Redação Exame
Publicado em 6 de setembro de 2024 às 13h47.
A dois dias da realização do primeiro jogo da história da National Football League (NFL) na América do Sul, entre Green Bay Packers e Philadelphia Eagles, que acontece nesta sexta-feira, 6, na Neo Química, a partir das 21h45, é cercado por um dilema: a venda de bebidas alcoólicas dentro do estádio.
Em São Paulo, a comercialização foi vetada há quase três décadas, de acordo com Lei Estadual nº 9.470, de 1996, um ano depois da briga entre torcedores de Palmeiras e São Paulo, na decisão da Supercopa São Paulo de Juniores, no Pacaembu.
Essa regra, no entanto, ficou limitada apenas aos jogos de futebol, que passaram há alguns anos a vender cervejas zero álcool; ela não se aplica aos shows nas arenas esportivas do estado, e também na Fórmula 1, nas realização do Grande Prêmio de São Paulo.
Nos bastidores, comenta-se que a organização da NFL esteja se mexendo junto às autoridades e à Polícia Militar de São Paulo para obter a liberação; um dos patrocinadores do evento é a Budweiser, que inclusive lançou uma garrafa comemorativa para celebrar a partida disputada no Brasil.
“Muito além da receita potencial com alimentos e bebidas nesse jogo específico, a ideia da liga de trazer o jogo pro Brasil vai muito além das 4 linhas. Existe uma preocupação em recriar da maneira mais fiel possível a experiência das arenas americanas, o tailgate, o entretenimento e sem dúvida a as opções de bebidas alcoólicas”, aponta Ivan Martinho, professor de marketing esportivo pela ESPM.
De acordo com estimativas de empresas ligadas ao setor, a liberação de bebidas alcoólicas nos estádios de São Paulo representaria um aumento de aproximadamente 30% do faturamento. A medida também teria reflexo direto na geração de empregos, com a contratação de mais atendentes, operadores de caixa e ambulantes, por exemplo.
Nos últimos meses, algumas ofensivas foram feitas pela liberação das bebidas alcoólicas nos estádios de São Paulo, uma dela que tramitava na Assembleia Legislativa do Estado (Alesp). São dois projetos de lei que visam permitir a comercialização desses produtos com até 14% e 15% de álcool, e o mais adiantado corresponde aos deputados Delegado Olim (PP), atual presidente do TJD-SP, Itamar Borges (MDB) e Dani Alonso (PL).
A justificativa utilizada por Olim é que existe o entendimento da proposta ser constitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O deputado enviou uma carta à Federação Paulista de Futebol (FPF) com a assinatura dos presidentes dos clubes das três primeiras divisões do estado a favor do projeto de lei.
Um segundo projeto de lei é de autoria de Guto Zacarias (União) e Lucas Bove (PL), que pedem a restrição da liberação de bebidas alcoólicas a estádios que possuem monitoramento por câmeras.
“A liberação de cerveja seria benéfica para todas as partes, desde que também feita com normas e regras específicas a serem adotadas nos estádios. Acredito que assim como nos shows e nas próprias arenas de futebol, faz parte do entretenimento e vai trazer parceiros comerciais importantes para o segmento, além de novas receitas às partes envolvidas. Não existe uma comprovação sobre uma diminuição das brigas com esse veto em São Paulo, e outros estados brasileiros já fizeram a liberação há muitos anos. Com campanhas de conscientização, acredito que podemos avançar e caminhar para uma nova realidade por aqui", aponta Joaquim Lo Prete, country manager da Absolut Sport no Brasil, agência especializada em experiência esportivas.
Nos camarotes da Soccer Hospitality, empresa que administra espaços premium nos quatro principais estádios de São Paulo, o serviço de bebidas alcóolicas em jogos é disponibilizado até 2h antes da partida e após o apito final.
"O futebol paulista tem que liberar bebida alcoólica nos estádios. Nos arredores das arenas, é possível encontrar diversos ambulantes vendendo os produtos sem repassar nada para os clubes. Caso venha a ser liberado na NFL, considero como um passo importante para o retorno das bebidas, importante aspecto para a rentabilização dos eventos esportivos”, comenta Léo Rizzo, CEO da Soccer Hospitality, empresa que comanda nove camarotes em estádios brasileiros e é responsável pelo Fielzone, maior espaço premium da Neo Química Arena.
Alguns especialistas ligados ao assunto defendem a liberação, desde que venham acompanhadas também de medidas que não gerem violência. "Trata-se de uma alternativa que seria rentável e benéfica para todas as partes envolvidas. Mas instruir o público com campanhas de conscientização também é fundamental caso isso aconteça", aponta Fábio Wolff, sócio-diretor da Wolff Sports e que possui um camarote corporativo no Allianz Parque.
Já o executivo Renê Salviano, da agência Heatmap, que atende empresas que atuam em estádios como Allianz Parque e Mineirão, também vê a liberação com bons olhos. "Já vemos essa liberação em shows, até mesmo em São Paulo, e entendo que chegou o momento de ocorrer uma mudança não apenas nesse grande jogo como em várias localidades do país que ainda mantém esta regra. Todos os grandes eventos de entretenimento são assim. Ao mesmo tempo, entendo que elas devem vir obrigatoriamente acompanhadas de campanhas de conscientização sobre vício e consumo excessivo".
Em São Paulo, mesmo com muitas tentativas, a que chegou mais perto ocorreu em julho de 2021, quando a Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) aprovou um projeto de lei que liberou a comercialização nos estádios, mas a decisão foi vetada pela então governador João Doria (PSDB).
No Brasil, apesar da venda de bebidas ser permitida deliberadamente fora dos estádios, dentro deles ainda existem algumas restrições. Dos 12 estados brasileiros, São Paulo, Rio Grande do Sul, Goiás e Alagoas não permitem venda de bebidas alcoólicas dentro das suas dependências.
Cada estado possui uma regra, e o veto por parte da Assembleia é constitucional, visto que o Estatuto do Torcedor não caracteriza quais bebidas estão proibidas nos estádios, dando aos Estados a adequação da legislação às peculiaridades locais.