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Modelo: a economia circular deve ir além da reciclagem, com foco nas agendas de design circular e de regeneração produtiva da natureza (Getty Images/Reprodução)
Jornalista
Publicado em 27 de junho de 2024 às 15h23.
Última atualização em 27 de junho de 2024 às 15h49.
O Brasil passa a contar a partir desta quinta-feira, 27, com Estratégia Nacional de Economia Circular (Enec). O decreto foi assinado pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante a reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável, o Conselhão.
A coordenação ficou nas mãos do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic). O decreto mira a promoção da transição do chamado modelo de produção linear — que vai da extração, passa pela produção e termina no descarte — para uma economia circular. Na prática, implica o incentivo ao uso eficiente de recursos naturais e práticas sustentáveis ao longo da cadeia produtiva.
A economia circular é um conceito que busca transformar a atual abordagem econômica ao priorizar a reutilização, reciclagem e redução do desperdício de recursos. Com isso, há a redução das emissões de GEE, além da geração de rejeitos e resíduos por meio da manutenção do valor do material, regeneração do meio ambiente, redução da dependência do uso de recursos naturais. O trabalho mira o estímulo à produção e ao consumo sustentáveis, com o aumento do ciclo de vida dos produtos e do material e a garantia de uma transição justa e inclusiva.
Ao contrário do modelo econômico linear tradicional, que envolve uma sequência de "extrair, produzir, usar e descartar", o conceito de economia circular propõe um ciclo fechado, em que os produtos, material e recursos são mantidos em uso pelo maior tempo possível e, quando não são mais necessários, são recuperados e reintegrados à economia de maneira sustentável.
A Enec integra a Nova Indústria Brasil (NIB), política industrial lançada pelo governo no início deste ano. “Damos hoje mais um passo largo em direção à neoindustrialização, reforçando o papel do governo no fomento a uma indústria sob novos pilares, gerando inovação, novos negócios alinhados ao crescimento sustentável e responsável, criando empregos e reduzindo significativamente o impacto ambiental das atividades produtivas e de consumo”, afirma o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin.
A nova estratégia, segundo o Mdic, além de criar um ambiente normativo e institucional para a economia circular, promete o incentivo à inovação, à cultura, à educação e à geração de competências para reduzir, reutilizar e promover o redesenho circular da produção; incentivar a redução da utilização de recursos e a geração de resíduos, preservando o valor do material; proposição de instrumentos financeiros e financiamentos para a economia circular, promoção da articulação entre todos os entes da federação e o envolvimento dos trabalhadores e trabalhadoras da economia circular.
Essas ações serão realizadas seguindo como diretrizes a eliminação de rejeitos e resíduos; a manutenção do valor dos produtos; regeneração dos sistemas naturais; redução da dependência dos recursos naturais; fomento à produção sustentável e aumento do ciclo de vida de todo e qualquer material.
A estratégia por trás da assinatura do decreto, segundo Luisa Santiago, diretora-executiva da Fundação Ellen MacArthur na América Latina, traz uma visão completa do potencial da economia circular, muito além da reciclagem, com foco nas importantes agendas de design circular e de regeneração produtiva da natureza, aspectos cruciais para destravar o crescimento econômico mais acelerado dos setores e modelos de negócios alinhados a uma economia circular.
"Outro ponto importante da estratégia é a ênfase em uma transição justa, que reconheça a relevância e necessidade de políticas que garantam que os muitos trabalhadores da economia circular sejam efetivamente incluídos nos mercados da remanufatura, reúso, manutenção e reciclagem, bem como dos trabalhadores do campo e dos ecossistemas naturais que operam cadeias relevantes para a saúde dos sistemas naturais", analisa a diretor da fundação.
No entanto, a representante da Fundação Ellen MacArthur lembra que, a partir de agora, será fundamental que o governo crie planos de longo prazo específicos aos setores da economia, "com metas claras, para que a transição para uma economia circular ocorra de forma efetiva e justa. A economia circular, viabilizada pela revolução tecnológica, permite crescer a produtividade dos recursos em 3% anualmente, o que se traduz em aumentos no PIB, com impactos positivos adicionais na geração de empregos".
O modelo de economia circular passa pelo desenvolvimento de produtos mais resilientes e com características que permitam o seu compartilhamento. O conceito faz parte dos eixos formadores do Plano de Transformação Ecológica, coordenado pelo Ministério da Fazenda (MF), e no Plano Clima, liderado pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA).
O decreto institui ainda o Fórum Nacional de Economia Circular, órgão de governança que ficará responsável pela elaboração do Plano Nacional de Economia Circular, que conterá metas, padrões e indicadores para a implementação da economia circular no Brasil.
O Fórum será presidido pelo Mdic, por meio da Secretaria de Economia Verde (SEV), e contará com o MMA na Secretaria Executiva. Também participarão os ministérios da Fazenda, Ciência, Tecnologia e Inovação, Educação, Desenvolvimento Agrário e Agricultura e Familiar, Agricultura e Pecuária, Trabalho e Emprego, Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Minas e Energia e Empreendedorismo, da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, além de representantes da Casa Civil e da Secretaria-Geral da Presidência da República, além da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
O relatório mais recente daCoalizão Empresarial para a América Latina e Caribe, da qual a Fundação Ellen MacArthur faz parte, mostra que na América Latina e no Caribe, por exemplo, são geradas 541 mil toneladas de lixo por dia. A projeção é que esse número aumente em 25% até 2050, com base no atual modelo econômico. A região contribui com cerca de 10% das emissões globais de Gases de Efeito Estufa (GEE) e tem registrado um declínio de 94% em sua biodiversidade, um número muito maior do que em qualquer outra região observada no mundo desde 1975.
Ainda segundo a fundação, embora grande parte dos esforços da luta climática ainda esteja em torno da transição energética, ela só fará frente a 55% das emissões. Os outros 45%, essenciais para o cumprimento do Acordo de Paris, somente serão resolvidos com a transição para uma economia circular.