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Noites em claro e ordem de evacuação: incêndios históricos impõem nova rotina na Califórnia

A brasileira Graziela Shepnick mora em LA e relatou à EXAME dias de terror com as chamas se aproximando de casa, além de um cenário de destruição; evento é agravado pelas mudanças climáticas

O incêndio Palisades é o pior dos focos e já destruiu mais de mil casas e construções em Los Angeles (AGUSTIN PAULLIER/AFP)

O incêndio Palisades é o pior dos focos e já destruiu mais de mil casas e construções em Los Angeles (AGUSTIN PAULLIER/AFP)

Sofia Schuck
Sofia Schuck

Repórter de ESG

Publicado em 9 de janeiro de 2025 às 12h34.

Última atualização em 9 de janeiro de 2025 às 17h11.

"Eu estava um pouco mais calma agora de manhã, mas logo já apreensiva de novo porque vi alguns vídeos do bairro de uma amiga que mais parece a Faixa de Gaza. Agora, está cheirando a fumaça aqui em casa, mesmo com os purificadores de ar ligados. A atualização do departamento de bombeiros foi sombria. O bairro Pacific Palisades fica a 7 minutos de carro de onde eu moro. Mil casas evaporaram, a High School, o centro de recreação, o parque onde as minhas filhas estudaram na pré-escola. Daqui, vejo fumaça e ouço sirenes. O incêndio está incontrolável até agora, e as condições continuam bem ruins. A cidade organizou a evacuação para as pessoas e seus animais de estimação. Estamos recebendo notificações do sistema de emergência pelo telefone. Quem não tem para onde ir, vai para esses locais. Outras pessoas vão para as casas de amigos, familiares, Airbnbs e hotéis. Nós mesmos recebemos duas famílias de amigos durante a noite".

Este foi o relato de Graziela Medina Shepnick à EXAME, um pouco antes dela e sua família dizer que iria evacuar seu lar em Los Angeles, na Califórnia. No fim, era um alarme falso, e ela nos informou depois que segue em sua casa -- mas sob alerta. A brasileira mora com seu marido norte-americano e duas filhas há mais de uma década nos EUA, e vive na pele o pior incêndio da história da cidade americana. 

Sua casa fica bem próxima ao bairro nobre Pacific Palisades (LA), onde acontece o pior dos seis focos de fogo registrados -- e alguns "incontroláveis" pela força-tarefa de autoridades. Na quarta-feira (8), ela contou passar as últimas noites em claro. No momento, Graziela também está abrigando duas familias de evacuados com criancas e cachorros.

Incêndio em LA

Do quintal de casa, Graziela vê a fumaça e chamas se aproximando (Divulgação)

O incêndio Palisades já atinge 64,7 km² e está zero contido, segundo informações dos bombeiros de LA. A área devastada pelo fogo seria o equivalente a um pouco mais do que a Ilha de Manhattan, em Nova York, e já destruiu mais de mil estruturas e construções. Cientistas já o consideram o mais caro da história dos EUA.

Paralelamente, acontecem outros pela cidade: Eaton (42,90 km²), Hurst (3,46 km²), Lidia (1,41 km²) e Sunset (0,24 km²). Até então, ao menos cinco mortes foram registradas e 130 mil pessoas foram impactadas por ordens de evacuação.

Assim como Graziela, outros brasileiros que vivem lá, presenciam um cenário de caos. Frente à emergência, o Airbnb comunicou que está oferecendo acomodação e alojamentos para os residentes que estão sem moradias. 

A prefeita da cidade, Karen Bass, declarou que “esta é a grande tempestade de fogo”. Ontem a noite, as chamas também se alastraram por Hollywood Hills, região turística conhecida por atrações icônicas como o TCL Chinese Theatre e parte da Calçada da Fama de Hollywood. 

Reflexo das mudanças climáticas

É unanimidade para a ciência que eventos climáticos extremos são agravados pelas mudanças climáticas. Os incêndios sem precedentes e incontroláveis que estão acontecendo nos EUA são uma situação bastante atípica nesta época do ano, visto que é inverno no hemisfério norte e usualmente não se tem um clima quente e nem seco na estação.

Na Califórnia, o fogo se alastrou e intensificou com a seca: cerca de 30% do Estado não vê a chuva há meses e há também a ocorrência de um fenômeno chamado ventos de Santa Ana, retirando ainda mais a umidade do ar e espalhando as chamas rapidamente.  

Willians Bini, Climate Business Strategist e metereologista há mais de 25 anos, disse à EXAME que estes ventos são conhecidos como "catabáticos" no Brasil, e se caracterizam por serem mais intensos e descerem de áreas mais altas.

"Embora ainda sejam necessários mais estudos, as mudanças climáticas podem estar interferindo no padrão deles [ventos], os tornando mais frequentes e com ocorrência em outros períodos", explicou. Segundo o especialista, o fenômeno é mais comum no outono, de setembro a dezembro no hemisfério norte, e não no inverno.

Além disso, Willians destaca a diferença entre queimadas e incêndios. Enquanto o primeiro termo se refere a ações antropogênicas e causadas pelo homem (seja pelo manejo agrícola ou operacional), o segundo é intencional e muitas vezes provocado por questões "naturais", como é o caso do que ocorre atualmente nos EUA. 

"Os incêndios são condições de um clima mais seco e de menos umidade, temperaturas mais altas e eventualmente condições atmosféricas instáveis. Na Califórnia, não estamos falando de ações criminosas para desenvolver áreas agrícolas, são eventos de um clima extremo e a longo prazo", destaca. 

Desde a década de 80, satélites remotos conseguem mensurar e fazer comparativos sobre queimadas e incêndios pelo planeta. Segundo Willians, este é o mais intenso dos últimos anos, e atinge áreas de grandes centros -- o que torna a questão mais grave devido aos problemas e transtornos para a população. 

"Nosso parâmetro de clima está constantemente mudando. O planeta está saindo de uma condição de normalidade e climatologia para um cenário desconhecido. Estes eventos são reflexos destes padrões", ressalta.

O especialista também reforça que não é possível mais apenas mitigar os riscos climáticos e reduzir emissões, é preciso investir em adaptação e cidades mais resilientes. "Precisamos nos adaptar às novas condições, porque a mudança já está em andamento e não vai alterar em curto prazo.  Por mais que a humanidade tome ações imediatas, isto demora um tempo", disse. 

Frente ao cenário emergencial, parte da solução pode estar na tecnologia e inovação, acredita Willians. Ele diz que no caso de incêndios e queimadas, ainda evoluímos pouco e combatemos os focos "de forma medieval", jogando água ou 'batendo no chão'. Por outro lado, há startups e empresas à frente de tecnologias promissoras.

É o caso de drones, que utilizam o sensoriamento remoto para identificar o fogo de forma instantânea pelo calor ou fumaça, e são capazes de dar início imediato ao combate ao disparar bombas de potássio. Isto tudo, em questão de segundos.

"Todo fogo começa pequeno e vai ganhando grandes proporções. Dessa forma, eu impeço que o foco cresça e se exponha. O futuro do combate e do monitoramento precisa estar nessa linha: ser rápido, preciso e imediato", complementou o especialista. 

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