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Mercado de carbono: desafios e oportunidades para povos indígenas e comunidades tradicionais

"O enfrentamento das mudanças climáticas requer um conjunto amplo de estratégias, que inclui a redução das emissões industriais, a transição para energias renováveis, a promoção de uma economia circular e o fortalecimento de políticas de adaptação", afirma João Paulo Schwandner, da Systemica

"Embora o REDD+ seja considerado um mecanismo relevante, ele não deve ser entendido como uma solução isolada", afirma Schwandner (Carl de Souza/Getty Images)

"Embora o REDD+ seja considerado um mecanismo relevante, ele não deve ser entendido como uma solução isolada", afirma Schwandner (Carl de Souza/Getty Images)

Systemica
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Colunista

Publicado em 14 de abril de 2025 às 12h03.

Última atualização em 14 de abril de 2025 às 15h05.

Por João Paulo Schwandner Ferreira*

A crise climática global tem gerado impactos cada vez mais intensos, exigindo ações coordenadas e soluções inovadoras para sua mitigação. Entre as estratégias adotadas, estão os projetos de REDD+ (Redução de Emissões provenientes de Desmatamento e Degradação Florestal), que vêm sendo considerados uma ferramenta de financiamento climático eficiente. Além da contribuição direta no controle do desmatamento, eles podem representar uma oportunidade de captação de recursos para iniciativas em territórios de comunidades tradicionais e povos indígenas.

Embora o REDD+ seja considerado um mecanismo relevante, ele não deve ser entendido como uma solução isolada. O enfrentamento das mudanças climáticas requer um conjunto amplo de estratégias, que inclui a redução das emissões industriais, a transição para energias renováveis, a promoção de uma economia circular e o fortalecimento de políticas de adaptação.

O papel específico do REDD+ dentro desse cenário está no financiamento da conservação das florestas e na criação de alternativas econômicas alinhadas à manutenção dos ecossistemas. Sua implementação, no entanto, exige um compromisso com a transparência, a correta repartição de benefícios e o respeito à diversidade de modelos de gestão ambiental existentes, além de considerar as particularidades de cada território e respeitar processos de consulta, participação e governança locais.

As evidências demonstram que a biodiversidade global está mais bem preservada em territórios ocupados por povos indígenas e comunidades tradicionais. Segundo dados da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES), a natureza tende a sofrer menor degradação em terras sob gestão dessas populações do que em outras regiões.

Biodiversidade global

Além disso, o Quadro Global de Biodiversidade de Kunming-Montreal, adotado na Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), reconhece o papel fundamental dessas populações na conservação da biodiversidade e enfatiza a necessidade de respeitar seus direitos e conhecimentos tradicionais. O documento destaca que qualquer iniciativa voltada à sustentabilidade deve garantir o Consentimento Livre, Prévio e Informado (CLPI) para projetos que impactem seus territórios.

No Brasil, a recente Lei nº 15.042/2024, que institui o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE), reforça a importância das comunidades tradicionais e povos indígenas na gestão dos créditos de carbono. Seu artigo 43 reforça que a titularidade originária dos créditos de carbono cabe ao gerador do projeto, incluindo essas populações que possuem concessão, propriedade ou usufruto legítimo de terras utilizadas como base para tais projetos.

A lei aprovada assegura que essas pessoas sejam reconhecidas como protagonistas, com o direito de comercializar Certificados de Redução ou Remoção Verificada de Emissões (CRVEs) e créditos de carbono gerados em seus territórios. Para tanto, é necessário o consentimento resultante do processo de CLPI, e a inclusão de cláusulas contratuais que garantam a repartição justa e equitativa dos benefícios monetários. Essas medidas fortalecem a autonomia das comunidades na gestão de seus recursos naturais e asseguram que os benefícios econômicos advindos dos projetos de carbono sejam distribuídos de maneira adequada e participativa.

Os projetos de REDD+ apresentam desafios que precisam ser cuidadosamente analisados. Um dos principais riscos está na distribuição dos benefícios financeiros, que podem não alcançar diretamente as populações responsáveis pela conservação das florestas, desrespeitando seus direitos. Além disso, o desenho inadequado dos projetos pode levar à exclusão de grupos que tradicionalmente cuidam dessas áreas.

Para minimizar esses riscos, organismos internacionais recomendam que os projetos de REDD+ sejam acompanhados de mecanismos de governança robustos e transparentes, incluindo auditorias sociais e certificações como a Climate, Community & Biodiversity (CCB).

A 16ª COP sobre Diversidade Biológica (COP 16), realizada em Cali, na Colômbia, em 2024, trouxe avanços significativos na agenda global da biodiversidade. Um dos principais resultados foi o lançamento do "Fundo Cali", mecanismo global destinado à repartição de benefícios oriundos do uso de informações de sequências digitais sobre recursos genéticos (DSI). Esse fundo estabelece que parte das receitas das empresas que utilizam DSI para fins comerciais devem beneficiar as pessoas responsáveis pela conservação da biodiversidade.

Além disso, a COP16 fortaleceu o papel dos povos indígenas e comunidades tradicionais com um novo Programa de Trabalho que busca ampliar sua participação e reconhecer seus conhecimentos e práticas.

Para que projetos como os de REDD+ tenham impactos positivos duradouros, é essencial que sejam conduzidos de maneira ética, garantindo processos de tomada de decisão justos e informados, e que os benefícios gerados sejam acessíveis a quem protege e cuida das florestas. Somente assim poderemos colocar o mercado de carbono em seu devido lugar e avançar corretamente na luta contra as mudanças climáticas.

*João Paulo Schwandner Ferreira é coordenador de inteligência em comunidades na Systemica.

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