação.
Não ficou claro, na conversa com as fontes, quando poderia ocorrer a oferta privada.
Procurada pela Reuters, a assessoria de imprensa de Abilio afirmou que o Carrefour não é um negócio que está atualmente no radar. O Carrefour Brasil disse que não comenta rumores de mercado, enquanto a Tarpon afirmou que não se pronunciaria.
O presidente global do Carrefour, Georges Plassat, afirmou na semana passada que a varejista avalia abrir o capital no Brasil em 2015, mas que também considerava buscar um investidor local.
No Brasil, o Carrefour conta com a assessoria financeira do Credit Suisse, informou a primeira fonte. Procurado, o banco não se manifestou a respeito do assunto até a publicação da matéria.
As ações do Carrefour zeraram as perdas na bolsa de Paris após a notícia da Reuters sobre uma possível operação privada, mas acabaram cedendo novamente, encerrando a sessão em queda de 1,61 por cento, a 27,14 euros.
RISCOS À OPERAÇÃO A primeira fonte ouvida pela Reuters afirmou que a opção por buscar um investidor privado em vez de um IPO também vem sendo ponderada num momento em que o Carrefour se debruça sobre eventual diminuição do apelo do atacado de autosserviço para os pequenos varejistas, principais clientes desse formato.
Também conhecido como "atacarejo", o segmento segue no centro da estratégia da expansão dos grandes grupos varejistas no Brasil.
Comprado pelo Carrefour há quase sete anos por 1,1 bilhão de dólares, o líder de mercado Atacadão assumiu participação relevante nas operações brasileiras do grupo francês, que entrou no país em 1975.
Qualquer que seja o caminho escolhido para captar recursos, disse a fonte, o Carrefour teme que a venda de uma parte da empresa perca atratividade junto ao mercado caso seja instituída a identificação obrigatória dos consumidores nos atacarejos, após secretarias de Fazenda estaduais terem enxergado no segmento um canal para evasão fiscal.
Como não exigem identificação dos compradores, os atacarejos acabaram virando, na avaliação de alguns Estados, uma opção para pequenos varejistas fazerem compras adicionais depois de ultrapassarem o limite do regime fiscal simplificado, o Simples, que estabelece um faturamento máximo de 3,6 milhões de reais ao ano, ou 300 mil reais por mês.
Fontes do setor estimam que a participação das pessoas jurídicas no faturamento do atacarejo chega, em muitos casos, a 70 por cento.
Segundo o subsecretário da Receita Estadual do Rio Grande do Sul, Ricardo Pereira, a estratégia da evasão é omitir o registro de produtos comprados para também omitir sua venda, buscando a isenção do ICMS ou alíquotas inferiores de tributação.
"O atacado é obrigado a vender com nota eletrônica. Sendo obrigado, ele acaba informando o CNPJ da empresa. Essa entrada vai aparecer e a saída deveria aparecer também", afirmou Pereira. "Uma maneira de esconder esse faturamento é ir numa rede de atacarejo e comprar como pessoa física, a fraude comum é essa", explicou.
Para coibir a prática, as compras acima de 200 reais nos atacarejos do Rio Grande do Sul passaram a exigir CPF ou CNPJ desde 2012. Medida semelhante foi tomada pelo governo de Sergipe no ano passado, onde o limite para compras sem identificação é de 1 mil reais. O Carrefour tem oito lojas do Atacadão nos dois Estados.
No Congresso Nacional, uma das bandeiras defendidas pela Frente Parlamentar Mista dos Agentes de Abastecimento do Pequeno e Médio Varejo é a de tornar obrigatória a inclusão do CPF do comprador em todas as vendas realizadas em atacarejos.
JÓIA DA COROA O Atacadão teve margem de lucro antes de juros e impostos de 6,5 por cento em 2013, contra 3,1 por cento do Assaí, seu principal concorrente e controlado pelo GPA, segundo estudo recente do Espírito Santo Investment Bank, que estima que 75 por cento do lucro do Carrefour no Brasil venha do atacarejo. Na operação de varejo alimentar, o Carrefour teve 2,4 por cento de margem no ano passado, enquanto o GPA apresentou 6,7 por cento em 2013, a maior do setor.
Para o banco, a vantagem do Atacadão se assenta em maior escala. Com um terço a mais de lojas, o atacarejo do Carrefour vende mais que o dobro do Assaí. Além disso, a propriedade dos imóveis onde estão as lojas conta a favor do Atacadão, uma vez que o Assaí aluga boa parte de suas unidades, disse o time de analistas liderado por Richard Cathcart.
O Atacadão contava com 34 lojas quando foi comprado pelo Carrefour em 2007, mesmo ano em que o Assaí passou a ter suas 14 unidades comandadas pelo GPA.
De lá para cá, ambos apostaram em inaugurações: o Atacadão chegou a quase 100 lojas no fim de 2013, ao passo que o Assaí somou 75 unidades.
O investimento é sustentado por forte alta nas vendas. Nos 12 meses encerrados em maio passado, o atacarejo apresentou avanço médio de 17,5 por cento nas vendas, contra 8,4 por cento do autosserviço em geral, segundo dados mais recentes da Nielsen divulgados pela associação de supermercados, Abras.