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Com histórico de US$ 100 milhões investidos em equidade racial, companhia confronta pressão de grupos conservadores e reafirma compromisso com diversidade (Leandro Fonseca/Exame)
Editora ESG
Publicado em 12 de janeiro de 2025 às 12h32.
Última atualização em 12 de janeiro de 2025 às 12h34.
Enquanto boa parte das grandes corporações do Vale do Silício mergulha na onda anti-DEI, a Apple nada contra a corrente ao defender publicamente a manutenção de seus programas de diversidade, desafiando acionistas que pedem o fim das iniciativas de inclusão.
A posição da fabricante do iPhone foi revelada em documento enviado a investidores, onde recomenda que seus acionistas votem contra a proposta de eliminação dos programas de Diversidade, Equidade e Inclusão (DE&I), em assembleia prevista para o próximo dia 25 de fevereiro.
A recomendação confronta uma iniciativa do National Center for Public Policy Research (NCPPR), think tank conservadora que, como acionista da Apple, utilizou seu direito de apresentar propostas para votação na assembleia geral. O grupo, conhecido por pressionar grandes empresas americanas contra políticas progressistas, argumenta que os programas DE&I expõem a companhia a riscos legais e financeiros após a decisão da Suprema Corte contra ações afirmativas em 2023.
Participação acionária como munição
A estratégia da NCPPR de atuar via participação acionária tem sido replicada em outras corporações do país, em que o grupo adquire ações para ganhar direito a voz em assembleias e apresentar propostas anti-DE&I. Em 2023, a think tank já havia tentado medidas similares em empresas como Bank of America e Johnson & Johnson, consolidando uma tática que combina ativismo conservador com pressão corporativa.
A posição da fabricante do iPhone surge poucos dias após a Meta, dona do Facebook e Instagram, anunciar o encerramento de seus programas de diversidade, justificando as decisões justamente por "mudanças no cenário legal e político".
A leitura majoritária do mercado, porém, é de que a movimentação de Zuckerberg é parte de uma agressiva estratégia de aproximação com Donald Trump, novo presidente dos EUA, que toma posse na próxima semana, depois de atuar como crítico ferrenho à companhia, ameaçando retaliar contra o bilionário da tecnologia.
"A proposta é desnecessária, já que a Apple tem um programa de compliance bem estabelecido", afirmou o conselho da empresa, que inclui o CEO, Tim Cook. E o board foi além, acusando a NCPPR de tentar "microgerenciar" a companhia, argumentando que a proposta "tenta inadequadamente restringir a capacidade da Apple de gerenciar suas próprias operações comerciais, pessoas, equipes e estratégias de negócios".
Numa defesa mais profunda de seus programas de diversidade, a Apple reafirmou seu compromisso como "empregadora de oportunidades iguais que não discrimina em recrutamento, contratação, treinamento ou promoção em qualquer base protegida por lei". O posicionamento reflete uma trajetória consistente da empresa nas últimas décadas.
O legado de inclusão pós Tim Cook
Sob a liderança de Tim Cook, que em 2014 se tornou o primeiro CEO abertamente gay de uma marca Fortune 500, a companhia ampliou significativamente suas iniciativas de inclusão. Entre 2014 e 2023, dobrou o número de funcionários de grupos sub-representados globalmente, além de estabelecer parcerias com universidades historicamente negras e instituições voltadas para minorias.
E em 2020, após os protestos do Black Lives Matter, comprometeu US$ 100 milhões em iniciativas de equidade racial, incluindo a criação de uma escola de desenvolvedores em Detroit e um centro de inovação em Atlanta, focados na comunidade negra. A postura destoa do atual momento corporativo americano, onde empresas recuam de iniciativas estabelecidas após o Black Lives Matter e as discussões sobre disparidades raciais.
Contudo, a divergência entre Apple e Meta representa mais que uma simples discordância sobre políticas internas , e expõe dois caminhos distintos de resposta à crescente pressão conservadora. Enquanto algumas empresas optam por um rápido realinhamento político, outras parecem dispostas a sustentar princípios estabelecidos mesmo em um ambiente adverso.
Agora, o resultado da votação de 25 de fevereiro na assembleia da Apple poderá indicar não somente o futuro dos programas DE&I na companhia, como também a força da resistência corporativa ao movimento anti-woke que avança nos Estados Unidos e em outras economias significativas. Um termômetro importante para empresas globais que observam atentamente como navegar neste novo cenário político e social americano.
* Com informações da AFP