Manifestações na avenida Paulista no dia 7 de setembro, de apoio ao governo de Jair Bolsonaro | Foto: Eduardo Frazão/EXAME (Eduardo Frazão/Exame)
Guilherme Guilherme
Publicado em 9 de setembro de 2021 às 08h46.
Última atualização em 9 de setembro de 2021 às 23h21.
As manifestações desta semana elevaram as tensões políticas em Brasília, com maiores preocupações de uma ameaça golpista após ataques do presidente Jair Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal (STF). Durante os atos de 7 de setembro, o chefe do Executivo chegou a dizer que não iria cumprir decisões judiciais do ministro Alexandre de Moraes, responsável pelo inquérito das fake news. A declaração provocou reações.
Enquanto no Congresso cresceu a pressão para a abertura de um processo de impeachment de Bolsonaro, no STF, o presidente da Corte, Luiz Fux, saiu em defesa de seus pares. Na véspera, o ministro classificou o desprezo às decisões judiciais como crime de responsabilidade, “além de representar atentado à democracia”.
Já no mercado, a bolsa brasileira teve a maior queda desde março e o dólar a maior alta em mais de um ano.
Entre riscos à democracia e possibilidade de impeachment, no mercado, a interpretação é que o aumento das turbulências políticas irá atrasar -- ou inviabilizar -- o andamento de pautas econômicas, como a do parcelamento de precatórios e a reforma administrativa.
“O mercado demorou muito para reagir ao cenário político. O que o Bolsonaro fez no 7 de setembro estava pré-anunciado, mas o tiro saiu pela culatra e fortaleceu a possibilidade de impeachment. Se tiver apoio para isso, o ambiente deve ser de ainda mais estresse, embora acredite que sua saída seria melhor para a bolsa”, afirma Alison Correia, CEO da TOP Gain.
Para Jefferson Laatus, estrategista-chefe e sócio-proprietário do Grupo Laatus, o dólar deve seguir pressionado pelas tensões políticas e pode ser uma alternativa para se proteger da aversão ao risco no mercado brasileiro.
“A inflação mais alta tem feito o BC ser mais agressivo na alta de juros, o que favorece investimento atrelado à renda fixa. Mas, a instabilidade fiscal e política mina a confiança do investidor estrangeiro. Há muitas complicações em investir no país no momento atual”, diz Laatus. “A melhor proteção é o dólar.”
Mesmo com a taxa de juros subindo de 2% para 5,25% desde janeiro, no último pregão, a moeda brasileira voltou a registrar perdas no acumulado do ano. Somente neste semestre, a valorização do dólar frente ao real já supera 7%.
Além do câmbio, o ambiente político atinge diretamente a bolsa de valores, que tem um dos piores desempenhos do mundo. Enquanto os principais índices internacionais seguem próximos de suas máximas históricas, o Ibovespa está 13,5% abaixo de seu maior patamar, com perda de 4,70% neste ano. Nos Estados Unidos, o índice S&P 500, referência para o mercado de ações global, tem alta de 20% no mesmo período.
Com o aumento da tensão política e ameaças de nova greve dos caminhoneiros, as ações da Petrobras (PETR3/PETR4), com a segunda maior participação do Ibovespa, deve seguir pressionando o índice. No último pregão, os papéis da estatal despencaram 5,5%.
“Bolsonaro tem proximidade com os caminhoneiros e tende a tomar decisões favoráveis a eles. A queda [de ontem] reflete a incerteza sobre a companhia, que pode ser usada como plataforma de ganho de apoio popular”, afirma o analista Henrique Esteter.
Nesse cenário, são justamente as empresas estatais que Pedro Serra, gerente de análise da Ativa, prefere ficar de fora. “Eu evitaria Banco do Brasil (BBAS3), Petrobras e Eletrobras (ELET3/ELET6), além de Caixa Seguridade (CXSE3) e BB Seguridade (BBSE3), que tem participação indireta do Estado. Essas empresas podem sofrer bastante com a volatilidade”, disse.
Embora vejam um cenário ainda pior para as estatais, especialistas ainda apontam o setor de construção civil entre os que devem ser mais atingidos pela piora da percepção dos riscos locais.
“Com o dólar em alta, nossas commodities se tornam mais competitivas no mercado internacional, aumentando os custos de matéria prima de construção. Ao mesmo tempo, os juros futuros sobem, pressionando a demanda por imóveis”, diz Esteter.
No setor, Pedro Serra tem uma preocupação ainda maior com as construtoras voltadas para o público de baixa renda, mais dependentes de programas do governo, como o Casa Verde e Amarela (Ex-Minha Casa, Minha Vida). “Estou falando de Tenda (TEND3) e MRV (MRVE3). A Direcional (DIRR3) tem exposição a isso, mas lançou uma nova marca, a Riva, para se distanciar dessa questão.”
Por outro lado, ações de empresas exportadoras podem se beneficiar pela alta do dólar, podendo ser uma opção para aqueles que buscam se proteger no mercado acionário. Ainda assim, Henrique Esteter alerta que os retornos de curto prazo podem não ser expressivos.
“As exportadoras são as únicas vencedoras dessa história, porque se beneficiam da depreciação do real. Mas a maior insegurança de investir no país reduz o fluxo de estrangeiros para a bolsa. Então, mesmo com resultados melhores, o impacto da alta do dólar nas ações seria mais fraco.”
Entre as principais exportadoras da bolsa estão Vale (VALE3), JBS (JBSS3), Marfrig (MRFG3), Suzano (SUZB3), Klabin (KLBN11) e WEG (WEGE3). Porém, antes de sair comprando para surfar na alta do dólar, Jefferson Laatus sugere uma análise minuciosa, já que fatores externos podem ter fortes impactos nos preços das ações.
“Comprar exportadores de boi pode ser preocupante, com casos de vaca louca no país. Isso já levou a China a cortar importações. Já a Vale depende muito da cotação do minério de ferro”, comenta.
Outra opção, diz Pedro Serra, seria aproveitar a queda de preços para fazer investimentos em ações para o longo prazo. “Gosto de empresas que conseguem caminhar com as próprias pernas, que o crescimento depende mais delas do que do governo.”
Entre elas, o chefe de análise da Ativa cita varejistas como Renner (LREN3), Arezzo (AREZ3), Magazine Luiza (MGLU3) e BR Distribuidora (BRDT3). “O governo, obviamente, pode ajudar ou atrapalhar essas empresas, mas dependem menos disso”