LUSAIL CITY, QATAR - DECEMBER 18: Lionel Messi of Argentina celebrates after the team's victory in the penalty shoot out during the FIFA World Cup Qatar 2022 Final match between Argentina and France at Lusail Stadium on December 18, 2022 in Lusail City, Qatar. (Photo by Julian Finney/Getty Images) (Julian Finney/Getty Images)
Ivan Padilla
Publicado em 18 de dezembro de 2022 às 14h54.
Última atualização em 19 de dezembro de 2022 às 10h34.
Parecia um jogo fácil para a Argentina na final da Copa do Catar, no estádio Lusail. Mas foi um enredo dramático, em que o jogo foi para os pênaltis depois do empate de 3 a 3 na prorrogação e a seleção argentina venceu nos pênaltis, por 4 a 2.
Ainda no primeiro tempo Lionel Messi marcou um gol de pênalti (discutível) e iniciou a jogada do lindo gol de Di Maria. A Argentina passou a sobrar no jogo, até os 35 minutos do segundo tempo. Foi quando Mbappé fez um primeiro gol de pênalti e na sequência outro no canto esquerdo do goleiro Emiliano Martínez.
A Argentina sentiu a substituição de Di Maria no começo do segundo tempo e a França cresceu na partida. Na prorrogação, o jogo ficou muito equilibrado, com ataques para os dois lados e muitas, muitas chances de gol. Messi fez o terceiro, em que a bola chegou a ser tirada de dentro do gol. E Mbappé fez de pênalti.
Uma final histórica.
Aos 35 anos, Messi sai como ídolo, comparado a Maradona, o que na Argentina equivale a Deus. Não foi o artilheiro da Copa. Com sete gols, ficou um atrás de Mbappé. Mas é agora candidatíssimo ao próximo título de melhor do mundo.
Os argentinos tomaram como sempre as ruas das cidades e a praça do Obelisco em Buenos Aires. A festa foi enorme, com vídeos das comemorações circulando nas redes sociais. A “abuela”, a senhora que foi celebrada por torcedores no bairro de Liniers, esteve novamente nas ruas e deu entrevistas para as emissoras de televisão.
Já os franceses estiveram ausentes das ruas nesta Copa e encararam o frio do inverno apenas na final, com alguns grupos de torcedores pela Champs-Élysées. Não houve fan fest em Paris. Seria uma celebração silenciosa, dentro das casas. Nem isso foi.
A Argentina começou a Copa perdendo da Arábia Saudita, a maior zebra das Copas do Mundo. Nunca um time tão favorito havia perdido de virada. Depois disso, o técnico Lionel Scaloni mudou as escalações, as formações e o esquemas táticos nas seis partidas seguintes. O time foi melhorando e passou a encantar.
Na final contra a França, um time sempre ofensivo, o técnico voltou a escalar Di Maria como titular. O meia entrou nos três primeiros jogos, sofreu com dores no quadríceps e retornou só contra a Holanda nas quartas de final. O camisa 11 argentino perdeu a final da Copa de 2014 por lesão, mas esteve em campo na conquista da Copa América de 2021.
A seleção argentina contou no Catar com um importante 12º jogador: a torcida, uma das mais atuantes na Copa. Nas partidas e principalmente na final, os torcedores não pararam de cantar “Muchachos”, a música tema desta seleção argentina. A melodia é antiga, do grupo La Mosca e Tsé Tsé, e tocada tradicionalmente durante os jogos locais, principalmente no estádio do Racing.
A nova letra foi composta pelo músico Fernando Romero e faz alusão aos soldados que lutaram nas Malvinas, aos pais de Maradona, a Messi, à conquista da Copa América contra os brasileiros em pleno Maracanã e, dramática, aos anos chorados pelas finais perdidas.
Circula na internet um vídeo dos próprios jogadores do time argentino cantando a música "Mucachos" dentro do vestiário, com Messi pulando e agitando a camisa nas mãos. Esse é um Lionel diferente do habitual, com um comportamento mais próximo ao polêmico Maradona, até aqui o ídolo maior dos torcedores argentinos.
Comenta-se que a transformação de Messi começou na Copa América de 2021. Antes daquela final, ele fez um discurso motivacional em que diz que o destino colocou a competição no Brasil (por causa da pandemia, a Argentina se recusou a ser sede), mas que isso traria um gosto diferente à vitória. O vídeo desse momento passou a circular nas redes sociais.
No Catar, Messi falou muito mais. No jogo das quartas de final provocou Van Gaal ao comemorar o segundo gol da Argentina, fazendo um gesto levando as mãos aos ouvidos. O técnico holandês havia dito antes que Messi não havia encostada na bola na semifinal da Copa de 2014, quando os holandeses foram derrotados pelos argentinos.
Depois, na coletiva após o jogo no Catar, Messi aparece dizendo “que mirás, bobo” para o atacante Wout Weghorst, que marcou os dois gols pela Holanda. Difícil imaginar o argentino com essa atitude algum tempo atrás.
Lionel Messi chegou à final como recordista de participação em Copas. Em jogos, estava empatado com o alemão Lothar Matthäus, com 25 partidas. Em vitórias, foram 16 antes da partida contra a França, duas a mais que o alemão. E em gols eram 11, um a menos que Pelé.
A final do Catar foi um embate entre Messi e Mbappé, companheiros no Paris Saint-Germain, que chegaram à final disputando o título e a artilharia da Copa do Catar. O argentino já havia conquistado todos os títulos europeus, mas chegou à sua quinta e derradeira Copa com esperança de levar a tão cobiçada taça.
Mbappé foi campeão em 2018 e chegou com a expectativa de se tornar neste domingo o primeiro jogador desde Pelé a ser bicampeão mundial antes dos 24 anos. Pelé tinha 21 anos na Copa de 1962.
Sempre se falou quem seria o próximo Pelé. Robinho, Ronaldinho Gaúcho, mesmo estrangeiros como Messi e o próprio Cristiano Ronaldo já foram citados como possíveis sucessores do Rei. Neymar estampou a capa da revista Time com essa chamada, "o novo Pelé". O próprio nunca deu muita bola a essas comparações.
O único a quem Pelé publicamente considerou a possibilidade de ser um novo Pelé foi Mbappé, em entrevista à revista France Footbal em 2019. O jornal L’Equipe publicou ontem na capa uma foto do jovem atacante francês comemorando o gol com o companheiro Giroud, em pose quase idêntica a de Pelé abraçado a Jairzinho logo depois do primeiro gol na final da Copa de 1970. Os próximos anos dirão se a aposta estava certa.
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A França foi talvez a seleção mais consistente na Copa do Catar e soube usar a experiência mesmo em momentos mais difíceis. Começou encantando, em ótima partida contra o fraco time da Austrália, com vitória por 4 a 1. A partir daí, foi se rendendo ao pragmatismo.
O colunista Paulo Vinícius Coelho, da SporTV, comparou esse time com a Alemanha de 1990. O time alemão então começou goleando a Iugoslávia e os Emirados Árabes, mas depois passou a apresentar um futebol amarrado, de resultado
A França de agora passou pela Inglaterra nas quartas de final em um jogo muito difícil e pelo Marrocos na semifinal dando passes curtos e administrando o tempo. Foi um time inferior ao de 2018. Na final, parecia que não ia conseguir reagir aos constantes ataques da Argentina, até fazer os dois gols quase na sequência, no segundo tempo, e fazer uma excelente prorrogação.
Foi uma estranha Copa, essa do Catar. Um estudo divulgado pela FIFA mostrou que, até a final, 85% dos gols nasceram das pontas do campo. A tática é uma discussão antiga no futebol. O clássico ponta de lança era figura essencial no desenho tático de times das décadas passadas. Na véspera da Copa de 1982 fazia sucesso o personagem Zé da Galera, de Jô Soares, que gritava o bordão “bota ponta, Telê”, em referência ao técnico da seleção brasileira Telê Santana.
Pois a força dos pontas voltou. Foi pela esquerda que Di Maria mais atacou e procurou oportunidades. Uma das poucas chances da França no primeiro tempo foi em uma falta por lá, um cruzamento de Griezmann para cabeçada de Giroud. Foi em uma arrancada pela esquerda que Di Maria foi derrubado na área para o pênalti para a Argentina.
Nem sempre nesta Copa quem teve mais posse de bola venceu. A Espanha fez um primeiro jogo soberbo contra a Costa Rica e foi uma das seleções que mais valorizou o tempo com a bola. Depois, decepcionou. Na final do Catar, a Argentina teve mais posse durante quase toda a partida. No fim, foi uma vitória perigosa para os cardíacos.