Fabio Akira: economista-chefe da Blueline (Blueline/Divulgação)
Guilherme Guilherme
Publicado em 9 de fevereiro de 2021 às 06h00.
Última atualização em 9 de fevereiro de 2021 às 06h28.
Investidores estrangeiros colocaram 80,13 bilhões de reais a mais do que retiraram da bolsa brasileira entre outubro e início de fevereiro, sem considerar a entrada em ofertas públicas iniciais (os IPOs). A quantidade supera em 5% todo o valor retirado nos seis primeiros meses de 2020. Mas esse capital ainda é "pequeno" e "especulativo". É o que afirma Fabio Akira, economista-chefe da gestora BlueLine e ex-economista chefe do JPMorgan Brasil, em entrevista à EXAME Invest.
"É um fluxo pequeno se comparado à exposição que [estrangeiros] já tiveram tanto na bolsa quanto no mercado de renda fixa. Mas é óbvio que, em um mercado como o do Brasil, mesmo um fluxo pequeno de um institucional estrangeiro já ajuda bastante", afirma.
Segundo o economista, que acompanhou toda a chegada de investidores estrangeiros em meados da década de 2000, a entrada definitiva do capital estrangeiro só virá com melhora dos fundamentos fiscais. "Se houver retomada de agenda de reformas e estabilidade política, o potencial de entrada é muito maior do que vimos até agora."
Motivado pelas incertezas fiscais, o próprio fundo multimercado da BlueLine chegou a manter apenas 5% de seu portfólio de risco no Brasil. O retorno se deu junto com investidores estrangeiros, no fim do ano passado, mas também de forma apenas especulativa. "Quando a maré está subindo, todos os barcos sobem juntos, independentemente de estar com o motor bom ou ruim", conta. "E o Brasil tinha ficado para trás no começo do rali."
Akira ainda vê um momento positivo neste início de ano, mas diz que a maré já parou de subir. "[O mercado está] mais seletivo, porque alguns ativos já subiram demais. Estamos reduzindo a exposição no mercado americano e de commodities e se concentrando em oportunidades mais estáveis. Nesse ponto de vista, a Ásia permanece como uma ótima opção", diz.
Confira a entrevista de Fabio Akira à EXAME Invest.
Como a BlueLine tem estruturado seu portfólio nos últimos meses?
Nos últimos seis meses, 25% do nosso risco ficou concentrado em Brasil e 75% ficou no resto do mundo. Mas em determinados momentos em que a crise fiscal e política estava mais aguda, chegamos a ter só 5% do risco em Brasil e 95% no resto do mundo.
Do ponto de vista de mercados, nos últimos seis meses, alocamos 60% do risco em bolsa, 20% em juros e 20% em câmbio. Porém tentamos nos adequar e montar portfólio de acordo com o cenário e oportunidades. No primeiro semestre de 2020 estávamos com 80% em juros, mas de forma diversificada, com juros do México, por exemplo.
Quando aumentaram exposição em bolsa, para quais mercados vocês foram?
No meio do ano, fizemos uma aposta grande de que o Joe Biden iria ganhar [as eleições americanas] e haveria um pacote fiscal parrudo e menos riscos geopolíticos, principalmente com a China. Nos posicionamos muito em bolsas asiáticas, principalmente da China e da Coreia do Sul.
Os dois países também estavam manejando muito bem a redução da primeira onda do vírus. Era uma leitura que tinha a ver com a pandemia, com o risco geopolítico e com a visão de crescimento de médio e longo prazo desses mercados. Isso deu supercerto com vitória do Biden.
Mas logo em seguida veio o segundo evento do ano, que foi a eficácia da vacina e o início da distribuição. Aí tem uma lógica diferente. A eleição americana tem drivers muito específicos e mercados mais beneficiados. A vacina, não. Pelo menos naquele momento, a euforia gerava uma performance melhor em praticamente todos os mercados de risco.
E quando a maré está subindo, todos os barcos sobem juntos, independentemente de estar com motor bom ou ruim. Nesse momento, voltamos a colocar risco no Brasil porque tinha ficado para trás do começo do rali. Também fomos para o mercado de commodities.
E agora?
Ainda parece ser um mercado de tomada de risco, mas volta a ser mais seletivo, porque alguns ativos já subiram demais. Então estamos reduzindo a exposição no mercado americano e de commodities e se concentrando em oportunidades mais estáveis. Nesse ponto de vista, a Ásia permanece como uma ótima opção.
Imagino que vocês tenham investido em juros do México por estarem mais altos que os do Brasil. Com a esperada elevação da taxa Selic, o investidor estrangeiro deve entrar a ponto de valorizar o real?
Só a sinalização de aumento de juros não é suficiente para atrair o investidor estrangeiro de maneira consistente. O que precisa haver é uma melhora dos fundamentos fiscais. Além da retomada da agenda de reformas, precisa haver uma maior clareza sobre como enfrentar a segunda onda [de coronavírus] e como equilibrar os gastos com auxílio emergencial para a população que vai precisar. São todas incógnitas que permanecem.
Agora, [o aumento da taxa Selic] sempre ajuda a atrair um fluxo de curto prazo. É um fluxo um pouco mais especulativo, mas que pode limitar a piora no momento em que o mundo não está muito bem. O que estava acontecendo com a moeda brasileira é que, quando o mundo ia mal, todas as moedas iam mal e o real ia ainda pior.
E quando o mundo estava bem, as moedas melhoravam e o real não melhorava tanto. A perspectiva de alta de juros limita um pouco essa pior performance do real, mas o crucial são os fundamentos de médio e longo prazo.
Esse maior otimismo pela aprovação de reformas agora que o governo tem aliados nas presidências do Senado e da Câmara contribui para a entrada de estrangeiros?
Isso pode trazer fluxo de curto prazo e posições mais táticas. Mas o investidor estrangeiro quer esperar uma solução definitiva. Ele já passou por várias fases de crenças e alinhamentos de reformas que acabaram não se concretizando. Está um pouco calejado com isso e não vai vir definitivamente enquanto esse quadro não estiver esclarecido.
Desde outubro temos visto forte entrada de estrangeiros na bolsa. É apenas algo passageiro?
É uma posição mais especulativa. Em um cenário de retomada de vacina, de crescimento global forte e em que outros ativos já começaram a ficar mais caros, eles olharam as possibilidades e viram que o Brasil estava superbarato. Se o risco fiscal iminente ou de quebra fiscal está afastado no curto prazo, vale a pena colocar uma aposta pequena no Brasil.
Mas é um fluxo pequeno se comparado à exposição que já tiveram tanto na bolsa quanto no mercado de renda fixa. Porém é óbvio que, em um mercado como o do Brasil, mesmo um fluxo pequeno de um [investidor] institucional estrangeiro já ajuda bastante. Se houver retomada de agenda de reformas e estabilidade política, o potencial de entrada é muito maior do que vimos até agora.
O Brasil ainda está superbarato ou depois desse último rali já nem tanto?
Estava barato entre outubro e novembro. Mas os tiros são curtos. Teve uma apreciação forte da bolsa e da taxa de câmbio e, já na virada de ano, os ativos já se depreciaram, com uma oscilação um pouco maior no mercado internacional e alguns riscos de curto prazo na parte fiscal. Então, parece que não está barato o suficiente e que o investidor estrangeiro enxerga uma instabilidade muito grande no país.