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Narely de Paula, gerente de Riscos de Petróleo da Austral Seguradora: "A indústria do petróleo é vista como vilã e eu poderia ter me colocado fora da discussão. Mas decidi apostar no contrário. Eu me debrucei a entender como fazer parte da solução da transição energética". (Leandro Fonseca/Exame)
Repórter de ESG
Publicado em 12 de março de 2025 às 15h21.
Última atualização em 12 de março de 2025 às 17h45.
Mulher negra de muita fé, neta de duas Marias, uma rezadeira e outra poetista, e de dois Josés, que compartilhavam além do nome, o mesmo sonho: deixar a cidade natal em Minas Gerais para tentar um trabalho na Companhia Siderúrgica Nacional, no Rio de Janeiro.
É assim que Narely Nicolau de Paula, que apesar da família mineira nasceu em terras cariocas, descreve a si mesma e introduz a trajetória que levou para a formação de engenharia.
"Minha história começa nas minhas raízes. Meus avôs sairam do interior de Minas pelo sonho de fazer parte da indústria do aço. Ao mesmo tempo, minhas referências também são religiosas, de educadoras e mulheres fortes", contou em entrevista à EXAME, para a série especial de trajetórias femininas, lançada neste mês da mulher.
Na hora de cursar a faculdade, decidiu seguir os mesmos passos dos avôs e escolheu engenharia na PUC Rio. Na época, em 2006, estava em alta a descoberta histórica do pré-sal no Brasil, o que a levou a se especializar em petróleo.
"Logo quando entrei na área, foi difícil me ver fazendo parte de um lugar que era extremamente masculino. Na universidade, eu era uma das pouquíssimas mulheres na turma, no setor de óleo e gás também. Era uma questão de não ter em quem se espelhar", disse.
Hoje, aos 33 anos, Narely, como muitas mulheres, sobretudo negras, entende ter chegado a lugares que não imaginava: ao longo da carreira, estudou em universidades internacionais renomadas como Harvard e a Universidade do Kansas, e foi pesquisadora da Petrobras.
Há 10 anos, atua como Gerente de Riscos de Petróleo na Austral Seguradora, onde foi convidada a iniciar este nicho do zero na companhia, e que há seis anos consecutivos é líder de mercado na América Latina.
"Hoje meu papel é aceitar riscos em que eu realmente acredito. A história da Austral é também a minha, pois estou desde o inicio da abertura da carteira Lido com apólices gigantescas, o valor em risco é da ordem de bilhões", destacou.
Fundada em 2010, a Austral nasceu com seguro-garantia e em 2013, decidiu expandir para a área de petróleo e gás. Atualmente, existem diversas coberturas para a atividade em si e toda construção de unidades para produção e extração. Com uma carteira sólida de clientes, incluindo a Petrobras, a executiva gerencia toda uma operação que movimenta mais de R$ 1 bilhão.
Segundo Narely, seu propósito na companhia vai além de viabilizar as operações, para garantir que elas sejam sustentáveis e alinhadas com o equilíbrio planetário. "A indústria do petróleo é vista como vilã e eu poderia ter me colocado fora da discussão. Mas decidi apostar no contrário. Eu me debrucei a entender como fazer parte da solução da transição energética e isto exige que novos riscos sejam tomados", afirmou.
Em diversos momentos da conversa, ela volta às suas origens e religião para reforçar a crença de que o mundo tão acelerado precisa dar uma freada no que vem fazendo para entender de que forma tudo se equilibra com a natureza.
Embora a indústria do petróleo seja extrativista, Narely lembra que há muitos estudos em cursos sobre como ela é capaz de absorver carbono e atuar como um grande 'sumidouro' de gases de efeito estufa. É o caso de manguezais, sistemas naturais com este gigante potencial.
"Se tornou meu propósito ter um papel decisivo na direção dessa indústria. E foi a melhor escolha que fiz, pois amo trabalhar com riscos", destacou.
Como referência dentro do mercado de petróleo e gás, a engenheira sempre soube que carregaria a profunda missão de ser como um 'espelho' para outras mulheres, principalmente negras. "Sempre tive uma necessidade de trazer, por mais que fosse difícil, a discussão de que não tinham outras pretas no setor. É desafiador no começo, mas aos poucos vamos fincando nossas bandeiras, para que outras se guiem no caminho", disse.
Em 2024, participou da Cúpula do G20, no Rio de Janeiro, e se orgulha de ter levantado a pauta diante de potências globais. "Acredito que a transição energética não pode deixar ninguém para trás. Se não há nenhuma mulher preta na mesa, já está errado", disse.
Um dos seus conselhos é criar redes e se inspirar em outras mulheres. Atualmente, Narely também é conselheira de uma associação pioneira chamada "Sou Segura", que fornece mentorias e apoio para o público feminino ser cada vez mais incluído e qualificado neste mercado.
Para aquelas que se sentem perdidas, a executiva também sugere confiar no propósito e acreditar que, segundo ela, existe uma sétima direção.
"Quando nos sentimos muito fora do contexto, é sobre procurar respostas dentro de nós mesmas. Buscar o nosso propósito e sempre recalcular a rota, nunca esquecendo de quem nós somos. Mesmo em lugares que não tenha ninguém com você, é possível fazer com que aquele lugar passe a te enxergar", finalizou.