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Metade das mulheres brasileiras já sofreram algum tipo de violência doméstica (Carol Yepes/Getty Images)
Repórter de ESG
Publicado em 14 de março de 2024 às 13h53.
Última atualização em 14 de março de 2024 às 18h55.
De Nova York*
Metade das mulheres brasileiras já sofreu algum tipo de violência doméstica ao longo de suas vidas, mas parte delas ainda não se reconhece exatamente como vítima. O dado faz parte da primeira atualização do Mapa Nacional da Violência de Gênero, projeto de parceria entre o Observatório da Mulher Contra a Violência (OMV) e o DataSenado, ambos do Senado Federal, o Instituto Avon e a Gênero e Número.
Esta é a primeira vez, desde 2005, que a Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher apresenta recortes estaduais, o relatório é apresentado nesta quinta-feira, 14, durante evento do Pacto Global da ONU - Rede Brasil, em evento em Nova York, paralelo à 68ª Comissão da Situação da Mulher (CSW).
"O lançamento dos dados da pesquisa é importante ao considerar a robustez, uma vez que há anos o Observatório da Mulher não tinha recursos para a amostragem. Agora, estamos colocando o tema em foco, com uma periodicidade para melhor entendermos o cenário e promover ações de combate à violência", diz Daniela Grelin, diretora executiva do Instituto Avon em entrevista à EXAME.
De acordo com o levantamento, 48% das brasileiras ouvidas já passaram por alguma situação de violência doméstica e familiar. Do total das mais de 20 mil mulheres brasileiras entrevistadas, 30% reconheceram a violência vivida e a nomearam como tal.
No entanto, 18% ainda não se identificam espontaneamente como vítimas, porém, quando foram apresentadas a situações específicas de violência doméstica, admitiram ter passado por elas – dado que indica que o número de brasileiras que sofrem violações é muito maior do que os registros oficiais.
"É interessante notar como as mulheres percebem a violência. Quando perguntamos se ela sofreu alguma violência, elas dizem não. Mas, quando perguntamos se ela foi humilhada, ameaçada ou teve seus pertences retidos, por exemplo, elas falam que sim. Então há um desafio na nomeação do ocorrido", diz Grelin.
Apesar da incidência de violência doméstica ocorrer em frequência parecida em todo o território nacional, a pesquisa também identificou que estados da região Norte do Brasil atingem patamares ainda maiores do que os índices nacionais, especialmente Amazonas (57%), Amapá (56%), Rondônia (55%) e Acre (54%). A região Sudeste também chama atenção com Rio de Janeiro e Minas Gerais, ambos com 53%.
O levantamento ainda mostra que aproximadamente 7 em cada 10 brasileiras conhecem alguém que sofreu violência doméstica. Esse índice é ainda maior nos estados das regiões Norte e Nordeste: cerca de 68% das brasileiras que afirmam terem uma amiga, familiar ou conhecida que já vivenciou agressões ou abusos em razão de gênero, com destaque para as tocantinenses (75%), acreanas (74%), amazonenses (74%), pernambucanas (72%) e alagoanas (72%).
Outro dado destacado pela pesquisa é a estimativa de mulheres que passam por violência doméstica ao longo da vida. De 40 milhões mulheres brasileiras, mais de 8 milhões paulistas e mais de 4 milhões mineiras já vivenciaram algum tipo de situação violenta.
“A pesquisa com dados estaduais é um marco importante. Entrevistar mais de 21 mil mulheres e gerar resultados 100% probabilísticos, em estados com realidades tão diversas, foi um grande desafio superado com excelência pela equipe do DataSenado. Na análise dos resultados já ficou claro que ainda temos muito para avançar, que para chegarmos em respostas mais locais, precisamos de uma amostra ainda maior”, diz destaca Maria Teresa Prado, coordenadora do Observatório da Mulher contra a Violência do Senado Federal.
Somente 20% das mulheres brasileiras se consideram bem-informadas sobre a Lei Federal Maria da Penha. Embora os índices não superem 35% por estado, as localidades em que há maior conhecimento sobre a Lei Maria da Penha entre a população feminina são Distrito Federal (33%), Paraná (29%) e o Rio Grande do Sul (29%). Já as mulheres do Norte e Nordeste são as que afirmam conhecer menos a Lei Maria da Penha, principalmente no Amazonas (74%), Pará (74%), Maranhão (72%), Piauí (72%), Roraima (71%) e Ceará (71%).
"Esses dados revelam uma lacuna alarmante na comunicação entre o poder público e mulheres de todos os estados brasileiros, demonstrando a ineficiência da transmissão de informações sobre os mecanismos de apoio e proteção previstos na legislação do país. Isso impacta diretamente na autonomia dessas mulheres, pois o conhecimento sobre o tema é fundamental para que possam reivindicar seus direitos e romper ciclos de agressões e abusos”, diz Grelin.
Em relação ao grau de conhecimento sobre os serviços que integram a rede de proteção à mulher, nota-se um equilíbrio entre as unidades federativas brasileiras. A delegacia da mulher é o serviço mais conhecido entre elas (95%), enquanto a Casa da Mulher Brasileira, por sua vez, é conhecida por somente 38% das entrevistadas.
A pesquisa levantou, também, o número de mulheres que declaram ter solicitado medidas protetivas para a sua segurança. O índice nacional é de 27% e se mantém nessa faixa em quase todo o território, com exceção do Rio Grande do Sul – um dos estados com maior conhecimento sobre a Lei Maria da Penha – onde 41% das mulheres que sofreram violência com base no gênero solicitaram medidas protetivas.