BRK Ambiental vai tentar ser 1º IPO de 2022, em busca de R$ 2 bi
Companhia se apresenta como combo de geração de caixa resiliente, previsível e crescente, mas ceticismo ainda é grande
Publicado em 31 de maio de 2022 às 17:51.
A BRK Ambiental decidiu pegar um lugar na fila para uma possível abertura do mercado para ofertas públicas iniciais (IPOs). A companhia registrou o prospecto preliminar na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O objetivo é levantar R$ 2 bilhões com uma oferta primária. A narrativa a ser oferecida aos investidores é que se trata de um combo de tudo que voltou a ser desejado: “geração de caixa resiliente, previsível e crescente”. É inclusive exatamente dessa forma que a empresa apresenta o negócio no próprio prospecto.
Como o serviço de saneamento normalmente acompanha inflação, além de tudo, funciona como proteção da carteira do investidor contra o “dragão”. O calcanhar de Aquiles na sedução do mercado é a alavancagem: dívida elevada está na lista do que deve ser evitado no momento.
O ceticismo do mercado ainda é grande, especialmente com a BRK Ambiental, pela situação societária. A cereja no bolo é o fato de ser um setor regulado no Brasil, em ano eleitoral, mesmo após uma reforma profunda de marco regulatório.
A companhia terminou março com R$ 8,6 bilhões de endividamento bruto, para R$ 1 bilhão em caixa — o equivalente a uma relação entre dívida líquida e Ebitda superior a 7 vezes. Em 2019, esse índice estava em pouco mais de 5 vezes.
A BRK é controlada por um fundo de private equity do grupo canadense Brookfield, um dos investidores mais tradicionais e antigos do Brasil. O fundo detém 70% do capital — os demais 30% estão em poder do FI-FGTS. E nessa sociedade mora um outro desafio ao IPO, que é o valuation da companhia.
O FI-FGTS encrenca para qualquer avaliação que faça sua participação ficar abaixo de R$ 2,7 bilhões — valor de registro do ativo em seu balanço. Por trás do debate, o eterno temor em relação ao Tribunal de Contas da União (TCU) e o que ele pode fazer com aqueles que tomam as decisões que possam não julgar adequadas. Na prática, atender o desejo desse minoritário (mas com poderes de veto), significaria conseguir emplacar uma oferta com a empresa avaliada em R$ 10 bilhões, algo que parece impensável para os humores atuais de mercado.
Essa situação tem sabidamente gerado um desgaste entre os sócios, pois a companhia demanda uma capitalização, em especial para dar conta de um empréstimo-ponte para a operação em Alagoas. Nesse valuation, a Brookfield não topa recomprar o sócio.
Cientes disso, os concorrentes do setor também estão de olho no negócio, atentos às necessidade de capital da empresa e a discussão dos acionistas. Vale para Iguá, gerida pela IG4, com investimento de outros canadenses (AimCo e CPP) e para Aegea. Para lidar com a demanda de capital que o setor exigirá nos próximos anos, os próprios bancos credores são favoráveis a uma consolidação, em busca de balanços robustos e com escala.
O negócio nasceu a partir da compra da antiga Odebrecht Ambiental e, na sequência, a Brookfield promoveu uma importante expansão de portfólio. Atualmente, são 23 operações, que atendem um público de 16 milhões de habitantes, em 100 municípios, num total de 13 estados da federação. A maior exposição é à região Nordeste, mas nenhum ativo da companhia responde por mais de 20% da receita.
A BRK afirma que, das 23 operações, ao menos 14 têm alto potencial de crescimento e esse seria o principal antídoto contra a alavancagem: a redução natural que ocorrerá com o ramp-up de diversas operações, que vão acelerar a geração de caixa.
A companhia teve receita líquida de R$ 670 milhões nos três primeiros meses de 2021, uma expansão de 34% na comparação com igual período do ano passado. O Ebitda mostrou um crescimento de 30% nessa mesma base de comparação, para R$ 305 milhões. Em todo ano de 2021, a receita líquida da companhia somou R$ 2,3 bilhões, com Ebitda de R$ 1 bilhão. A margem do negócio oscilou, entre 2019 e o começo deste ano, entre 44% e 47%.
Pós-Eletrobras
A ideia é tentar realizar a operação até agosto, na esteira da mega-capitalização da Eletrobras, se essa for confirmada. O entendimento de agentes de mercado é que pode haver espaço para ativos que atendam aos anseios atuais dos investidores. E o segmento de infraestrutura, apesar de intensivo em capital, normalmente é visto como porto-seguro: muito ativo fixo, muita geração de caixa.
Internamente, os fundos locais deram sinais de que, pelo preço certo, são compradores. Colocaram R$ 4 bilhões na aquisição de ações em bolsa neste mês e são os maiores alocadores — na frente das pessoas físicas e das empresas com seus programas de recompra, que investiram um líquido de R$ 2 bilhões cada no mercado secundário em maio, até sexta-feira passada (dia 27).
Lá fora, em especial os fundos de mercados emergentes, já venderam tudo que dava e mais um pouco. Estudo do Bank of America (BofA) com base na sua pesquisa mensal com gestores, apontou que as carteiras estavam com a maior posição de caixa retida desde o 11 de setembro de 2001, no ataque terrorista às torres gêmeas nos Estados Unidos.
Em algum momento, esse dinheiro terá de ser investido. Essa é a aposta. No setor, tudo indica que oportunidades não faltarão. De acordo com estudo realizado pela KPMG, as recentes mudanças no marco regulatório do país abriram espaço para R$ 700 bilhões em investimentos.
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