Paul O'Connor, head de multiativos da Janus Henderson: ações na Europa tendem a se desvalorizar mais com conflito (Janus Henderson Investors/Divulgação)
Marília Almeida
Publicado em 8 de março de 2022 às 06h00.
Última atualização em 8 de março de 2022 às 07h05.
A guerra da Rússia contra a Ucrânia pode afetar o seu bolso. E não apenas porque os preços de alimentos e da gasolina podem subir. Um choque dessa magnitude na economia global também afeta as aplicações financeiras.
Paul O'Connor, head de multiativos da gestora global Janus Henderson, do Reino Unido, explicou em entrevista à EXAME Invest quais aplicações financeiras devem se desvalorizar mais em razão do conflito e qual pode ser a extensão de seus efeitos nas bolsas e na economia global.
Veja a seguir a entrevista:
Quais são os maiores efeitos do conflito entre Rússia e Ucrânia na carteira do investidor?
O impacto direto do conflito no crescimento global deve permanecer modesto, se o progresso puder ser feito em direção à redução da escalada nas próximas semanas.
Embora as tensões permaneçam localizadas na Ucrânia, as repercussões econômicas globais provavelmente serão dominadas pela escala e pela duração do aumento dos preços das commodities, reforçadas por quaisquer impactos adversos na confiança das empresas e do consumidor.
Embora tenhamos visto movimentos bruscos nas commodities nas últimas semanas, seu impacto direto no crescimento e na inflação provavelmente só será considerável se o conflito se estender por muitos meses.
Como regra geral, os economistas pensam que um aumento sustentado de US$ 10 no preço do petróleo reduziria em 0,1 ponto percentual o crescimento real do PIB dos Estados Unidos.
É claro que outras commodities também estão subindo, mas o impacto sobre o crescimento será, em certa medida, compensado pelo repensar com viés dovish [mais suave] que emerge nas políticas do banco central americano.
A dependência da Europa das commodities russas significa que as repercussões econômicas adversas do conflito são consideravelmente maiores no continente do que em qualquer outra região. Um conflito prolongado com impacto de vários meses nos preços das commodities e na confiança econômica pode reviver os riscos de recessão e corroer ainda mais a confiança nos ativos europeus.
Esses efeitos são suficientes para exigir alterações ou um novo balanceamento da carteira, especialmente da fatia de investimentos no exterior?
O impacto do conflito só foi considerável nos mercados de commodities e nas bolsas de valores europeias. Embora os mercados de ações dos Estados Unidos tenham estado voláteis nas últimas semanas, eles não estão longe dos níveis em que estavam sendo negociados antes do início da invasão, algumas semanas atrás.
Muitas más notícias estão agora precificadas nos mercados financeiros europeus. Muitas das principais métricas de mercado mostram que os ativos europeus precificaram níveis elevados de incerteza dos investidores.
Os preços das opções de ações e moedas estão indicando níveis de pessimismo dos investidores sobre os ativos da zona do euro vistos anteriormente apenas na crise do subprime dos Estados Unidos [em 2008 e 2009], na crise da dívida da zona do euro [no começo da década de 2010] e nos primeiros dias da pandemia [no começo de 2020].
A ação média da zona do euro está sendo negociada com mais de 25% de desconto em relação aos preços alvo das ações em 12 meses no consenso de analistas. Nas últimas décadas, descontos desse porte só foram vistos em tempos de recessão.
Como a guerra é imprevisível, o que o investidor tem de entender? Qual o histórico de efeitos de conflitos no mercado financeiro?
Infelizmente, não há como evitar o simples fato de que o impacto do conflito nos mercados globais será moldado pela amplitude e pela duração dele. Cenários envolvendo a disseminação do conflito para outros países podem causar danos muito grandes aos mercados financeiros globais.
É difícil ver um renascimento sustentado do apetite global por ativos europeus até que um caminho credível para a redução da escalada se torne visível.
Os mercados financeiros assumem uma postura fria em eventos geopolíticos, como a situação atual na Ucrânia. A história mostra que conflitos como esse exercem apenas um impacto passageiro nos mercados financeiros globais se permanecerem como assuntos localizados.