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Com mais de 15% da biodiversidade de todo o planeta e detentor de cerca de 60% da floresta amazônica, o Brasil é peça-central das discussões de conservação (Andre Pinto/Getty Images)
Repórter de ESG
Publicado em 20 de outubro de 2024 às 08h00.
Última atualização em 21 de outubro de 2024 às 12h06.
"O principal da COP16 será a transição de promessas para ações concretas e mensuráveis, além do fortalecimento dos compromissos financeiros e técnicos para que os países possam implementar suas metas de forma eficaz e justa", disse à EXAME Michel Santos, gerente de Políticas Públicas do WWF-Brasil. A rede, que nasceu em 1996 como um fundo internacional para a preservação de ursos pandas na China, é hoje a maior de conservação do mundo e atua ativamente em mais de 100 países.
Com mais de 15% da biodiversidade de todo o planeta e detentor de cerca de 60% da floresta amazônica, o Brasil é peça-central das discussões de conservação que começam nesta segunda-feira (21) na COP16 em Cali, na Colômbia, e vão até 1º de novembro.
Mas afinal, o que está em jogo e qual o protagonismo brasileiro? A Conferência é um tratado da Organização da ONU estabelecido durante a ECO-92 no Rio de Janeiro em junho de 1992, e um dos mais importantes instrumentos internacionais de proteção ao ambiente e todas suas formas de vida.
A cada dois anos, reúne os 196 países-membros da ONU para discutir soluções e compromissos para restaurar e conservar os ambientes terrestres e marítimos da Terra.
Segundo o WWF, a missão da 16º edição é avaliar o progresso dos países em relação ao alcance dos compromissos do Marco Global de Biodiversidade (GBF, na sigla em inglês), acordo global firmado durante a última COP15 de 2022, em Montreal, no Canadá. O marco considerado o "Acordo de Paris da biodiversidade" foi histórico e estabeleceu 23 metas globais ambiciosas para conter e reverter a perda de biodiversidade até 2030, além de quatro objetivos gerais até 2050.
A batizada de “30×30” é a mais conhecida e estabelece que os países devem conservar ao menos 30% de suas áreas terrestres e marinhas nos próximos seis anos.
"O destaque é a mobilização de recursos financeiros, mecanismos de monitoramento e a integração de estratégias de conservação da biodiversidade com a agenda climática", disse Michel. Esta será a primeira vez que os países signatários da convenção irão sentar a mesa e avaliar suas Estratégias e Planos de Ação Nacionais de Biodiversidade, as "EPANB" (sigla em português).
Uma análise recente do WWF já revelou que a maioria dos países não está cumprindo totalmente seus compromissos de interromper e reverter a perda da natureza até 2030. Às vésperas da COP16, são apenas 20 EPANB revisadas e apenas cerca de 60 metas publicadas.
O Brasil está entre os que não apresentaram sua estratégia e ação nacional. Além disso, das 33% publicadas, muitas parecem omitir maneiras claras e consistentes de medir o progresso, apontou o WWF.
Ao mesmo tempo, outro estudo da organização liga um alerta: o mundo perdeu 73% de vida selvagem em apenas 50 anos, com ambientes naturais próximos de um ponto de não retorno e com consequências drásticas para a vida na Terra.
Segundo o especialista, embora hajam avanços em novas áreas protegidas pelo mundo, a questão é como garantir que estas sejam efetivamente geridas e financiadas. Isso envolveria um financiamento significativo de recursos, para prencher uma lacuna estimada em US$ 200 bilhões, e também faz parte da Meta 19 -- especialmente voltada a países em desenvolvimento e impulsionada pelo setor privado.
"Até agora, a captação ainda está aquém do necessário para alcançarmos as metas. Será essencial que se discutam novos mecanismos de financiamento -- incluindo fundos para biodiversidade e incentivos para práticas econômicas sustentáveis que possam reverter a perda de biodiversidade", destacou Michel.
No caso brasileiro, o especialista do WWF destacou alguns avanços desde a última COP de Montreal, como uma queda significativa no desmatamento na Amazônia nos últimos meses e a criação de novas Unidades de Conservação e a homologação de territórios indígenas -- essenciais para a proteção de ecossistemas críticos.
Por outro lado, há o desafio urgente de reduzir a perda de habitat natural no Cerrado, que continua a sofrer com a expansão agrícola. "O país tem potencial de ser um dos protagonistas nessas discussões, especialmente considerando sua enorme biodiversidade e o fato de que sediará a COP30 do Clima em 2025. Embora não tenhamos apresentado um plano nacional a tempo da COP16, ainda podemos liderar em soluções inovadoras para proteger a biodiversidade e integrar conservação e desenvolvimento sustentável", acrescentou Michel.
Segundo o governo, o Brasil terá uma agenda com mais de 20 temas para debate, com foco em negociações de financiamento e sequenciamento digital dos recursos genéticos.
Em comunicado, a Secretária de Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Rita Mesquita, destacou uma série de iniciativas do país para construção de intercâmbios e parcerias, entre eles a aprovação do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa, que contempla todos os biomas brasileiros e tem centralidade no Plano Clima. "Talvez seja a maior entrega que iremos fazer no âmbito dos compromissos assumidos", disse.
A conexão entre a COP da biodiversidade e a Conferência do Clima da ONU (COP29), neste ano no Azerbaijão, também é ponto central. Segundo Michel, a integração entre as duas conferências ganha cada vez mais relevância, dado o papel da natureza na mitigação e adaptação às mudanças climáticas.
"Há uma expectativa que os países discutam mecanismos de valorização e proteção dos conhecimentos tradicionais das populações indígenas e comunidades locais, que desempenham um papel fundamental na conservação dos ecossistemas", explicou.
Ambas as crises globais estão interligadas, pois não afetam apenas o ambiente e todas suas formas de vida, mas também a humanidade. Por isso, especialistas consideram que as metas deveriam ser consideradas e pensadas em conjunto, promovendo uma abordagem integrada. "Ecossistemas saudáveis, como florestas, manguezais e zonas úmidas, atuam como sumidouros de carbono e ajudam a regular o clima, fornecendo serviços ecossistêmicos essenciais", complementou Michel.
Em entrevista à imprensa, André Aranha do Lago, secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores (MRE), destacou que essas convenções são resultado de um processo de avanço da ciência e do conhecimento, e permitiram que as nações concordassem sobre ações feitas para minimizar o impacto das atividades humanas no clima e biodiversidade.
"Quanto mais o tempo passa, mais achamos que deve haver uma grande integração entre essas discussões, porque naturalmente a mudança do clima está tendo um impacto brutal sobre a biodiversidade", escreveu André.