Editor do Future of Money
Publicado em 18 de outubro de 2024 às 16h10.
Última atualização em 18 de outubro de 2024 às 16h20.
"Achamos que a internet está entrando em uma mudança bastante tectônica". É assim que Alex Blania, CEO da Tools for Humanity, explica a visão dele e de Sam Altman, chairman da empresa e CEO da OpenAI, ao ser perguntado sobre o motivo da dupla ter criado o projeto World, que recebeu um novo nome e diversas atualizações reveladas em um evento nesta semana.
Em uma entrevista exclusiva à EXAME, Blania explicou que a Worldcoin, como a iniciativa foi chamada a princípio, busca resolver um problema que, para ele e Altman, deve piorar cada vez mais: a incapacidade de distinguir pessoas e robôs na internet. E o motivo é a melhoria crescente e acelerada da inteligência artificial, como Altman acompanha de perto no comando da OpenAI.
Blania também falou sobre o anúncio de retorno das operações da World no Brasil e a nova etapa da companhia, incluindo a reformulação dos Orbs, equipamentos usados para fazer o escaneamento de íris de usuários como uma "prova de humanidade".
Outro anúncio da empresa durante o evento girou em torno das preocupações sobre privacidade e segurança de dados, já que dados biométricos de íris são altamente sensíveis e inalteráveis. O CEO da Tools for Humanity disse, porém, que a questão é essencialmente uma necessidade de ajudar os reguladores a "entender" o projeto e suas medidas de proteção de dados.
Blania diz que o surgimento da World está ligado à percepção dele e de Sam Altman de que "a Internet está entrando em uma mudança bastante tectônica" com o avanço da inteligência artificial, especialmente a generativa. Ele explica que as IAs estão se tornando cada vez mais inteligentes e que, na prática, " já não é possível dizer se estamos realmente falando com uma IA ou com um ser humano".
"O ChatGPT foi o primeiro exemplo disso, e muitos dos modelos de IA de código aberto depois disso vão na mesma direção. E os custos de todas essas coisas tenderão a zero. Portanto, ficará muito, muito mais barato e elas ficarão muito, muito mais inteligentes", comenta.
Blania também faz uma projeção ousada: "Acho que estamos prestes a entrar em uma época em que mais de 99% das coisas na internet poderão ser geradas por alguma IA". O principal problema, avalia, é que as pessoas usam a internet com uma "confiança como padrão", acreditando que todos os conteúdos que consomem foram cirados por humanos.
"Então, no fim, mudaremos para a desconfiança como padrão. Faremos perguntas como 'da onde vem isso?', 'esta é uma IA?', 'o que ela quer?'", projeta. Nesse cenário, o executivo acredita que "a prova de humanidade se tornará uma infraestrutura crítica", e a World é a "primeira parte na criação dessa infraestrutura, mesmo que ainda estejamos a alguns anos de distância disso".
Além da utilidade nessa distinção entre o real e o sintético, Blania comenta que o foco dele e de Sam Altman com a World é "tornar os benefícios da IA acessíveis a todos", o que exige uma maior integração das pessoas com as inteligências artificial.
Por fim, no longo prazo, ele diz que "você poderá pensar em novas políticas econômicas que serão importantes. A ideia de renda básica universal virou um termo muito carregado politicamente, mas algo assim pode realmente se tornar importante no futuro, e por isso estamos construindo uma infraestrutura para isso".
Quando a World, então Worldcoin, foi lançado em 2023, o projeto chegou a ter operações no Brasil, mas elas foram suspensas semanas depois. Agora, Blania confirmou que a iniciativa retornará ao mercado brasileiro, mas sem dar uma data exata.
"O Brasil é provavelmente o país com o qual estamos mais entusiasmados. Estou realmente muito animado com o Brasil e anunciaremos a data real de lançamento em breve. Atualmente estamos trabalhando com a equipe e as autoridades para definir tudo", comentou.
O CEO da Tools for Humanity explica que a enxurrada de anúncios nesta semana reflete a visão de que é preciso correr atrás da inteligência artificial. "Estamos tentando acelerar o ritmo porque achamos que a IA está acelerando e achamos que o que fazemos é muito, muito importante para este momento".
Mas, mesmo com todas as mudanças, Blania não acredita que a empresa está com um foco muito difuso. "A nossa missão é fornecer uma identidade e financiamento a cada ser humano, criando a maior rede humana na internet. O que fazemos é realmente muito simples.Eu não estou preocupado com o foco da empresa", afirma.
O executivo também confirmou que a Tools for Humanity mantém uma relação de troca com a OpenAI. Sam Altman é um dos fundadores da primeira e o atual CEO da segunda empresa. "Acho que existem várias formas interessantes de interagirmos, mas no momento estão focados em pesquisa. Discutimos políticas, problemas e trocamos ideias importantes", diz.
Um dos principais desafios enfrentados pela World desde o lançamento é regulatório. A iniciativa já foi alvo de críticas, investigações, multas e suspensões em diversos países, com reguladores afirmando em geral que a empresa possui falhas em políticas de privacidade e segurança de dados. A empresa nega e já lançou mudanças neste ano para reforçar a área.
Na visão de Alex Blania, um problema principal é que "o assunto é muito, muito complicado e muitas dessas coisas são muito novas para os reguladores. Muito do que fazemos é apenas conversar com reguladores e governos. E posso dizer que o tom dos governos realmente mudou muito desde o ano passado".
"Há mais de 12 meses, a maioria dos governos eram hostis. Nos perguntavam o que estávamos fazendo ali, quais eram nosso objetivos, o que fazíamos com os dados. E como envolvíamos cripto, a coisa só piorava", lembra.
Mas, recentemente, "com a adoção da IA, muitas das coisas sobre as quais falávamos tornaram-se desafios diretos com os quais os governos se preocupam. E assim, agora, estamos realmente entrando em um ponto em que muitos governos estão nos procurando para conversar".
Blania ressalta que a World não armazena nenhum dado sensível de seus usuários e que "levará tempo" para superar a desconfiança dos reguladores, mas a empresa fará esse esforço "com prazer".
Um dos aspectos centrais da operação da World é a sua criptomoeda própria, a WLD, que é dado como recompensa aos usuários pelo registro de íris. Além disso, o projeto conta com um blockchain próprio, o World Chain, lançado nesta semana.
Na visão de Blania, o próprio evento demonstrou como ele acredita que o mercado cripto deveria se comportar. "Tivemos alguns slides sobre blockchain lá e acho que é assim que se deveria pensar sobre cripto. Eu acho que um dos problemas desta indústria é essa obsessão com tokens e comunidades e coisas chamativias e isso e aquilo. A preocupação em parecer descolado".
"Acho que isso não nos leva a lugar nenhum. Acho que precisamos construir produtos, e precisamos construir produtos úteis. E estamos fazendo isso. Acho que estamos fazendo isso em grande escala e, esperançosamente, podemos fazer a diferença com isso. Acho que vamos conseguir", projeta.
*O repórter viajou a São Francisco, nos EUA, a convite da Tools for Humanity