Bitcoin: valorização de mais de 170% no ano (Mark Blinch/Reuters)
Da Redação
Publicado em 2 de junho de 2017 às 12h05.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h06.
David Cohen
Para quem gosta de montanha russa, o mercado de bitcoins este mês tem sido um prato cheio. A cotação da moeda virtual passou de 1.220 dólares, no final de abril, para 2.800 dólares, na quinta-feira, dia 25, uma alta de assombrosos 130%.
Depois, em uma semana, uma correção de rumo levou a cotação para cerca de 2.400 dólares, uma queda de quase 15% – equivalente ao sumiço de 2,4 bilhões de dólares no valor de mercado do Bitcoin (de 40,5 bilhões para 38,1 bilhões de dólares).
Mesmo com a correção, porém, o bitcoin é de longe a moeda mais valorizada do ano (a coroa islandesa é a segunda, com 16% de ganho). O que levanta, obviamente, algumas suspeitas.
Será uma nova bolha?
A movimentação explosiva da cotação do bitcoin nos últimos seis meses lembra a alta que ocorreu entre outubro e dezembro de 2013, quando o preço subiu de 130 dólares para mais de 1.100 dólares. Não durou muito. Uma correção, seguida de um longo declínio, levaram a moeda à cotação de 200 dólares no espaço de um ano. Desde então, ela vinha tendo um crescimento constante, mas moderado.
O que explica essa súbita febre de bitcoins? Ninguém sabe ao certo, mas há uma série de suspeitos, que provavelmente agem em conjunto.
O primeiro deles é, provavelmente, a falta de outras opções. Com a economia mundial em persistente crise, há poucas alternativas que garantam um retorno seguro do investimento. Nessas condições, uma parcela crescente dos investidores tem recorrido ao que lhes resta: a especulação. Os riscos são maiores, mas pelo menos há movimento. Nesse cenário, a volatilidade do bitcoin se torna uma qualidade, não um defeito.
Compondo com este primeiro motivo, vem um segundo: por ser uma moeda independente de bancos centrais e autoridades governamentais, o bitcoin sempre atraiu as transações mais nefastas, como o comércio ilegal de drogas e armas ou, mais recentemente, a chantagem dos hackers (o golpe que assolou o mundo inteiro há poucas semanas consistia em travar computadores por meio de um vírus e exigir como resgate a transferência de bitcoins para os malfeitores). Mas a moeda virtual não serve apenas aos facínoras.
Quando países resolvem apertar o cerco financeiro a seus cidadãos, muitos deles tratam de recorrer aos mecanismos que encontram para preservar seus investimentos. A bolha do bitcoin de 2013 teve uma grande ajuda do Chipre, que fechou suas fronteiras financeiras, levando várias entidades que usavam o país como paraíso fiscal a buscar modos de retirar dinheiro de lá.
Agora, a crescente pressão econômica na China tem freado a liberalização financeira, o que pode estar contribuindo para o aumento da procura de bitcoins por parte de chineses que procuram alternativas ao enfraquecimento do iuan.
Os motivos para a alta
Não são só os especuladores que apostam no bitcoin. A motivação mais, digamos, virtuosa para comprar a moeda virtual é a crença de que ela representa o mecanismo de troca do futuro.
Foi para isso que ela foi criada, por um libertário que se manteve incógnito, apresentando-se ao mundo apenas pelo pseudônimo de Satoshi Nakamoto. A essência do bitcoin é que ele dispensa a regulação de um agente financeiro – a segurança das transações é garantida pelo blockchain, um bloco de documentos criptografados e verificados por uma rede de computadores independentes (os “mineiros”, que recebem uma taxa, em bitcoins, por “garimparem” os documentos para verificá-los).
Esse sistema não agrada muito aos governos, por temor de perda do controle do sistema financeiro. No limite, o sistema do bitcoin poderia promover a total informalização da economia, possibilitando um amplo desvio de impostos.
A elegância do sistema, porém, pode cortar vários custos das transações, financeiras ou não. Acredita-se que o blockchain vá encontrar seu lugar na gestão de saúde, no registro de propriedades, na administração de pessoal, enfim, em inúmeras atividades que hoje requerem um controle centralizado.
E por isso ele vem ganhando terreno paulatinamente. Alguns desses avanços podem ter ajudado a precipitar a valorização da moeda.
Um deles foi a legalização do bitcoin no Japão, em abril. O governo decidiu permitir que a moeda seja aceita no varejo, e a gigante Bic Camera foi a primeira a adotar o bitcoin. Na Rússia, a Ulmart, o maior varejista do país, anunciou que começaria a aceitar bitcoins, embora o governo tenha dito que não regularizará a moeda antes de 2018.
Num movimento ainda mais significativo, a gestora de investimentos Fidelity, cujos fundos somam cerca de 2,2 trilhões de dólares, passou a aceitar o bitcoin em sua cantina. “Eu estou num negócio de serviços financeiros tradicional”, disse a executiva-chefe do Fidelity, Abigail Johnson. “Mas nós do Fidelity podemos ver que a evolução tecnológica está preparando nossa indústria para uma ruptura.”
O Fidelity já fez alguns investimentos em iniciativas ligadas à bitcoin e colocou alguns computadores para fazer o serviço de “mineiros” da moeda. Outro forte sinal de que o bitcoin vem ganhando respeito é a tendência de várias startups de lançarem, em vez de uma oferta inicial pública de ações (IPO, na sigla em inglês), uma oferta inicial de moedas (ICO).
No lugar de oferecerem ações da companhia, essas empresas lançam uma moeda virtual – que pode ser o bitcoin ou uma similar, própria – que teoricamente poderão ser usadas no futuro, no mercado que a companhia criar. (Esse movimento de financiamento por fora do mercado acionário já preocupa autoridades e agentes financeiros, pelo potencial conflito com as regras financeiras existentes.)
Vai estourar ou subir mais?
Finalmente, mas não menos importante, um grande número de organizações que lidam com o bitcoin chegaram na semana passada a um acordo para diminuir o tráfego nas validações de negócios virtuais.
Este é um problema que aflige a comunidade Bitcoin há muito tempo. Como os blocos dependem da mineração para ser validados, as taxas precisam ser suficientemente altas para atrair a atenção das redes de computadores que se dedicam a decifrar os códigos do Blockchain.
Este mercado está longe de ser rápido. Durante este mês, o número de transações aguardando validação chegou ao recorde de 200.000 (agora esse número está por volta dos 80.000).
Depois de anos de briga, chegou-se a um quase consenso de adotar uma tecnologia (SegWit) para retirar parte das informações, que não sejam críticas, do Blockchain, criando espaço para mais transações por bloco. Também ficou definido que o tamanho dos blocos vai dobrar, dentro de alguns meses, para 2 megabytes.
“Acredito que essa valorização tenha a ver com o fim do impasse sobre como ganhar escala no mercado de bitcoins”, disse Andrew Keys, chefe de uma empresa de software de Blockchain, à TV CNBC
Apesar de todos esses motivos, não se deve esquecer que o mercado de bitcoins é altamente volátil porque pouca gente entende a tecnologia ou tem clareza sobre seu potencial. Isso faz com que os agentes sejam propensos a reações emotivas, exageradas tanto para cima quanto para baixo.
Uma evidência disso é que não foi apenas o bitcoin que subiu de forma estonteante nas últimas semanas. Uma ampla gama de moedas virtuais (chamadas de criptomoedas, porque todas têm em comum a criptografia como forma de segurança) teve altas e quedas seguindo o mesmo padrão do bitcoin – embora sejam muito diferentes umas das outras.
O próprio fato de haver mais de 830 moedas virtuais, segundo o jornal Financial Times, que em boa parte floresceram graças ao fenômeno dos ICOs, já dá a impressão de que estamos vivendo uma bolha.
Há quem preveja, com base no movimento de 2013, que o bitcoin ainda vá cair bem mais do que despencou nos últimos dias. É pouco provável, no entanto, que se repita o mesmo padrão de três anos e meio atrás, porque o mercado do bitcoin está bem mais robusto agora.
“Eu acho que a queda foi apenas um movimento de realização de lucros, depois da explosão de preços da semana passada”, afirmou um corretor de bitcoins à CNBC.
De fato, vários investidores parecem estar apostando numa nova rodada de altas. O número de posições longas (quando o investidor pega um empréstimo para comprar agora, acreditando que a valorização do papel lhe permitirá pagar a dívida e embolsar a diferença de preço) subiu de 18.500 para 21.200, de acordo com o site CryptoCompare.
Há quem preveja que a moeda ainda vai dobrar de valor até o final do ano.