Repórter
Publicado em 17 de fevereiro de 2025 às 10h50.
Última atualização em 17 de fevereiro de 2025 às 16h46.
Já parou para pensar onde seu chefe treina após o expediente? Provavelmente, muitos profissionais façam essa pergunta nas horas livres. A resposta pode estar escondida na Rua Iguatemi (pertinho da Faria Lima), em um discreto edifício em meio à infinidade de restaurantes ao redor, que abriga em seu rooftop uma academia completa... só que focada no golfe.
A Tiro Certo entra em cena como o primeiro centro de treinamento pensado para esse modalidade no Brasil, tanto para atletas profissionais quanto amadores. A academia também se tornou o refúgio de artistas e apresentadores de TV e, principalmente, um lugar oportuno para CEOs e executivos treinarem juntos — e quem sabe fechar negócios.
A discreta academia foi fundada em 2018 pelas irmãs gêmeas Daniela e Gabriela Arantes, também treinadoras da Confederação Brasileira de Golfe (CBGolfe), especialistas na preparação de atletas de alta performance para a Seleção. O negócio que começou em um exíguo espaço de treinos, de 35 m², ganhou propulsão com a 'febre' do golfe entre executivos. Isso levou à migração para o rooftop do nº 309 da Rua Iguatemi, um ambiente que permite aos alunos se desligarem do caos urbano, literalmente.
A expansão para a nova academia, realizada em janeiro de 2024, envolveu o investimento inicial de R$ 1,5 milhão. O crescimento acelerado do número de alunos contribuiu para que a empresa alcançasse o breakeven (ponto de equilíbrio) logo no primeiro ano da nova operação, com o faturamento superior a R$ 2 milhões.
Daniela e Gabriela Arantes, sócias da academia Tiro Certo (Divulgação)
A Tiro Certo nasceu do desejo das empreendedoras em 'dar um gás' no desenvolvimento de atletas de elite e abrir as portas do golfe para os curiosos. No entanto, a paixão pelas tacadas veio após apostarem em outros esportes na juventude. "Somos malucas por futebol desde a infância, tanto que jogamos nas categorias de base com o sonho de nos tornamos profissionais. Mas, depois dos 15 anos, começamos a trabalhar e ficou difícil conciliar com os treinos", recorda Gabriela, em entrevista à EXAME.
Na década de 1990, as barreiras para ingressar no futebol eram maiores que as atuais, segundo Daniela Arantes, e isso fez com que as irmãs repensassem o caminho que seguiriam. "Há 30 anos, o mercado do futebol feminino era bem mais restrito e vimos que não valia a pena investir na pré-profissionalização. Mesmo assim, não queríamos nos afastar do esporte. Então, ingressamos na faculdade de educação física, onde jogamos futebol pelas ligas universitárias. Depois disso, passamos a trabalhar com tênis e maratonas".
Além da parceria na vida profissional, as gêmeas também chegaram a casar no mesmo dia. E na vida amorosa descobriram o golfe. O flerte partiu de um empurrão do marido de Daniela Arantes, Felipe Gama, filho de Manuel Gama, ex-presidente da Federação Paulista de Golfe. "A modalidade sempre fez parte da vida do meu marido. Mas nunca tive a menor vontade de jogar. Até que meu sogro me presenteou com o título de um clube focado apenas em golfe. Fui apenas para experimentar e principalmente acompanhar meu marido (confesso), mas, fui surpreendida e amei esse esporte".
A jornada de Daniela partiu de um simples hobby para a prática profissional e participação em torneios. Quando começou a estudar os métodos de preparação física para o golfe, notou que aí havia uma grande oportunidade de mercado. E rapidamente, puxou a irmã para essa empreitada, apesar de uma leve resistência da sócia. "Eu achava isso bizarro", brinca Gabriela, ao recordar suas primeiras impressões com o esporte.
Em 2018, foram para os Estados Unidos, onde se especializaram em golfe pela Titleist Performance Institute (TPI). Durante a temporada por lá, elas desenvolveram o próprio método de treinos e criaram conexões com diversos players desse universo. No entanto, sentiam insegurança em conquistar clientes com uma prática que ainda não era levada tão a sério no Brasil. As irmãs apostaram no potencial disso e, no mesmo ano, inauguraram a Tiro Certo. Na época, um espaço de poucos metros, e com uma quantidade limitadíssima de alunos. Embora o passo fosse pequeno, foi o suficiente para o negócio despontar.
Nos primeiros meses de operação, a Tiro Certo chamou a atenção da CBGolfe, e o então presidente Antônio Carlos Padula convidou as gêmeas para integrar a equipe da Seleção. Ao se tornarem referências em treinos para torneios, Daniela e Gabriela viram o número de matriculados crescer abruptamente. E em 2024, a empresa migrou para o espaço atual de 1.200 m², na Rua Iguatemi, conta atualmente com mais de 170 alunos.
O estabelecimento conta com uma sala de treino funcional equipada com 15 equipamentos de musculação de alta tecnologia e pesos livres e um campo externo de 30 jardas com putting green. O local ainda possui salas especializadas em quiropraxia e fisioterapia, além de equipamentos de recuperação Max Recovery.
Os alunos da Tiro Certo podem escolher outros treinos para aprimorar suas técnicas em golfe, como treino funcional e musculação. Além da preparação para outros esportes: tênis, triatlo, surfe, corrida e ski (ambos ainda em fase embrionária). Eles também contam com serviços de nutrição e uma enoteca com uma seleção de vinhos e whiskies diferenciados — para fechar os treinos com a sofisticação e conforto dos bares de luxo.
Uma das apostas da academia é a oferta de recursos exclusivos, como o simulador virtual de golfe (semelhante ao Kinect do Xbox) que tem impulsionado a performance dos alunos. Segundo as irmãs, esse tipo de recurso é raro no Brasil, encontrado apenas nas mansões de alguns golfistas. "Esse sistema fornece dados que a olhos nus é difícil de notar. O simulador consegue registrar a potência e a maneira que o taco atingiu a bola, o tempo da tacada, o total de jardas que a bola voou e o swing. No final, ele apresenta a pontuação do atleta", detalha Gabriela.
Ao recordar a acelerada evolução da Tiro Certo em seu primeiro ano de operação como academia, a treinadora declara com orgulho: "Foi fantástico. A maioria das empresas começa com o prejuízo. Antes de abrirmos o negócio, fomos avisadas que, no início, os resultados poderiam frustrar. Para nós, foi uma baita vitória".
Como professoras e preparadoras da CBGolfe, Gabriela e Daniela atendem diversos profissionais da modalidade, como o golfista Rafael Becker, que compete em circuitos internacionais. "Trabalhamos com atletas de alta performance e muitos outros da equipe juvenil do Brasil", acrescenta Dani. As duas se dedicam a atletas profissionais e amadores.
A notoriedade das gêmeas entre condomínios de luxo e clubes de golfe fez com que seus nomes chegassem aos ouvidos de artistas e importantes executivos do mercado financeiro. Entre as personalidades que treinam na Tiro Certo estão o banqueiro Olavo Setúbal Jr. (um dos donos do banco Itaú), Maneco Carrano (CEO da Technogym), a empresária Tatiana Loureiro e o advogado Paulo Cézar Aragão. Além dos apresentadores Tadeu Schimidt e Rodrigo Hilbert, o piloto Rubinho Barrichelo e os atores Marcos Pasquim e Rodrigo Lombardi.
"Como estamos em torneios e em vários campos, o networking do nosso negócio sempre orgânico, no boca a boca. A cada jogo que marcamos, ganhamos um cliente. Nem precisamos gastar tanto com marketing", ressalta. "O Rodrigo Lombardi, por exemplo, virou nosso garoto propaganda. Um dia ele compartilhou com o Tadeu Schimidt onde ele havia melhorado as tacadas dele, e essa indicação chegou ao Barrichelo e ao Hilbert".
O grande interesse dessa turma — e de muitos amadores — se deu especialmente pelo método de treino das gêmeas. Uma abordagem que avalia as características físicas de cada aluno, identificando suas forças e áreas a melhorar. Os professores da Tiro Certo desenham treinos específicos para mobilidade, força, flexibilidade e equilíbrio, visando otimizar a postura, o desempenho e a saúde geral dos alunos.
"Somos referências na preparação física para golfe. Então, amadores, profissionais, celebridades e executivos passaram a nos procurar para conhecer o método e conseguir os mesmos bons resultados dos atletas que treinamos para a Seleção brasileira", diz Daniela.
As gêmeas acreditam que a experiência personalizada foi a 'cereja do bolo' para a fidelização desse público. Além do acompanhamento individual dos professores, os alunos treinam em horários reservados, sem a necessidade de encarar filas e disputas por máquinas e com o máximo de tranquilidade. Para as celebridades, é a oportunidade de lazer e autocuidado, longe de fãs alvoroçados por selfies e paparazzis.
"Somos muito despachadas. Queremos deixar todos à vontade para treinar com serenidade. Quando um artista chega aqui, ele quer apenas a atenção dos professores e fazer seus exercícios sem interrupção dos fãs. Para eles, isso vale ouro", conta Gabi. "E adoramos desafiá-los para partidas. Eles sempre voltam aqui querendo aprender e jogar com a gente".
Já os executivos do principal centro financeiro do Brasil vão à Tiro Certo não apenas para aprimorar suas habilidades esportivas, como também para fazer networking e fechar negociações com outros empresários e stakeholders de maneira mais descontraída — sem as formalidades do ambiente corporativo.
"Eles treinam juntos e aproveitam os espaços de recreação da academia, especialmente a enoteca. Eles também gostam de conversar enquanto apreciam as bebidas disponíveis nesse espaço, como se estivessem em um bar de verdade. Assim, a Tiro Certo virou um point sofisticado de relacionamento entre executivos e empreendedores, pertinho dos principais escritórios da Faria Lima", acrescenta Gabriela.
Embora os planos sejam voltados principalmente para o golfe, a academia também oferece treinos funcionais, musculação e outras modalidades. Todas as atividades contam com a supervisão de um personal trainer, que acompanha e realiza correções quando necessário. Os planos estão disponíveis em opções trimestrais, semestrais e anuais, com frequência de 1 a 4 treinos por semana.
Os valores do acompanhamento dos profissionais variam entre R$ 690 e R$ 2.500 por mês. Nenhum desses planos inclui acesso ao simulador, que possui preços específicos: R$ 1.400 mensais para pacotes anuais, R$ 1.650 para semestrais e R$ 1.800 para trimestrais.
Quem quiser treinar com as irmãs gêmeas Daniela e Gabriela terá que pagar mais caro. O pacote de uma sessão semanal com elas durante custa R$ 12 mil ao ano, com mensalidade de R$ 1 mil. O plano mais caro inclui quatro treinos semanais por R$ 3.800 ao mês, totalizando R$ 45.600 por ano.
Tradicionalmente associado à elite, o golfe tem ganhado popularidade no Brasil, especialmente entre executivos. Atualmente, o país conta com mais de 100 campos e cerca de 22 mil praticantes regulares, segundo dados divulgados pela Confederação Brasileira de Golfe.
Embora o número de campos e praticantes tenha aumentado, o golfe ainda enfrenta desafios no Brasil. Os principais obstáculos são os altos custos para praticar e a escassez de campos públicos. Para Gabriela Arantes, o esporte ainda é pouco conhecido entre os brasileiros, o que limita uma expansão mais acelerada da prática.
"Desde quando começamos esse negócio até o momento atual, encaramos dificuldades para estimular a cultura do golfe por aqui. Muitos brasileiros ainda o interpretam como um esporte de gente velha, gorda e sedentária que só anda em carrinhos pelos campos, fumando charutos", salienta. "Mas aos poucos, estamos fazendo as pessoas entendam que é uma prática que exige uma preparação física. Muitos dos nossos alunos viajam com frequência para outros países e notam como esse esporte é levado mais a sério".
Daniela defende que a visibilidade de atletas brasileiros em grandes circuitos difunde a credibilidade da modalidade. "O golfista é um ser viciado nesse esporte. Ele sempre faz o que é necessário para melhorar suas jogadas. E preconizamos bons hábitos com base nas orientações da Organização Mundial da Saúde. Então, os resultados que esses profissionais apresentam trazem uma nova imagem ao golfe".
Outra barreira é a falta de representatividade feminina. "O golfe ainda é um esporte majoritariamente masculino e com muitos preconceitos contra a inclusão de mulheres. Estima-se que 80% dos golfistas são homens, enquantos as mulheres representam 20%. Mas, aos poucas, elas estão virando a chave, graças ao crescente número de associações de golfistas femininas", aponta Gabi.
Já Daniela reforça que a entrada das mulheres na modalidade contribui para a formação de novas gerações de golfistas, na medida que a prática é passada aos filhos. "Cada vez mais as mães estão levando eles para os campos e clubes e isso ajuda no desenvolvimento desse esporte para o futuro, porque essas crianças serão os atletas que teremos nos próximos anos.
"Nas Olimpíadas de Paris, por exemplo, não tivemos um representante do Brasil no golfe. É difícil formar atletas por aqui porque não temos uma massa crítica. Quase não há crianças jogando. Alguns movimentos, como o 'Brasil Kids Golfe', incentivam os pequenos a entrarem em campo, respeitando suas categorias. Por isso, a chegada das mulheres e das crianças é a solução para o Brasil ter grandes campeões nos próximos anos", finaliza.