GPA redobra foco em margens e clientes premium: “Qualquer consolidação seria uma distração”, diz CEO
Possível fusão com o Dia não está no radar de Marcelo Pimentel e sua equipe, que seguem com foco em desalavancar varejista e fortalecer geração de caixa
Raquel Brandão
Repórter Exame IN
Publicado em 15 de janeiro de 2025 às 15:37.
Última atualização em 15 de janeiro de 2025 às 15:38.
Desde 2022, o foco de Marcelo Pimentel e sua equipe tem sido na recuperação do GPA, dono das redes de supermercados Pão de Açúcar e Extra. No apagar das luzes de 2024 e no início deste ano, no entanto, o noticiário atraiu atenção para além do processo de turnaround da companhia.
Uma possível fusão com o Dia começou a ser aventada – uma distração que o executivo prefere evitar. “Qualquer coisa sobre consolidação seria uma distração para nós e não estamos considerando. Acreditamos que, para o Pão, o importante é continuar focar no planejamento estratégico, na recuperação da base, principalmente de clientes premium, e na entrega de melhorias”, diz o CEO do GPA em entrevista ao INSIGHT.
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A operação brasileira do Dia foi vendida em maio do ano passado para um veículo administrado pela MAM Asset Management, do Banco Master. A identidade do comprador não foi revelada à época da operação.
Agora, porém, a indicação é de que o empresário Nelson Tanure assumiu a operação, com objetivo de criar uma corporation no setor de varejo, integrar a operação do GPA à do Dia.
Em dezembro, fundos da gestora Reag Trust passaram a deter 5,69% das ações ordinárias do GPA, além de instrumentos financeiros derivativos que elevam a exposição total para 9,56%. A Reag administra fundos de Tanure.
Ainda que uma operação de M&A não esteja no radar da gestão executiva do GPA, a possibilidade de uma transação não é descartada por investidores que acompanham o papel.
O francês Casino, que já controlou a companhia, ainda detém 20,4% do capital social e tem sido vocal em seu interesse de deixar as operações que mantinha na América Latina.
A operação tem méritos estratégicos, mas poucas sinergias poderiam ser capturadas, , segundo Robert Ford, que acompanha os papéis pelo Bank of America Merrill Lynch. De acordo com o analista, as duas operações têm ajustes importantes a fazer e modelos de negócios muito diferentes.
Por isso, nem um M&A seria suficiente, na visão do analista para dar uma visibilidade mais positiva ao papel do GPA nesse momento. Nesta semana, o banco rebaixou o papel de neutro para venda e cortou o preço-alvo de R$ 2,60 para R$ 1,80, considerando que o ambiente inflacionário e a escalada de juros devem impactar a trajetória de recuperação do negócio e afetar o desempenho da ação.
Após uma queda de quase 40% em 12 meses, os papéis do GPA estão cotados hoje a R$ 2,72.
Vento contra do macro
Em 2024, a gestão do GPA intensificou os esforços de ajuste de rota: colocou uma série de ativos à venda, incluindo a tradicional sede na Avenida Brigadeiro Luiz Antonio, em São Paulo, negociou passivos tributários bilionários e intensificou a estratégia de em direção a produtos mais premium, com mais espaço para vinhos e perecíveis nas lojas, por exemplo.
Um dos principais marcos foi a significativa redução da alavancagem financeira, que caiu de 8,8 vezes em 2023 para 2,8 vezes no terceiro trimestre de 2024. O grupo também apresentou avanços importantes na frente operacional. A margem bruta atingiu 27,7% no último trimestre de 2024, um aumento de quase quatro pontos percentuais em relação a 2022.
Com juros em ritmo de alta e inflação alimentar voltando a acelerar, o ano de 2025 vai colocar à prova essa arrumação da casa.
“Estamos seguros de que fizemos o dever de casa correto para atravessar esse momento de juros altos e pressões inflacionárias”, diz Pimentel.
O GPA trabalhava com uma previsão de juros de 10%, mas com o passar de 2024, ajustou seus cenários para 15%. “Estou muito mais aliviado do que eu estava em 2022, num ambiente como esse, quando a gente reduz a dívida praticamente pela metade. Mas estamos extremamente cautelosos com relação a investimentos e seguramos muita coisa que não era absolutamente crítico à estratégia. Os investimentos que estamos fazendo agora são estratégicos, com retorno dentro dessa nova realidade”.
Outro ponto crítico na avaliação do GPA, o passivo trabalhista começou a se reduzir, observa o executivo. Esse montante ganhou relevância como desdobramento da venda dos hipermercados Extra para o Assaí. “Tivemos dois anos muito duros, mas agora estamos vendo uma melhora. A entrada de novas ações trabalhistas cessou e os custos começam a diminuir.”
Antídoto para inflação
Um dos desafios para avançar na recuperação do negócio é o avanço da inflação alimentar, que pressiona o poder de compra, especialmente das classes C e D.
Sobre isso, Pimentel reconhece a diferença no impacto entre as bandeiras do grupo: “Para nossas bandeiras mainstream, como o Extra, o impacto da inflação é muito mais sensível. Já o Pão é mais resiliente, pois atende a uma base de clientes menos sensível a esse tema. Ainda assim, nosso foco permanece em crescimento absoluto de volume, não apenas em valor de vendas.”
Outro ponto sensível é a concorrência com atacarejos. Quando a inflação alimentar se acelera, são esses formatos que se saem melhor. E, mais recentemente, têm adotado um novo perfil, atraindo clientes de maior poder aquisitivo ao introduzirem serviços diferenciados, como padarias e cortes especiais de carnes. É o que têm feito redes como Assaí e Atacadão, por exemplo.
Mesmo assim, Pimentel reforça que o GPA não pretende entrar em uma guerra de preços. “Nossa proposta de valor vai além do preço. O cliente do Pão busca experiência, sortimento e serviço”, afirma. Ele destaca ainda que, em 2024, o grupo trouxe 700 lançamentos exclusivos em parceria com a indústria, reforçando a percepção de exclusividade na bandeira premium.
A gestão quer avançar em iniciativas que ajudem a consolidar uma posição no segmento premium e que melhorem a eficiência operacional. Isso inclui a ampliação do programa de fidelidade, o aumento da penetração digital e a continuação da expansão de lojas de proximidade em São Paulo.
Em 2024, foram abertas 60 novas unidades, com foco no modelo de proximidade premium, especialmente no estado de São Paulo.
Essas lojas estão localizadas em bairros de alta renda, onde o público busca conveniência aliada à qualidade. “A ideia é que o cliente resolva suas compras em cinco minutos de caminhada, sem precisar enfrentar trânsito”, explica o CEO.
A digitalização outro pilar central na nova estratégia do GPA. A penetração do e-commerce chegou a 12,5% ao fim de setembro passado, quando a receita cresceu 17% ante o ano anterior, para R$ 521 milhões. Dessas vendas, 35% já foram de itens perecíveis, uma das apostas de diferenciação e de ganho de margem. O grupo intensificou o uso de inteligência artificial para personalizar a experiência dos clientes, especialmente através de sua plataforma de dados (Customer Data Platform, ou CDP).
Hoje, 70% das promoções são baseadas em comportamento de compra, e o próximo passo é aprofundar a personalização. “Essa é a grande oportunidade: falar com cada cliente de forma assertiva, oferecendo produtos que realmente interessem a ele”, diz Pimentel.
Uma das maiores apostas do GPA, diz Pimentel, são as iniciativas de Retail Media, a fim de monetizar espaços físicos e digitais para a promoção de produtos. Em 2024, a receita dessa frente dobrou e contribuiu significativamente para o EBITDA, com uma margem de 80%.
Embora o CEO destaque o impacto positivo já tem massa crítica no balanço, o grupo ainda não abriu detalhes sobre os números. A expectativa é de que a divulgação passe a ser mais consistente a partir deste ano.
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Raquel Brandão
Repórter Exame INJornalista há mais de uma década, foi do Estadão, passando pela coluna do comentarista Celso Ming. Também foi repórter de empresas e bens de consumo no Valor Econômico. Na Exame desde 2022, cobre companhias abertas e bastidores do mercado