Após eleição confusa, Petrobras corre risco de continuar sem conselho
Indicado por minoritários, Marcelo Gasparino é eleito e promete renunciar em seguida, o que derruba o conselho novamente
Publicado em 13 de abril de 2021 às 07:57.
Última atualização em 28 de abril de 2021 às 14:34.
Tudo indica que, nem de longe, a questão na Petrobras está resolvida. A estatal corre risco de continuar sem conselho de administração e, portanto, sem presidente, já que as coisas estão intimamente relacionadas. Entre os oito eleitos na assembleia de acionistas divulgados ontem à noite pela petroleira está Marcelo Gasparino, uma indicação feita por Juca Abdalla e seu banco Clássico. Abdalla é o maior investidor pessoa física da petroleira, com perto de 1% do capital.
Ocorre que o advogado havia prometido — e o compromisso está publicado em sua página na rede social LinkedIn — renunciar, caso fosse escolhido. Como em todo conselho formado por sistema de voto múltiplo, a renúncia de um leva à queda de todos os eleitos pela mecânica. O EXAME IN conferiu com Gasparino e ele não quis comentar o tema, mas reafirmou a promessa. “Está no meu LinkedIn, só tenho uma palavra.”
Pelo visto, o risco político, uma das principais bolas de ferro do mercado nas últimas semanas — desde que essa crise começou, logo após o Carnaval — promete continuar elevado. E o Brasil sinônimo de confusão para investidores internacionais. As ações da Petrobras estão entre as maiores blue chips do mercado local e concentram o segundo maior peso na formação do Índice Bovespa.
Dos oito nomes anunciados ontem pela Petrobras como eleitos, sete deles foram indicados pela União controladora: Cynthia Silveira, Eduardo Bacellar, Joaquim Silva e Luna, Márcio Weber, Murilo Marroquim, Ruy Schneider e Sonia Villalobos. Da lista do governo, apenas Ana Matte não entrou.
Gasparino era um dos quatro nomes indicados por minoritários que tentavam uma posição no colegiado. Também concorreram Leonardo Antonelli, buscando reeleição, e o próprio Juca Abdalla – ambos indicação do Clássico. Por fim, outras gestoras também colocaram o nome de Pedro Medeiros na corrida. Durante a assembleia, Abdalla e Antonelli abdicaram da corrida.
A polêmica toda, motivo da promessa de renúncia de Gasparino, é a enorme confusão que há no sistema de transição de voto do sistema de eleição por chapa para o de eleição por voto múltiplo, para aqueles que votam à distância e por meio do boletim de voto. A questão — para lá de técnica, mas com enormes repercussões políticas — termina por invalidar e dificultar a manifestação de investidores minoritários, em especial de estrangeiros.
A dinâmica em si já não é muito simples. Quando um grupo de acionistas equivalentes a 5% do capital total pede a transição — o que pode ocorrer até 48 antes da assembleia — uma eleição pode deixar de ser por um coletivo e passar a ser por nome. Para completar, nessa mecânica é necessário decidir como distribuir o poder de voto. Cada ação pode votar tantas vezes quantas vagas houver e os votos podem ser concentrados em até um único nome — de forma que essa indicação tenha chance de ser eleita. Exemplo: quem tem cinco ações em uma eleição de 8 vagas, pode colocar 40 votos em seu candidato preferido.
Para completar a quizumba, há uma diferença entre o sistema de preenchimento dos boletins de voto e a forma pela qual os estrangeiros estão habituados e até podem votar. Fora do Brasil, as respostas são “a favor”, “contra” e “abstenção”.
Quem vota antes, pelo boletim, à distância, precisa fazer dois votos: um para sistema de chapa e outro, caso vigore o sistema de voto múltiplo. Piora mais. Há uma pergunta essencial sobre essa transição que deve ser feita no boletim, a respeito da distribuição de votos que, principalmente os investidores estrangeiros, não estão compreendendo como fazer e muitos terminam por escolher a opção abstenção ou votam a favor querendo votar contra e vice-versa (Depende da redação da pergunta). Quando isso ocorre, os votos de voto múltiplo terminam anulados e não contam para o todo.
Para incendiar o caso prático, há uma discussão de que a Petrobras não se esforçou para tornar tudo isso mais simples. Nem quando a companhia segue as regras e tenta facilitar é garantida a compreensão — é o que ocorreu, por exemplo, na Klabin, onde a eleição de uma indicação feita por minoritários não prosperou porque diversos votos foram para o lixo por preenchimento equivocado.
Na estatal
No caso da Petrobras, a eleição reflete ainda toda a preocupação com aumento da intervenção da União na conduta dos negócios. Essa votação ocorreu para que seja possível colocar Joaquim Silva e Luna na presidência da companhia, em lugar de Roberto Castello Branco, conforme as ordens do Palácio do Planalto. Para ser presidente da Petrobras, é preciso antes ser conselheiro.
Se esse conselho cai, vai junto Silva e Luna. Precisaria uma nomeação expressa que nem se sabe viável para que ele consiga ser indicado por esse conselho para a cadeira executiva, já que o plano de Gasparino é fazer da renúncia um ato contínuo a sua posse.
O objetivo é tentar fazer com uma nova eleição ocorra para, mais uma vez, buscar emplacar 5 indicações de minoritários em um conselho com 13 membros. Concorreriam novamente Gasparino, Abdalla e Medeiros e eles se juntariam a dois outros conselheiros já eleitos e que não dependem do voto múltiplo.
Toda essa verdadeira bagunça, além de prejudicar o mercado brasileiro inteiro, também paralisa a própria companhia, que está com conselho 'destituído' e presidente interino.
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