(iStock/Reprodução)
Professora na Faculdade Exame
Publicado em 15 de novembro de 2024 às 09h00.
Muitas vezes me perguntam como eu fui de engenharia elétrica para sociologia.
É uma ótima pergunta, e a resposta está em algo que percebi ao longo do tempo: dados não dizem nada sozinhos. Se você tem a informação que está 28 graus, fecha os olhos e imagina como está o dia, provavelmente pensará em sol, calor e céu azul, certo?
Mas, esse cenário só é valido quando falamos de temperatura em celsius. Se fossem 28 graus Fahrenheit, estaríamos falando de -2 graus celsius – por mais que o dia pudesse estar ensolarado e com o céu azul, não estaria nem um pouco quente.
Essa percepção me fez entender o papel do contexto. E quantas vezes falamos com as outras pessoas no trabalho achando que elas têm o mesmo contexto que a gente?
Isso é importante, porque no trabalho passamos meses para fazer um projeto ficar de pé, damos o sangue para entregar resultados, passamos noites em claro e, muitas vezes, nosso esforço não é reconhecido.
E eu te digo o porquê: você não contou sua história. Você mostrou os dados, mas não contou a história que esses dados contam.
Aí está o ponto central – sem narrativa, os dados não falam por si só. Você chegou na véspera da entrega, colocou um punhado de slides juntos, alguns deles dizendo “batemos a meta” ou “atingimos tal resultado”. Mas e você? Sabe que problema você resolveu?
Os dados que você escolheu para apresentar têm que indicar algo, têm de ter um arco narrativo. Eu sei que são muitas coisas para contar, que foram tantos meses, mas você também sabe que aquela pessoa do outro lado, te ouvindo, tem no máximo meia hora para ouvir. Então, como você vai contar tudo sobre um projeto enorme em tão pouco tempo?
A resposta está em selecionar apenas os dados mais importantes. Escolha as três métricas que mais influenciaram seu problema e diga como elas se comportaram e por que elas importam.
Eu aprendi isso a duras penas.
Quando eu era estagiária na 99, fiz minha primeira apresentação com dados. Me esforcei, coloquei gráficos, os números estavam corretos. Eu tinha revisado várias vezes. A análise estava impecável.
O CEO estava por ali e ficou curioso, afinal, eu era a primeira e única analista de dados da empresa, e, assim que terminei de falar o primeiro slide, escutei um “e daí?”.
A pergunta que ele tinha era basicamente “o que eu faço com essa informação?”. Foi ali que aprendi, na prática: a informação sozinha não serve de nada. E até então, o que eu sabia fazer de melhor era extrair a informação.
Nesse momento eu entendi que interpretar dados vai além de apenas apresentar os números. Que, quando você constrói uma história com os dados como suporte, o impacto é outro. Quando o porquê está claro para os outros, as pessoas tendem a te ouvir.
A partir daí, comecei a tentar dar sentido aos números, fui estudar jornalismo e, depois, pedagogia. Essas áreas me ensinaram que a escolha dos números muda a interpretação dos cenários. Em outras experiências profissionais, percebi o quanto isso faz diferença.
Esse aprendizado me levou à pós-graduação em sociologia, onde estudei comportamento social e entendi que os números refletem comportamentos. Não se trata de manipulação, mas da arte de escolher os dados certos para construir a narrativa que queremos contar, mesmo que ela não seja o que o seu diretor queira ouvir.
Não é só porque você tem o número que precisa falar sobre ele. Hoje, temos dados sobre praticamente tudo – o exercício se torna de priorização.
Pergunte-se: se eu pudesse mostrar apenas três informações, quais seriam e por quê? É difícil no começo, mas, como tudo na vida, é treino. Você precisa escolher 20% dos dados que respondam 80% das perguntas.
Então, se você está se perguntando o que pode mudar, comece pelo simples: planeje.
Nenhuma apresentação de resultados deve ser feita em cima da hora. Você precisa treinar, ensaiar. Apresente para outras pessoas e descubra quais argumentos estão faltando.
Lembre-se, uma vez que você tem a história, só depois insira os dados que a sustentam. Se os dados disserem que sua história é inválida, reveja sua história.
Você não necessariamente precisa fazer uma mudança radical de área para contar uma história com dados, ou incluir dados nela. Mas, com certeza, ter referências e buscar novos aprendizados ajuda a aprimorar essa habilidade.