(Bloomberg/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 17 de outubro de 2021 às 10h51.
Última atualização em 8 de fevereiro de 2022 às 16h06.
Paulo Puterman*
Qual seria o custo de implantação de uma estrutura de geração de energia solar gratuita para toda a mobilidade elétrica no Brasil?
Segundo a Empresa de Pesquisa Energética, 1,5 bilhão de MWhs por ano dariam conta desta tarefa.
Para termos essa quantidade de energia gerada, precisaríamos instalar 500.000 MWP em energia solar a um custo de 2 trilhões de reais.
Se dividirmos esse número por 5 anos (tempo em que o sistema se paga) teríamos um custo de 400 bilhões de reais por ano, suficiente para que toda geração de energia destinada à mobilidade no Brasil seja gratuita, pelos 20 anos seguintes.
E como fica a energia que não é destinada à mobilidade?
Segundo a EPE, a quantidade de energia destinada a aplicações estacionárias no Brasil também é de 1,5 bilhão de MWhs por ano.
Diferente da energia destinada à mobilidade, que armazena a eletricidade nas baterias embarcadas nos automóveis, a energia elétrica para aplicações estacionárias não dispõe de armazenagem imediata. A implantação de um conjunto de baterias em residências e edifícios (equivalente ao uso móvel) é inviável, em função dos custos envolvidos (40 trilhões de reais).
O Brasil tem sorte, pois a energia hidrelétrica tem potencial para ser a “bateria” do sistema estacionário. Para que esta “bateria” suporte a implantação da energia solar na base, ela deve ser otimizada através da redução das perdas do sistema, incremento da eficiência energética e repotenciação das usinas.
Este trabalho agregará 20% na energia armazenada nos reservatórios, aumentando a capacidade da nossa “bateria”.
Segundo a Aneel, de cada 100 MWhs gerados, apenas 83 MWhs são consumidos/faturados contra o sistema. Os outros 17 MWhs se caracterizam como perdas.
O Brasil se encaixa no grupo de países com taxas de perda de transmissão e distribuição acima de 15 por cento.
Partindo da premissa que idealmente poderíamos atingir um índice de perdas semelhante ao americano (5%), qual seria o custo deste trabalho? Se o consumo de eletricidade estacionário é de 1,5 bilhão de MWhs/ano e verificamos um potencial de 10% de diminuição das perdas, teríamos 150 milhões de MWhs/ano adicionais para consumo e ou armazenagem. A um preço de R$ 200/MWh (tarifa média da parcela de energia) isto representaria R$ 30/ bilhões/ano para investimentos.
Em 5 anos seriam R$ 150 bilhões passíveis de serem alocados e amortizados para esta tarefa.
Além da redução de perdas, o aumento da eficiência energética representa uma maneira barata e fácil de se ter mais energia, sem a construção de usinas adicionais. A ideia é usar menos energia para fazer a mesma quantidade de trabalho.
No ranking da ACEEE, de um máximo possível de 100 pontos, Alemanha e Itália marcam 75,5 pontos enquanto o Brasil alcança 35 pontos. Um esforço coletivo que resulte numa eficiência equivalente à dos Estados Unidos (55 pontos), representaria uma economia adicional de energia equivalente a 10%.
Complementa este trabalho de otimização, a repotenciação das 200 usinas hidrelétricas que apresentam uma idade média superior a 50 anos, o que permitiria uma economia de 20% (de 1,5 bilhão para 1,2 bilhão de MWhs/ano consumidos) com consequente aumento de energia armazenada em nossa “bateria”.
Deste total, cerca de 40% (480 milhões de MWhs/ano) são consumidos durante o dia e podem ser utilizados sincronicamente durante a produção de energia solar a um custo de implantação de 660 bilhões de reais.
Hoje, o consumidor brasileiro já paga perto de 100 bilhões de reais/ano por essa energia. Logo, em 6 anos e meio poderíamos ter o investimento amortizado.
Como ficariam os outros 60%, capazes de abastecer o país quando o sol não está presente?
Levando-se em consideração o trabalho de otimização do sistema, 60% da energia consumida no país corresponde a 720 milhões de MWhs/ano. A energia média acumulada em nossos reservatórios hidrelétricos é de cerca de 524 milhões de MWhs/ano. A otimização proposta traria uma disponibilidade de armazenagem de energia mais do que suficiente para cobrir os 200 milhões de MWhs/ano necessários ao funcionamento seguro do sistema.
Qual o impacto disto na conta da energia para o consumidor final?
Um cálculo simplificado da tarifa média de energia atribui à geração uma fração de 30% dos custos da conta de energia.
O custo desta tarifa média varia, mas está em torno de R$ 500/MWh.
Tendo como ponto de partida este valor, a parcela de geração, 30%, será de R$ 150/MWh. Incluindo os tributos este custo chega a R$ 216/MWh.
Grosso modo, poderíamos dizer então que caso a adoção radical da Energia Solar como base para a matriz elétrica brasileira acompanhada da otimização do sistema acontecesse, teríamos uma redução de R$ 200 na tarifa média no Brasil, levando seu custo final para algo em torno de R$ 300/MWh. Este valor já inclui o custo de recomposição do capital o que seria suficiente para a manutenção do sistema.
Além da maior disponibilidade de capital, o trabalho de implantação de energia solar na base e de otimização do sistema de armazenagem existente terá reflexos na intensidade energética do Brasil. A intensidade energética é medida pela quantidade de energia necessária por unidade de produção ou atividade econômica.
Adotando como exemplo aquilo que aconteceu nos Estados Unidos nas últimas décadas, verifica-se que existe uma relação positiva entre diminuição na intensidade energética de todos os segmentos somados e o crescimento da economia.
Assim, podemos inferir que uma diminuição significativa no custo da conta de luz somado à diminuição da intensidade energética do Brasil, representará um uso mais eficiente de capital disponível para a sociedade, com impacto significativo no crescimento econômico potencial do país.
Minha intenção é ilustrar o possível impacto da otimização do sistema combinado à diminuição da tarifa média de energia elétrica para a sociedade.
Esta ilustração aponta indícios suficientes para se concluir que este impacto beneficiará indivíduos, residências, indústrias, comércio e atividade econômica como um todo.
Mãos à obra?
*Paulo Puterman é PhD em Biotecnologia