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Kim Carstensen, do FSC: "Precisamos de uma visão comum para o futuro das florestas”

Em entrevista exclusiva, o diretor-geral do FSC destaca como a organização, que completa 30 anos, ajudou a redefinir o manejo florestal e como novas demandas exigem uma abordagem mais ampla

Kim Carstensen: desafio para o futuro é garantir que as florestas, manejadas de forma responsável, possam fornecer os materiais necessários para a transição para uma economia circular (FSC/Divulgação)

Kim Carstensen: desafio para o futuro é garantir que as florestas, manejadas de forma responsável, possam fornecer os materiais necessários para a transição para uma economia circular (FSC/Divulgação)

Rodrigo Caetano
Rodrigo Caetano

Editor ESG

Publicado em 4 de setembro de 2024 às 07h00.

O Forest Stewardship Council (FSC), organização internacional que define padrões para o manejo responsável das florestas, completa 30 anos este ano. Em entrevista à EXAME, o diretor-geral da entidade, Kim Carstensen, refletiu sobre o impacto do FSC no setor florestal ao longo dessas três décadas. “Ajudamos a criar um entendimento sobre padrões de manejo sustentável que vão além de questões legais e compliance”, disse Carstensen. “Incorporamos elementos como direitos dos trabalhadores, dos povos indígenas e de proteção à biodiversidade.”

Para um jovem ativista ambiental, essa visão pode parecer singela. Fazer mais do que a lei obriga, afinal, é o mínimo que se espera de uma empresa que se diz sustentável, ou que alegue seguir os preceitos ambientais, sociais e de governança reunidos sob o acrônimo ESG. Esse jovem, no entanto, deve lembrar que a entidade surgiu em 1994, na esteira da Rio 92, quando as expressões “derrubar floresta” e “progresso econômico” eram literalmente sinônimos.

O trabalho do FSC estabeleceu uma base confiável de certificação de empresas madeireiras, tanto no setor B2B (vendas entre empresas), quanto no B2C (para o consumidor final). Ter o selo FSC se tornou uma condição para entrar em qualquer varejo, e o tempo se encarregou de excluir os maus elementos. A indústria precisou transformar seu modelo, desenvolver tecnologias, e estar à frente da certificação se tornou uma vantagem competitiva.

Esse processo ajudou a mudar o perfil do desmatamento. Na década de 90, operações de extração de madeira para produção de papel e móveis eram grandes vilãs das florestas. Hoje, quase a totalidade do desmatamento é impulsionada pela conversão de terras para a agricultura e pela expansão de habitações humanas, muito mais do que pela indústria madeireira. Atualmente, grandes empresas como as brasileiras Suzano e Klabin, fabricantes de celulose, são tidas como referência em sustentabilidade, com operações florestais de larga escala certificadas.

O Papel do FSC na Transformação de Outros Setores Agrícolas

Ao ser questionado sobre a possibilidade de replicar o sucesso do FSC em outros setores, como a pecuária e a agricultura, Carstensen aponta que, embora existam iniciativas de certificação em outros setores, como o óleo de palma e a soja, estas ainda não alcançaram o mesmo nível de penetração e impacto que o FSC conseguiu no setor florestal.

Ele observa que o cenário regulatório global está evoluindo, com a União Europeia, por exemplo, expandindo a regulamentação de desmatamento para incluir commodities como óleo de palma e soja. Para Carstensen, o sucesso a longo prazo dessas iniciativas dependerá da capacidade de unir esforços entre governos, ONGs, comunidades locais e o setor privado, como foi feito no FSC.

O diretor-geral também expressa cautela em relação aos mercados de carbono não regulamentados, que, segundo ele, correm o risco de serem dominados por interesses individuais. Ele enfatiza a importância de que os benefícios do mercado de carbono sejam direcionados para os verdadeiros atores no terreno, como os povos indígenas que vivem e protegem as florestas.

O Papel Central das Populações Indígenas no Manejo Sustentável

Outro ponto crucial abordado por Carstensen é a relação do FSC com os povos indígenas. Ele explica que o respeito aos direitos dos povos indígenas está inserido nos padrões do FSC, sendo uma condição prévia para as operações florestais certificadas. Ele reconhece os desafios dessa interação, especialmente em relação ao conceito de consentimento livre, prévio e informado.

O FSC possui um Comitê Permanente de Povos Indígenas, composto por representantes de diversas regiões do mundo, que aconselha a diretoria da organização sobre questões relevantes. Além disso, o FSC criou a Fundação Indígena FSC no Panamá, uma entidade governada e liderada por indígenas, com o objetivo de apoiar as comunidades indígenas na promoção de seu desenvolvimento autônomo.

Carstensen aponta que, apesar dos avanços, ainda há muito a ser feito para garantir que os recursos globais cheguem efetivamente aos povos indígenas. Ele destaca que há uma desconfiança mútua entre doadores, governos e povos indígenas, o que dificulta a implementação de projetos eficazes.

Inovação e Desafios Futuros para o FSC

As mudanças tecnológicas e a transformação econômica, no entanto, estão impactando o setor florestal. Suzano, Klabin e outras empresas estão diversificando suas operações, passando a produzir novos materiais e entrando em novos mercados, o que representa um desafio para o FSC manter seus padrões atualizados.

Para Carstensen, o grande desafio para o futuro é garantir que as florestas, manejadas de forma responsável, possam fornecer os materiais necessários para a transição para uma economia circular e renovável, sem comprometer a conservação da biodiversidade ou os direitos das comunidades locais. Para isso, é necessário um esforço conjunto e coordenado entre todos os atores envolvidos no manejo florestal global.

O FSC, segundo ele, continuará a evoluir, ampliando seu foco para englobar não apenas o setor florestal, mas também as questões mais amplas que afetam as florestas em todo o mundo. Para Carstensen, a COP 30, que será realizada no Brasil, representa uma oportunidade crucial para avançar nessa agenda global.

Acompanhe tudo sobre:FlorestasCOP30suzanoKlabin

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