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O que Medellín pode ensinar ao Brasil sobre urbanização e combate à violência

Celso Athayde relata sua experiência na Colômbia, onde conheceu a Comuna 13, favela antes dominada por Pablo Escobar e que hoje, em paz, fatura com turismo e serviços

A favela Comuna 13, em Medellín: gestão pública e mobilidade, com escadas rolantes, trouxeram prosperidade à região, que já foi a mais violenta do mundo (Matthias Bachmaier/Getty Images)

A favela Comuna 13, em Medellín: gestão pública e mobilidade, com escadas rolantes, trouxeram prosperidade à região, que já foi a mais violenta do mundo (Matthias Bachmaier/Getty Images)

Celso Athayde
Celso Athayde

CEO da Favela Holding

Publicado em 12 de junho de 2023 às 09h24.

Acabei de chegar da Colômbia. Embarquei no táxi aqui em Guarulhos. Mesmo com sono vou escrever um pouquinho, um milésimo do que senti. Foi tudo incrível, divertido, cansativo e intenso. A transformação social que Medellín, em especial, passou e ainda passa depois de ter sido considerada a cidade mais violenta do mundo é inacreditável. Falo do conjunto de inovação.

Fui acompanhado de uma caravana chapa quente que inclui amigos da Central Única de Favelas (Cufa), Ministério do Planejamento, Ministério dos Direito Humanos, Frente Nacional Antirracista, o deputado federal Washington Quaquá, o secretário de desenvolvimento econômico do município do rio Diego Zeidan, o secretário de juventude de fortaleza Davi Gomes, só para citar alguns.

Entre tantas figuras de secretarias e ministérios fomos ciceroneados pelas grandes autoridades do tema no Brasil e Colômbia. Jorge Melguizo, um colombiano estudioso da cultura e intervenções sociais urbanas, e Murilo Cavalcante, pernambucano que se tornou um estudioso e reconhecido pesquisador e gestor público.  Mas como o espaço é curto não vou falar deles. Quero me dedicar às favelas.

Visitamos a Comuna 13, favela que passou por uma transformação absurda, assim como a cidade. Tudo isso em função de uma luta coletiva de toda uma sociedade para se livrar das manchas do horror romântico que foi a era Escobar. Horror porque o país foi submetido a toda forma de caos, seja pelo narcotráfico, pelas milícias, pelas Farcs ou pelo poder legítimo que vivia conflitos internos.

A Comuna 13 é idêntica ao Complexo do Alemão em algumas partes, ou à rocinha, o que me fez fazer várias ligações de vídeo para amigos dessas duas favelas e compartilhar a experiência ao vivo. A Comuna foi conhecida como uma das áreas mais perigosas e violentas do país. Hoje,  a favela agora é um exemplo notável de revitalização urbana e progresso social – e ninguém me contou, eu vi.

Venda de drogas

Nada ostensivo, mas claro que existe venda de drogas na gigante favela, o que não existe é violência, guerras e destruição que devasta milhares de lares. Aliás, no próprio centro da cidade se permite acender um baseado, tal qual Nova York.  Não é de se estranhar que há como obter no local o produto que está descriminalizado. Tudo absolutamente dentro da paz e normalidade, um grande shopping a céu aberto.  Eu nunca tinha visto nada igual.

É o maior turismo social em favela que tive notícia. Muito longe de ser um safári, como se passa, em muitos casos, com as favelas do Rio de Janeiro. Vi um mergulho na memória do lugar com direito a milhões de reais sendo deixados para a economia local diariamente, na compra de produtos de toda ordem. Camisetas, restaurantes, quadros e tudo que se possa imaginar.

Para chegar aos pontos mais altos da Comuna, não precisa de muito esforço na subida. Escadas rolantes garantem o conforto dos visitantes, e dos moradores. Sim, ao chegar na favela uma grande parte você sobe de escada rolante, instaladas para melhorar a mobilidade dos residentes e que se tornaram um símbolo da transformação da Comuna 13.

O contraste cultural ficava por conta da grande quantidade de camisas estampadas com o rosto e frases de Pablo Escobar.  Era uma mistura de apologia plena ao tráfico e à memória do homem que, na visão de uma parte dos moradores, os livrou do horror das Farcs -- há relatos de mulheres violentadas e crianças sequestradas para servir a guerrilha.

O fato é que essa tal de Comuna é apenas uma pequena parte de uma história gigante de transformação social que vi, vivi, senti e me emocionei.

Pois bem, cada país tem sua base e construção histórica que precisa ser capaz de se reinventar e melhorar sua realidade sem deixar de olhar para tantas outras experiências externas. O exemplo de Medellín não se resume à favela. É um projeto, principalmente, de gestão pública. Se queremos efetivamente equilibrar as relações entre favela e asfalto no Brasil, vamos precisar começar a mudar a cabeça dos nossos gestores.

Aliás, já começamos. Tanto é que mais de duzentos parlamentares, além de ministros e governadores, estarão conosco no próximo dia 14 em Brasília assinando o lançamento de uma frente parlamentar para o desenvolvimento das favelas. Isso pode ser visto como uma jogada de marketing cheia de fumaça, ou como o start de um processo real de mudança de códigos sociais.  Sem os quais, vamos fechar as portas da favela e do asfalto e jogar a toalha.

- Chegamos, seu Celso.

- Epa, estava focado aqui no texto. Quanto é?

-  R$ 112,00.  Vou pagar o moço aqui. Falamos depois. Bom dia!

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