Eleições e aumento do juros nos Estados Unidos estão entre os principais eventos que devem mexer com os mercados em 2022 | Foto: Nora Carol Photography/Getty Images (Nora Carol Photography/Getty Images)
Guilherme Guilherme
Publicado em 25 de dezembro de 2021 às 08h00.
Se 2021 já não foi um ano fácil para quem investe, com muita volatilidade e queda nos preços de ativos, 2022 promete ser ainda mais desafiador, especialmente no Brasil com as eleições presidenciais em outubro. Isso sem contar o combate mundial à pandemia, em meio ao avanço da vacinação e ao surgimento de novas variantes.
Com a expectativa de incertezas políticas, econômicas e externas, 2022 terá decisões cruciais para o país e o mundo. Entender suas possíveis consequências será fundamental para o futuro de seus investimentos.
A partir da consulta com especialistas, a EXAME Invest separou os cinco principais eventos do ano que vão impactar o mercado financeiro e, por tabela, os preços dos ativos.
Com a inflação se mostrando mais persistente do que a esperada no mundo, os bancos centrais têm revisado suas políticas de estímulos na tentativa de conter a alta de preços. Nos Estados Unidos, onde a inflação ao consumidor roda no nível mais alto desde a década de 1980, o Federal Reserve (Fed) já acelerou a retirada do programa de recompra de títulos, o tapering.
O presidente do Fed, Jerome Powell, disse que já não se pode dizer que a inflação é “transitória” e o próprio Fed disse em sua última reunião que o tapering deve se encerrar em março, antes do que havia sido originalmente planejado, no meio do ano.
O fim do tapering significa a deixa para o Fed começar a subir juros nos Estados Unidos, como forma de amenizar as pressões inflacionárias. Segundo o BC americano, serão três altas até o fim de 2022.
Com juros mais altos nos Estados Unidos, o maior apetite pelos títulos americanos -- considerados os mais seguros do mundo -- deve afetar os fluxos de investimentos para economias emergentes como a brasileira.
Na bolsa, a mudança das condições monetárias tende a ter maior impacto em ações com múltiplos mais elevados, em que o preço já inclui as expectativas de forte crescimento para os próximos anos.
Outubro de 2022 promete ser crucial para o futuro do país, com o primeiro turno das eleições presidenciais e o pleito para a Câmara e para um terço do Senado no primeiro domingo do mês, no dia 2. Mas os efeitos da disputa devem ser sentidos ao longo de todo o ano, com a esperada paralisação do andamento de pautas econômicas (especialmente impopulares) e partir do segundo trimestre e o aumento da volatilidade do mercado local.
De acordo com as pesquisas eleitorais mais recentes, o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva são os principais candidatos, com liderança do petista. Tudo indica uma eleição polarizada, mas, entre investidores, a esperança é pelo fortalecimento de uma “terceira via” com discurso moderado e uma política liberal, que poderia ser o ex-juiz Sergio Moro ou o governador de São Paulo, João Doria.
O fortalecimento de um candidato da terceira via teria o potencial de servir como um trigger -- um gatilho -- para a redução dos descontos nos preços dos ativos no mercado brasileiro. Foi o que aconteceu de certa forma há quatro anos.
Em outubro de 2018, quando Bolsonaro -- que até então contava com a confiança do mercado por causa do hoje ministro Paulo Guedes -- assumiu o protagonismo nas pesquisas eleitorais para o segundo turno, o Ibovespa chegou a subir mais de 10%. Entre julho daquele ano e janeiro de 2019, o principal índice da B3 subiu perto de 35%.
No Brasil, onde o movimento de alta de juros teve início ainda no primeiro semestre de 2021, investidores debatem até qual estágio o Banco Central irá elevar a taxa Selic. Somente neste ano, a Selic passou da mínima histórica de 2% para 9,75% ao ano, o maior patamar desde 2017.
Entre investidores, a expectativa é a de dois novos reajustes nas taxas de juros em 2022, encerrando o ciclo de alta em março. A dúvida está na magnitude. Quanto maior, menor tende a ser a atividade econômica.
As projeções apontam uma inflação ligeiramente acima do teto da meta em 2022, que é de 5,00%, e acima do centro da meta 2023, que é de 3,25%. Nas últimas semanas, no entanto, a divulgação de dados de inflação abaixo do esperado pelo mercado começou a levar as expectativas para baixo -- ou ao menos a conter a trajetória de alta.
Um BC com política monetária menos hawkish (rigoroso) pode levar a uma taxa de juros que acomode um certo nível de atividade econômica compatível com um crescimento leve em 2022. Mas tudo ainda está muito incerto.
Considerado o principal evento político da China, o 20º Congresso Nacional do Partido Comunista da China (PCCh) será realizado em outubro de 2022 e definirá o Secretário Geral do PCCh. A grande expectativa é que o atual secretário, Xi Jinping, seja reconduzido ao cargo, abrindo caminho para também renovar seu mandato de presidente.
A dúvida é quanto a uma possível sinalização de que Xi Jinping desejaria abandonar o posto em 2027, data do Congresso do Partido Comunista seguinte, quando já estaria com 74 anos de idade e 14 à frente do país.
A proximidade do Congresso pode levar o governo de Pequim a reduzir as restrições à atividade, em busca de uma economia mais pujante, com reflexos importantes para o mundo. O Brasil, por exemplo, e empresas exportadoras como a Vale (VALE3) podem se beneficiar de uma retomada da demanda por matérias-primas.
No mercado, investidores temem que o fortalecimento da dinastia Jinping signifique mais regulamentações sobre o setor privado chinês e intervenções em algumas das maiores companhias do país. Nos últimos meses, gigantes de tecnologia como Alibaba, Tencent e Didi sofreram com medidas de regulação do governo chinês.
O caso da Didi foi ainda mais extremo. Meses após abrir ser listado no mercado americano, na Bolsa de Nova York, os aplicativos da empresa chegaram a ser banidos da China sob alegações de insegurança cibernética. Há poucas semanas, menos de seis meses depois do IPO, a empresa anunciou a deslistagem de Wall Street.
Para o próximo ano, contudo, parte do mercado espera um arrefecimento das pressões sobre o setor privado, mantendo o ambiente estável para o evento político que se aproxima.
As discussões sobre a retirada de estímulos também seguem presentes nas mesas do Banco Central Europeu (BCE). A diferença está no estágio dos debates. Por lá, a alta de preços já se aproxima de 5 % no acumulado de 12 meses. Mas, depois de uma década sem que a inflação ao consumidor superasse 3% e até o fantasma da deflação fosse temido, o BCE tem sido mais cauteloso quanto à retirada de estímulos.
Mesmo após o Fed aposentar o termo “transitório” ao falar de inflação, a presidente do BCE, Christine Lagarde, tem insistido na tese de que a alta de preços é passageira e que a economia ainda precisa de suporte.
Com a inflação europeia no maior patamar em 30 anos, parte dos investidores já aposta na alta de juros do BCE no próximo ano, ainda que as sinalizações de Lagarde tenham ido em outra direção.
Enquanto mantém a maior cautela com a retirada de estímulos, o BCE tem visto o euro se desvalorizar, com investidores migrando para os Estados Unidos, onde as expectativas de aumento de juros estão mais claras.