Ouro negociado na B3 possui lastro no metal físico e fica custodiado no Banco do Brasil. (foto/Thinkstock)
Tais Laporta
Publicado em 7 de outubro de 2019 às 08h32.
Última atualização em 7 de outubro de 2019 às 10h48.
A corrida por proteção vem impulsionando o ouro negociado na B3. O volume saltou 44% nos primeiros 8 meses do ano na comparação com o mesmo período de 2018. Somente em agosto, os contratos de 250 gramas do metal precioso somaram 123,4 milhões de reais. Foi mais que o triplo da média dos meses anteriores, ainda que a quantia seja irrisória perto de outros mercados. Segundo fontes que acompanham o setor, o crescente apetite dos fundos no Brasil está por trás deste aumento.
Visto como um dos ativos mais seguros em períodos de crise – e “Patinho Feio” dos investimentos quando tudo vai bem – o ouro vem atraindo um interesse crescente no mundo. A cotação subiu 30% no ano e encostou no pico histórico de seis anos atrás, na casa dos 1500 dólares por onça-troy (unidade usada na Comex, a divisão de metais da New York Mercantile Exchange, equivalente a 28 gramas). O movimento foi puxado principalmente pelos Bancos Centrais de países como China, Rússia e Índia, que venderam suas reservas em títulos públicos e passaram a comprar mais ouro, à medida que os juros ficaram menos atrativos. A piora na rixa entre Estados Unidos e China também acelerou este processo.
À agência Bloomberg, o megainvestidor Mark Mobius recomendou que os investidores tenham pelo menos 10% de ouro no portfólio. “A surpresa da guerra comercial e o afrouxamento das políticas monetárias no mundo foram os maiores motivadores da apreciação no ouro”, diz Fernando Fridman, responsável pela área de produtos da Ourinvest DTVM. Neste ambiente de aversão ao risco, fundos brasileiros aumentaram a exposição em ouro para oferecer um hedge (proteção) aos cotistas – ao mesmo tempo em que apostaram em ativos de risco para obter um retorno satisfatório.
Também cresceu o interesse daqueles que viram a cotação do ouro subir e passaram a procurar fundos posicionados no metal, dizem fontes do setor. O governo brasileiro não aumentou suas reservas como outros países, mas o movimento no exterior influenciou o mercado local. A cotação do ouro no Brasil acompanha os preços da onça-troy no mercado internacional, mas aqui ela sofre o diferencial do dólar. Ou seja, quando ele valoriza, o ouro vale ainda mais.
Na bolsa brasileira, o ouro negociado na B3 possui lastro no metal físico e fica custodiado no Banco do Brasil. Os lotes de 250 gramas são comprados majoritariamente por investidores institucionais. Já os fracionários são acessíveis a pessoas físicas, mas pouco negociados, já que elas costumam investir por meio dos fundos. O número de lotes do ouro à vista na B3 aumentou para até 70 por dia, ou cerca de 7 quilos, nos últimos dois meses.“Em época de calmaria, não chegava a 10 lotes diários”, compara o gerente de câmbio da Ourominas, Mauriciano Cavalcante. Parte deste aumento ele atribui ao roubo de 750 quilos do metal no aeroporto de Cumbica, em São Paulo, em julho. Segundo Cavalcanti, isto se deve ao fato de o país ser um dos poucos que negociam ouro físico em bolsa. “Existem muitos joalheiros e poucas empresas que compram ouro e vendem para eles no Brasil”, explica Cavalcante.
Na Órama Investimentos, o fundo que aplica exclusivamente em ouro da B3 multiplicou seu patrimônio para 147 milhões de reais, ante uma média de 47 milhões nos últimos 12 meses. Este aumento foi puxado por pessoas físicas, diz a consultora de investimentos da corretora, Sandra Blanco. A captação do fundo também cresceu, segundo ela, graças aos aportes feitos por outros fundos multimercados que passaram a ter exposição ao metal na carteira, em busca de proteção. Ao notar que os BCs começaram a aumentar suas reservas no metal, a gestora Novus se antecipou e passou a comprar ouro no final do ano passado, direto de Nova York. A preferência pelo ouro negociado no exterior é a liquidez (facilidade em comprar ou vender), diz o gestor Ricardo Kazan, da Novus. “Vimos que a desaceleração global levaria a este movimento”, diz Kazan. Em agosto, a gestora zerou sua posição em ouro, justamente quando o interesse pelo ativo disparou, mas não descarta voltar a investir no metal, caso o cenário global dê novas mostras de piora.
A Vitreo, gestora que tem o filho de Paulo Lemann entre seus fundadores, lançou em setembro um fundo 100% lastreado em ouro. A captação ficou em torno de 6 milhões nos dois primeiros dias. O sócio da gestora George Wachsmann diz que o lançamento do produto coincidiu com o novo pico do ouro. O propósito do fundo é servir como uma espécie de seguro para compor carteiras de perfil mais arrojado. “A ideia é correr mais risco, desde que tranquilo com a proteção trazida pelo ouro”, diz Wachsmann. Mesmo com o bom momento do metal – que costuma ir bem quando o resto vai mal – ele diz torcer para não precisar depender deste seguro.