Pix foi lançado em novembro de 2020 pelo Banco Central (Rafael Henrique/SOPA/Getty Images)
O Pix, sistema de pagamentos instantâneos do Banco Central, completou dois anos de lançamento em novembro, com dados que apontam um rápido ganho de adesão tanto pela população em geral quanto pelo varejo brasileiro.
Um levantamento da consultoria Gmattos aponta que o sistema ultrapassou recentemente o boleto bancário e se tornou a segunda opção de pagamento com maior adesão por sites de e-commerce no Brasil. A parcela de mercado em termos de volume de pagamentos é de cerca de 7%.
Indo além do varejo, dados do próprio Banco Central apontam um forte crescimento na adesão da população ao Pix. Se em dezembro de 2020 eram 133 milhões de chaves cadastradas, em outubro de 2022 o número chegou a 523 milhões, alta de mais de 390%. Já o número de transações cresceu mais de 1.700%, indo de 144 mil em dezembro de 2020 para 2,5 milhões em outubro deste ano.
Com esse avanço, a ferramenta registra atualmente R$ 1 trilhão em transações mensais, ante os R$ 123 bilhões no primeiro mês de lançamento. No total, foram mais de R$ 12 trilhões movimentados. Junto com a alta, o Banco Central realizou também atualizações no sistema, incluindo limites por horário e novidades como o Pix Troco e o Pix Saque.
O saldo foi um impulsionamento na inclusão financeira e na digitalização da economia brasileira, na visão de especialistas consultados pela EXAME. Mesmo assim, há mais espaço para o Pix crescer, e melhorar, com potencial de adesão e uso ainda maiores.
Para Gastão Mattos, fundador da Gmattos, o maior impacto que o Pix trouxe para a economia brasileira foi a maior “inclusão às formas eletrônicas de pagamentos de uma forma muito expressiva para muitos brasileiros, que até então faziam pagamentos com formas tradicionais, como cartão, dinheiro e cheque”.
Os dados do Banco Central também indicam essa substituição. O sistema foi, mês a mês, superando outros meios de pagamento tradicionais, dos cartões de débito e crédito ao boleto bancário, e é hoje a principal opção dos brasileiros.
“O valor mais significativo foi incluir os brasileiros nesse mundo digital, e tem uma potencial consequência porque esse público passa a ser elegível a sofisticar a forma de pagar as coisas através de outros processos eletrônicos”, pontua o analista.
Ele avalia que o Pix “roubou espaço e aceitação” de outras formas de pagamento, inclusive no comércio varejista, com destaque para o cartão de débito. Esse fenômeno ocorreu com mais força no ambiente online, onde o sistema é mais prático que outras alternativas.
Já Lauro Gonzalez, coordenador do Centro de Estudos em Microfinanças e Inclusão Financeira da FGV, acredita que a principal transformação que a ferramenta trouxe está ligada à inclusão financeira, a partir de uma “diminuição do custo de transações financeiras para a população de baixa renda”.
“A quantidade de transações feitas com dinheiro em papel era mais elevada na baixa renda, e uma das razões era o fato que os custos de transação por outros meios eram elevados. Para valores pequenos, não valia à pena, ficava proibitivo. Agora, isso mudou”, diz o professor.
Além disso, ele aponta uma possibilidade de, ao trazer mais pessoas para serviços de pagamento, “propiciar também um efeito sobre o mercado de crédito”. “Os pagamentos são importantes para a estimativa do risco de crédito, então tem um efeito geral”.
Gonzalez lembra que a inclusão financeira “historicamente anda de mãos dadas com a digitalização da economia”, e que o Pix conseguiu trazer as duas coisas em pouco tempo. “A evidência do sucesso do Pix se dá pelo aumento, o forte crescimento, no número de usuários e de transações, e também dos volumes. Isso atesta o sucesso”.
Gonzalez ressalta que as razões para o sucesso do Pix estão, na sua visão, ligadas ao efeito de maior inclusão financeira. “A indústria de pagamentos estava bastante caracterizada por custos de transação muito elevados, sobretudo para a população de baixa renda, e aí veio uma inovação como o Pix, cujo efeito imediato é a redução desse custo”.
“É uma solução digital, mais barata, conveniente, interoperável também”, lembra o professor. Ao mesmo tempo, ele acredita que houve uma contribuição do contexto da pandemia para uma expansão e maior adesão do sistema de pagamentos instantâneos.
Na visão dele, “a digitalização de maneira geral foi afetada pela pandemia, foi uma mudança contextual ligada a um fator externo negativo que sem dúvidas tem um efeito sobre os hábitos do consumidor. Isso cria um círculo de mudança que passa inclusive pelos modelos de negócio digitais, que buscam se tornar acessíveis aos usuários”.
Já Mattos acredita que “o Pix aconteceria mesmo que não tivesse a pandemia. Não que a ameaça do Covid tenha sido 100% ultrapassada, mas tem hoje um status diferente, muito melhor do que tinha nos outros anos, e mesmo assim tem uma aceleração, ampliação de uso do Pix”.
Para ele, a pandemia de Covid-19 favoreceu mais os pagamentos sem contato, em especial cartões, do que o Pix em si. Ao mesmo tempo, o consultor acredita que a principal novidade, e causa para seu sucesso, foi um sistema aprimorado de pagamentos instantâneos.
“Ele funciona 24 horas, 7 dias da semana, não tem feriado, fim de semana, e sai da conta e a pessoa recebe no mesmo segundo. Essa história do pagamento instantâneo é uma alavancagem tecnológica muito grande. Outro fator é a usabilidade, a forma foi projetado permitiu que qualquer um consiga usar”, explica.
Mesmo assim, ele acredita que a adoção do Pix no varejo físico ainda não foi tão grande quanto poderia ser, já que o uso da opção de pagamento não é tão simples ou transparente. Nesse sentido, ele acredita que a ferramenta deve evoluir para tornar esse uso mais prático.
Mattos acredita que as duas principais novidades já compartilhadas pelo Banco Central para os próximos anos são o Pix Garantido, que permitirá oficialmente o parcelamento de pagamentos, e o Pix NFC, que gerará uma ligação entre o sistema e smartphones, permitindo pagamentos por aproximação.
“Isso sim vai permitir uma melhoria de usabilidade no mundo físico. Não precisaria abrir app do banco, ler QR Code, como ocorre hoje. Pode agregar mais transações, e acho que essa segunda mudança vai acelerar o volume transacional”, projeta.
O consultor vê ainda avanços na agenda de segurança do Pix, que ganhou mais destaque após uma onda de golpes e uso em roubos: “No fundo, a tecnologia não é insegura, é um contexto de engenharia social ou coisas inevitáveis, em ameaças, roubos. O Pix não é mais ou menos frágil, o que precisa, e nisso os cartões já evoluíram, é as instituições terem processo de prevenção e inteligência para entender se a transação não é típica, é isso que está sendo construído agora”.
Gonzalez, da FGV, avalia que o sistema deverá ter, em breve, uma função de ligação mais direta com recebimento de crédito, em especial pelo parcelamento e programação de pagamentos, e que a agenda de segurança é “uma das maiores preocupações agora”.
“A digitalização traz consigo um problema grande de segurança devido à maior facilidade nas transações, que melhora a vida do usuário mas pode facilitar fraudes e golpes”, explica o professor.
Gastão Mattos observa ainda que, no futuro, o Pix deve ganhar um caráter internacional. “É uma tecnologia própria, confiável, com essa amplitude e aceleração de uso tão grande. A integração com outros países é um próximo passo, e há demanda”.
“[O Pix] É um fator muito positivo para o Brasil. O país não foi pioneiro em pagamentos instantâneos, mas com essa amplitude e aceleração de uso é algo notável. Estamos muito na frente de diversos países, incluindo os Estados Unidos”, destaca.
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