Paul Brody é líder global de blockchain da EY (EY/Divulgação/Divulgação)
Repórter do Future of Money
Publicado em 29 de agosto de 2024 às 15h11.
Última atualização em 29 de agosto de 2024 às 17h20.
A criação do Drex pelo Banco Central esbarrou nos últimos meses em um problema importante, ligado à necessidade de garantir a privacidade dos dados de clientes de instituições financeiras que integrarão a plataforma da versão digital do real. Entretanto, esse problema já possui uma solução no mercado.
É o que afirma Paul Brody, líder global de blockchain da EY, em entrevista exclusiva à EXAME durante sua passagem pelo Brasil. O executivo destacou que o Brasil é uma "exceção" no cenário atual de desenvolvimento de moedas digitais de bancos centrais (CBDCs, na sigla em inglês) com uma abordagem e possíveis casos de usos distintos da maioria dos países.
Já em relação à proteção e privacidade de dados, o executivo reconheceu o desafio enfrentado no piloto do Drex, mas afirmou que é possível integrar soluções para resolver o dilema. O processo, porém, ainda pode demorar mais tempo, exatamente pelas dificuldades dessa integração.
Na visão de Brody, o grande problema enfrentado pelas CBDCs no momento é que elas "não estão indo bem". O motivo? "Em geral, é difícil explicar qual é a vantagem delas. Antes, os bancos centrais diziam que tinham dois ou três objetivos, os mais comuns eram oferecer serviços bancários para os não bancarizados, reduzir os riscos no sistema financeiro ao diminuir o uso de stablecoins e dar mais competitividade ao ecossistema de pagamentos".
O problema, avalia, é que essas propostas possuem suas fragilidades. Ele cita o Brasil como um "caso excelente" nesse sentido. "O Pix já bancarizou os não bancarizados de graça e ainda aumentou a competição do setor de pagamentos. Então se um país tem um sistema como o Pix, as CBDCs perdem o seu potencial".
Ele explica que um problema enfrentado em diversos países é a falta de exploração de programabilidade nos sistemas de CBDCs, o que também as enfraquecem como alternativa às stablecoins. "As pessoas não compram stablecoins só para ter, é também para transferir internacionalmente com baixo custo, usar essa programabilidade", diz.
"As CBDCs tem foco nacional, não permitem programabilidade, não estão ligadas a blockchains, então não reduzem demanda por stablecoins. Por isso, muitos projetos não funcionam, porque ao chegar no mercado as pessoas não veem o valor e os bancos não veem incentivo para se integrar e ter os custos disso", afirma.
Apesar disso, ele pondera que o Brasil é uma "exceção interessante". "O Drex é a única CBDC realmente focada na tokenização e programabilidade. O piloto mostra isso, com um potencial imenso para ter um resultado diferente de outros projetos", projeta.
Com relação à necessidade de garantia de privacidade de dados no Drex, Brody defende que a ferramenta da EY, a Starlight, é uma solução para o problema. Ela está entre as ferramentas em testes no piloto do BC. "Nós podemos e já resolvemos o problema da privacidade. A questão agora é de implementação dela na plataforma", argumenta.
O executivo comenta que a EY é a "maior investidora de privacidade em blockchain" e que possui soluções mais antigas, como a Nightfall, que não é adequada para o Drex pois não permite criar contratos inteligentes, apenas viabilizando pagamentos.
Já a Starlight teria essa opção. "Sabemos como resolver [o problema], mas é uma solução nova. A cada funcionalidade que precisamos adicionar, demora um tempo. Eu acho que em três a quatro anos será fácil fazer, mas no momento demora para adicionar algo novo, é um processo de adoção", explica.
Por isso, Brody projeta que a integração ao Drex para a solução de privacidade pode demorar, mas que, uma vez concluída, o problema estaria resolvido.
Sobre o futuro das CBDCs, o executivo da EY avalia que "estamos muito longe ainda de projetos de CBDC com foco internacional, até porque nos países os pagamentos nacionais são muito maiores. E as stablecoins já estão ocupando esse espaço no internacional. Sistemas de pagamentos instantâneos, como o UPI da Índia, já estão sendo interconectados com pares internacionais".
"Até que as CBDCs sejam finalizados, os países vão descobrir que estão três anos atrás e com uma alternativa cinco vezes mais cara em relação ao que já vai existir no mercado. É a questão do muito pouco, muito tarde. Tecnicamente as CBDCs podem ser usadas em operações transfronteiriças, mas na prática não deverá fazer sentido", diz.