Regulação de criptoativos aborda temas como corretoras de criptomoedas, atividades criminosas e tributação (Madrolly/Getty Images)
Em um momento de forte expansão, o setor de criptoativos também se tornou alvo nos últimos meses de discussões em diversos países sobre a sua regulação. No caso do Brasil, há um projeto de lei sobre o tema que já foi aprovado no Senado, mas aguarda votação na Câmara.
O debate no país ocorre em consonância com o de outras grandes economias, focando em temas como as corretoras de criptomoedas, atividades criminosas que usam criptoativos e tributação.
Apesar da discussão ocorrer em um ano eleitoral, o tema ficou distante dos planos de governo dos candidatos à Presidência do Brasil. Levantamento da EXAME aponta que nenhum dos 11 candidatos ao cargo em 2022 cita os criptoativos ou criptomoedas em seus planos.
Para entender os posicionamentos dos candidatos sobre o tema, a EXAME entrou em contato com as campanhas de todos os postulantes ao cargo.
Em nota à EXAME, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou que “os criptoativos têm crescido muito nos últimos anos e merecido a atenção das autoridades”. Lula é, atualmente, líder nas pesquisas de intenção de voto.
Para o candidato, “o governo, especialmente por meio do seu Banco Central autônomo, deve criar normas alinhadas ao padrão internacional para evitar práticas ilegais que podem fazer uso dos criptoativos, como a lavagem de dinheiro e a evasão de divisas, além de evitar práticas de negociação fraudulentas”.
A campanha disse, ainda, que deve ser papel do governo “monitorar o impacto do mercado de criptoativos na saúde do sistema financeiro”, mas sem apresentar detalhes sobre como isso seria feito.
Questionada sobre o assunto, a candidata Simone Tebet (MDB) defendeu à EXAME que o tema de regulação dos criptoativos é de competência do Banco Central e da Comissão de Valores Monetários (CVM), que classifica como “independentes e técnicas” e “das mais reputadas do país”.
A senadora afirmou que as duas agências “vêm examinando o assunto com atenção, discutindo-o inclusive com os demais reguladores do mundo”.
“Fazem isso, de um lado, sem inibir a inovação trazida pela tecnologia blockchain e, de outro, cuidando dos riscos de lavagem de dinheiro e de fraudes que causem danos à poupança popular”, disse a candidata.
Para ela, o papel da Presidência nesse caso seria “assegurar que o financiamento dos reguladores seja adequado - o que não acontece hoje, ao menos no caso da CVM -, para que eles possam cumprir suas funções”.
Candidata pelo União Brasil, a senadora Soraya Thronicke ressaltou para a EXAME que foi autora de um projeto de lei ligado à regulação de criptoativos, o PL 4.207, apresentado em 2020.
O texto, explica, foi “apensado a outros PLs apresentados antes e depois do que apresentei. O senador designado para relatar os PLs apresentou um substitutivo, incorporando os projetos apensados e os arquivando. Assim, parte do PL 4.207, de 2020, está dentro do substitutivo apresentado no PL 4.401, de 2021, já remetido para a Câmara dos Deputados”.
A senadora cita o principal projeto de lei atualmente em tramitação no Congresso sobre o tema. Ele estabelece, entre outras medidas, o combate à prática de crimes com criptoativos e cria mecanismos para proteger investidores.
O texto também busca a redução do impacto ambiental da mineração de ativos digitais e retira as criptomoedas do escopo da CVM – com a atribuição passando para a responsabilidade do Banco Central.
“No meu PL defendi a regulação das exchanges, mas sempre prestigiando a liberdade do mercado”, afirma a senadora. Ela destaca que “uma das grandes bandeiras de meu mandato é o livre mercado, justo e próspero, sempre protegendo o consumidor”.
“A ideia é deixar as regras claras para que os investidores busquem investir em ativos digitais, reduzindo as fraudes que são praticadas pelos maus empresários”, defende.
O cientista político Felipe D’Avila (NOVO) afirmou que conhece o setor de criptoativos e o considera “muito interessante em termos de inovação”.
“Não apenas no sentido de inovação monetária, que facilita as transações econômicas, mas em toda a parte de digitalização de contratos que o uso do blockchain torna possível”, disse à EXAME.
Sem citar a questão de regulação de criptoativos, ele observou que “é um setor muito dinâmico, e que tem muita coisa nova surgindo com potencial positivo”.
Já o candidato Constituinte Eymael (DC) disse à EXAME que os criptoativos são “uma forma de investimento no Brasil e no mundo”, sendo “importante face a sua realidade uma regulamentação específica, pelos órgãos competentes”.
À EXAME, as campanhas dos candidatos Ciro Gomes (PDT) e Sofia Manzano (PCB) não enviaram uma resposta, citando falta de tempo devido à reta final da campanha. Não houve retorno das campanhas de Jair Bolsonaro (PL), Vera Lúcia (PSTU), Padre Kelmon (PTB) e Leonardo Péricles (UP).
Nos planos de governo enviados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o da campanha do presidente Jair Bolsonaro é o único que cita a tecnologia de blockchain, que permite o funcionamento das criptomoedas.
O texto cita “avanços e transformações do cenário econômico internacional, como a digitalização, o mercado de blockchain, a nova fase da revolução industrial 4.0, a realocação geográfica de cadeias produtivas e um amplo leque de recursos energéticos abundantes (petróleo e gás, nuclear, hidrelétrico, solar, eólico e biocombustíveis)”.
Nesse cenário, o plano afirma que “serão criadas condições para atrair investimentos internacionais que auxiliem no desenvolvimento econômico, na geração de empregos e no bem-estar social”.
Para Tasso Lago, fundador da consultoria Financial Move, uma vitória do ex-presidente Lula criaria um cenário “onde o dólar poderia ter um aumento de preço”, em um movimento associado à perspectiva de uma política fiscal menos arrojada e sem seguir o teto de gastos, o que aumentaria a dívida pública e o chamado risco Brasil.
Nesse quadro, há a tendência de retirada de investimentos no mercado brasileiro, com a moeda norte-americana valorizando ante o real. Ele observa que, como o bitcoin é um ativo dolarizado, “ele tenderia a se valorizar em relação ao real, seguindo um ganho de cotação do dólar”.
Já no caso da reeleição do presidente Jair Bolsonaro, atualmente em segundo lugar nas pesquisas, Tasso acredita que não haveria impacto sobre o câmbio e, por sua vez, no bitcoin e outras criptomoedas.
Ele ressalta que “o mercado segue lateral, o bitcoin segue entre US$ 18 e US$ 20 mil, com uma tendência baixista. A moeda está incapaz de romper e permanecer em um nível acima de US$ 20 mil, o que pode indicar uma queda para US$ 18 mil em breve”.
Diretora de negócios, produtos e regulação de tokens na exchange Foxbit, Nathaly Diniz afirma que "com exceção de algumas stablecoins, a maioria das criptomoedas tem seu valor cotado em dólares".
Essa característica traz, em uma perspectiva nacional, "duas volatilidades: aquela inerente às variações de preço do próprio ativo, seguindo critérios de demanda, escassez, potenciais do projeto, e, noutro ângulo, as oscilações da cotação do dólar frente a nossa moeda fiduciária".
"Nesse viés, e partindo do pressuposto que decisões políticas influenciam diretamente no valor do dólar em relação ao real, as eleições podem geram reflexos nos preços dos criptoativos", explica Diniz.
Siga o Future of Money nas redes sociais: Instagram | Twitter | YouTube | Telegram | Tik Tok