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Reforma tributária verde: o que é e por que ela é importante

O Brasil discute um novo sistema tributário há meio século. Agora, o tema ganhou um complicador: como incentivar a economia de baixo carbono

A reforma verde se refere a um conjunto de impostos e incentivos voltados a fomentar a transição para a nova economia, também conhecida por economia de baixo carbono (Steve Proehl/Getty Images)

A reforma verde se refere a um conjunto de impostos e incentivos voltados a fomentar a transição para a nova economia, também conhecida por economia de baixo carbono (Steve Proehl/Getty Images)

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Rodrigo Caetano

Publicado em 23 de outubro de 2020 às 12h44.

Última atualização em 23 de outubro de 2020 às 17h48.

Ministro da Fazenda no governo Itamar Franco e ministro do Meio Ambiente no governo Fernando Henrique Cardoso, Gustavo Krause se autointitula uma “peça de museu” em reforma tributária. “Passei no concurso de auditor fiscal em 1970. Lido com a questão há 50 anos”, afirma Krause. Advogado especializado em direito tributário, o ex-político é sucinto ao falar do resultado das inúmeras discussões nacionais sobre o tema. “Nunca aconteceu nada, a não ser jogar nas nossas costas mais de 30% de carga tributária”, afirma. “Mas, um dia vai ter de acontecer, por bem ou por mal.” 

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A reforma tributária é, na visão de Krause, o maior consenso do país. Então, por que não sai do papel? “A questão é que você acaba arrumando inimigos à vista e aliados a prazo”, explica. Estudada à exaustão, a reforma não sobrevive ao cenário político. A urgência, no entanto, nunca foi tão grande. E a pressão vem de um aspecto pouco conectado ao universo tributarista: o meio ambiente

Nas rodas mais progressistas da política tributária, o tema da vez é a “reforma verde”. O termo se refere a um conjunto de impostos e incentivos voltados a fomentar a transição para a nova economia, também conhecida por economia de baixo carbono. A ideia é que a carga tributária favorece setores considerados “limpos”, ou seja, que emitem menos carbono, como as energias renováveis. Ao mesmo tempo, grandes emissores seriam punidos com taxas mais altas. 

A União Europeia é o bloco econômico mais avançado no tema. Há mais de dez anos, o velho continente mantém um sistema de precificação das emissões, com metas de redução e penalização para quem não as cumpre. Trata-se do mercado de carbono europeu, que funciona, praticamente, como um imposto. Taxar o carbono, por sinal, é a parte polêmica da reforma verde. A ideia de criar uma nova taxa, como diz Krause, tem a capacidade de gerar inimigos imediatamente. Incentivo é uma palavra mais aceita, embora, na prática, estabelecer um mecanismo de comercialização das emissões ou um novo imposto acabe dando no mesmo. Quem emite mais vai acabar pagando por isso. 

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Para Ian Parry, principal especialista em política fiscal ambiental do Fundo Monetário Internacional (FMI), as empresas podem até gostar da ideia de um mercado de carbono, que parece mais amigável, porém, taxar as emissões é mais rápido e eficiente. “A taxação é um instrumento natural”, afirma Parry. “O efeito é imediato e aumenta a receita do governo, que pode investir em outras áreas.” O Ministério da Economia vem trabalhando, junto com escritórios de advocacia, a B3 e outras partes interessadas no assunto, em um marco legal para o mercado de carbono brasileiro. Paulo Guedes, no entanto, não quer nem ouvir falar em um novo imposto. 

Krause e Parry participarão de um debate promovido Câmara de Comercio Internacional Brasil e a Convergência pelo Brasil (coordenada pelo Instituto Clima e Sociedade e pelo Instituto O Mundo Que Queremos) sobre reforma tributária verde. O evento acontece no dia 3 de novembro, às 10h (mais detalhes ao final da reportagem). 

Mas a reforma tributária verde não se resume na criação de novos impostos. Mecanismo já existentes, por sinal, podem ser aprimorados para incentivar mercados de baixo carbono. Um exemplo são as Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico, mais conhecidas como Cide. De competência da União e com arrecadação vinculadas, o imposto é um mecanismo rápido que já pode ser utilizado para incentivar a economia verde. A Cide, por sinal, já incide sobre combustíveis fósseis. “Está aí para ser usada”, diz o ex-ministro Krause. 

O Brasil e a nova economia

Para o Brasil, país com a maior biodiversidade do mundo, a guinada verde traz oportunidades grandiosas. Em números, a transição para uma economia de baixo carbono significa crescer 15% mais do que o previsto até 2030, o que agregaria 2,8 trilhões de reais ao produto interno bruto em dez anos. 

A riqueza adicional abriria 2 milhões de empregos na economia — metade deles na indústria. É o que estima um estudo inédito do WRI, uma das principais entidades ambientalistas dos Estados Unidos, junto a pesquisadores brasileiros da PUC-Rio, da escola de negócios Coppe/UFRJ, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, além da Febraban, a federação dos bancos brasileiros, e dos think tanks Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) e Climate Policy Initiative.

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Para dimensionar os benefícios dessa retomada verde à economia brasileira, os pesquisadores mapearam 10.000 tecnologias com emissão reduzida de carbono e as políticas em curso para adotá-las no governo e na iniciativa privada. No radar estavam propostas como a integração fazenda-lavoura-pecuária, uma técnica de aumento da produtividade no campo criada pela estatal Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) com base no melhor uso do solo de pastagens. Ou os incentivos para a troca da fonte de energia na indústria brasileira, hoje ainda muito dependente do petróleo e do carvão, para fontes limpas — foco do programa RenovaBio, do governo federal.

Os pesquisadores projetaram a evolução do PIB até 2030 em cenários com a evolução desses programas. Em paralelo, mediram a evolução do PIB caso nada seja feito. “Não são simples previsões, são cenários possíveis com base em variáveis econômicas existentes”, diz Roberto Schaeffer, professor da Coppe/UFRJ.

As reformas em curso 

Existem três projetos de reforma tributária atualmente em discussão. Todos sugerem mudanças na base tributária de consumo no país, que corresponde à maior parte da arrecadação do governo.

A ideia central das propostas é resolver o problema da dificuldade em entender quanto se paga em tributos. O objetivo é unir impostos – sobretudo PIS e Cofins – por meio de uma alíquota única. Das três, a proposta do governo é a mais simples, porque foi enviada de forma fatiada ao Congresso, e uniria apenas PIS e Cofins, com a Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS).

A PEC 45, que tramita na Câmara dos Deputados, tem como um dos autores Appy e é a mais abrangente de todas. O texto unifica nove tributos, criando o IBS, Imposto sobre Bens e Serviços. A PEC 110, de autoria de Hauly e que está no Senado Federal, também propõe criar o IBS, mas com a unificação de cinco tributos.

Mas a grande questão que nenhuma das propostas resolve, é diminuir a carga tributária que o brasileiro paga. De acordo com o impostômetro da Associação Comercial de São Paulo, até a sexta-feira, 25, nós já pagamos quase 1,5 trilhão de reais em tributos.

Além de não reduzir, há o risco de até aumentar a carga tributária para alguns setores. Paralelamente, o governo articula para tentar criar uma da nova CPMF repaginada, com a desoneração da folha de pagamento (dos encargos que as empresas pagam sobre os salários dos funcionários). A estratégia é uma proposta “pegar carona” na outra. Ou seja, os próximos passos desta reforma precisa de muita atenção dos brasileiros.

Convergência pelo Brasil realiza webinar sobre retomada verde

A Câmara de Comercio Internacional Brasil e a Convergência pelo Brasil (coordenada pelo Instituto Clima e Sociedade e pelo Instituto O Mundo Que Queremos) promovem, no dia 3 de novembro, um webinar sobre a reforma tributária verde. O evento contará com as presenças do ex-ministro da Fazenda e do Meio Ambiente, Gustavo Krause, e do principal especialista em política fiscal ambiental do Fundo Monetário Internacional (FMI) O debate terá transmissão em inglês e com tradução simultânea para português. A transmissão começa às 10h. 

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