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O laboratório da QuantumScape, uma startup do Vale do Silício cujos investidores incluem Volkswagen e Bill Gates: a empresa está trabalhando em uma tecnologia que pode tornar as baterias de automóveis mais baratas, mais confiáveis e mais rápidas para recarregar. (Gabriela Hasbun/The New York Times)
Conforme montadoras como a General Motors, a Volkswagen e a Ford Motor Co. vão fazendo promessas ousadas sobre a transição para um futuro elétrico e livre de emissões, uma coisa vai ficando muito clara: elas vão precisar de muitas baterias.
A demanda por esse componente indispensável já supera a oferta, levando a uma corrida do ouro global que conta com investidores, empresas estabelecidas e startups que se dedicam a desenvolver a tecnologia e a construir as fábricas necessárias para produzir milhões de carros elétricos.
Considerada por muito tempo um dos componentes automotivos menos interessantes, a bateria pode agora ser uma das peças mais eletrizantes da indústria automobilística. A fabricação de automóveis basicamente não mudou em 50 anos e é pouco rentável, mas a indústria de baterias está pronta para a inovação. A tecnologia vem evoluindo em um ritmo que lembra os primeiros dias dos computadores pessoais, dos telefones celulares ou mesmo dos automóveis, e o investimento de capital tem o potencial de revelar o próximo Steve Jobs ou Henry Ford.
A Wood Mackenzie, empresa de pesquisa e consultoria em energia, estima que os veículos elétricos vão compor cerca de 18 por cento das vendas de carros novos até 2030. Isso aumentaria a demanda por baterias em cerca de oito vezes mais do que as fábricas conseguem produzir atualmente. E essa é uma estimativa conservadora. Alguns analistas esperam que as vendas de veículos elétricos cresçam muito mais rapidamente.
As montadoras estão empenhadas em uma corrida intensa para adquirir a receita química que vai garantir mais energia pelo menor preço e no menor pacote. O anúncio da GM de que até 2035 toda a sua produção será elétrica foi considerado um momento marcante pelos formuladores de políticas e ambientalistas. Mas, para muitas pessoas na indústria de baterias, a empresa afirmou o óbvio.
"Esse foi o último de vários anúncios que sinalizaram claramente que os veículos elétricos estão aqui", disse Venkat Viswanathan, professor associado da Universidade Carnegie Mellon que pesquisa tecnologia de baterias.
A fabricação de baterias é dominada por empresas como a Tesla, a Panasonic, a LG Chem, a BYD China e a SK Innovation – quase todas sediadas na China, no Japão ou na Coreia do Sul. Mas também há muitos novos participantes entrando no jogo. E os investidores, percebendo os grandes lucros, estão distribuindo dinheiro para startups que eles acreditam estar perto de alcançar progressos.
"Acho que estamos na fase inicial. Há mais dinheiro do que ideias", afirmou Andy Palmer, ex-executivo-chefe da Aston Martin e agora vice-presidente da InoBat Auto, startup de baterias.
A QuantumScape, startup do Vale do Silício cujos investidores incluem a Volkswagen e Bill Gates, está trabalhando em uma tecnologia que poderia tornar as baterias mais baratas, confiáveis e com recarga mais rápida. Mas, sem vendas substanciais, poderia fracassar na produção de baterias. No entanto, os investidores do mercado de ações a consideram mais valiosa que a montadora francesa Renault.
A China e a União Europeia estão injetando fundos estatais na tecnologia de baterias. A primeira as vê como cruciais para sua ambição de dominar a indústria de veículos elétricos. Para isso, o governo chinês ajudou a Contemporary Amperex Technology, que é parcialmente estatal, a se tornar, aparentemente da noite para o dia, uma das maiores fornecedoras de baterias do mundo.
A União Europeia está subsidiando a produção para evitar se tornar dependente de fornecedores asiáticos e preservar os empregos da indústria automobilística. No mês passado, a Comissão Europeia, braço administrativo do bloco, anunciou um fundo de 2,9 bilhões de euros (3,5 bilhões de dólares) para apoiar a fabricação e a pesquisa de baterias.
Várias fábricas estão em fase de planejamento ou construção nos Estados Unidos, incluindo uma que a GM está construindo em Ohio com a LG, mas analistas disseram que os incentivos federais para a produção de carros elétricos e baterias seriam cruciais para criar uma indústria próspera nos Estados Unidos, da mesma maneira que os avanços tecnológicos de pesquisas financiadas pelo governo e empresas nacionais como a QuantumScape e a Tesla, que no fim do ano passado esboçaram seus planos para reduzir o custo e melhorar o desempenho das baterias.
"Não há segredo de que a China promove fortemente a fabricação e o desenvolvimento", observou Margaret Mann, gerente de grupo no Centro de Ciências Integradas da Mobilidade do Laboratório Nacional de Energia Renovável, unidade do Departamento de Energia dos EUA. Ela não se considera pessimista em relação à capacidade dos Estados Unidos de ganhar terreno na produção de baterias, mas acha que muito ainda precisa ser feito.
Empresários que trabalham nessa área disseram que estamos no início do desenvolvimento e que as empresas americanas ainda poderiam ultrapassar os produtores asiáticos que dominam a indústria.
"As baterias de hoje não são competitivas. Têm um enorme potencial e são fundamentais para uma economia de energia renovável, mas precisam melhorar", afirmou Jagdeep Singh, executivo-chefe da QuantumScape, com sede em San Jose, na Califórnia.
No geral, todo o dinheiro que é investido nessa tecnologia é uma boa notícia, colocando o capitalismo para trabalhar na resolução de um problema global. Porém a reordenação da indústria automobilística também fará algumas vítimas, como as empresas que constroem peças para carros e caminhões com motor de combustão interna, ou montadoras e investidores que apostam na tecnologia errada.
"As inovações nas baterias não aparecem da noite para o dia. Podem levar muitos anos. Tudo pode acontecer", disse Venkat Srinivasan, diretor do Centro Colaborativo de Ciência do Armazenamento de Energia do Laboratório Nacional Argonne.
A maioria dos especialistas está certa de que a demanda por baterias vai fortalecer a China, que refina a maioria dos metais usados nessa tecnologia e produz mais de 70 por cento de todas as células. E o controle chinês sobre a produção vai cair apenas marginalmente durante a próxima década, apesar dos ambiciosos planos de expandir a produção na Europa e nos Estados Unidos, de acordo com projeções da Roland Berger, consultoria alemã de gestão.
"A produção de baterias tem profundas ramificações geopolíticas. A indústria automobilística europeia não quer depender muito das importações da Ásia em geral e da China em particular", declarou Tom Einar Jensen, executivo-chefe da Freyr, que está construindo uma fábrica de baterias no norte da Noruega para aproveitar a abundante energia hidrelétrica e eólica da região.
A Freyr planeja levantar 850 milhões de dólares como parte de uma proposta de fusão com a Alussa Energy Acquisition Corp., empresa de fachada que vendeu ações antes de ter ativos. O acordo, anunciado em janeiro, incluiria a Freyr na Bolsa de Valores de Nova York. Ela planeja fazer baterias usando tecnologia desenvolvida pela 24M Technologies de Cambridge, em Massachusetts.
A primeira prioridade da indústria é baratear a bateria. Para um veículo elétrico de médio porte, ela custam cerca de 15 mil dólares, ou aproximadamente o dobro do preço necessário para que os carros elétricos alcancem a aceitação em massa, segundo Srinivasan.
A diminuição de preço pode ser alcançada com dezenas de pequenas melhorias – como a produção de baterias perto de fábricas de automóveis para evitar custos de transporte – e redução do desperdício, de acordo com Roland Berger. Cerca de dez por cento dos materiais que entram na fabricação de uma bateria são desperdiçados por causa de métodos de produção ineficientes.
Em longo prazo, o santo graal da indústria é a bateria de estado sólido, que vai substituir a solução de lítio líquido no núcleo por camadas sólidas de um composto de lítio. O resultado seria uma peça mais estável e menos propensa ao superaquecimento, permitindo um carregamento mais rápido; também seria mais leve.
A Toyota Motor Co. e outras empresas investiram pesado na tecnologia, e já conseguiram construir algumas baterias de estado sólido. A parte difícil é produzi-las em massa a um custo razoável. Grande parte da empolgação em torno da QuantumScape decorre da afirmação da empresa de que encontrou um material que resolve um dos principais obstáculos para a produção em massa de baterias de estado sólido: sua tendência a curto-circuito se houver alguma imperfeição.
Mesmo assim, a maioria das pessoas na indústria não espera que a bateria de estado sólido esteja amplamente disponível até por volta de 2030. "A produção em massa é a coisa mais difícil do mundo. Protótipos são fáceis. Ampliar a produção é muito difícil", afirmou Elon Musk, executivo-chefe da Tesla, em uma recente teleconferência com analistas.
Uma coisa é certa: este é um ótimo momento para se formar em eletroquímica. Aqueles que entendem as propriedades do lítio, do níquel, do cobalto e de outros materiais estão para as baterias como os programadores de software estão para os computadores.
Jakub Reiter, por exemplo, é fascinado por química de bateria desde sua adolescência na década de 1990 em Praga, muito antes de a eletroquímica ser uma boa escolha de carreira.
Reiter fazia pesquisa de pós-graduação na Alemanha em 2011 quando foi recrutado para trabalhar na BMW, que queria entender a ciência das baterias. No ano passado, a InoBat o contratou para ajudar a montar uma fábrica na Eslováquia, onde a Volkswagen, a Kia, a Peugeot e a Jaguar Land Rover produzem veículos.
Reiter agora é chefe de ciência da InoBat, cuja tecnologia permite que os clientes desenvolvam rapidamente baterias para diferentes usos, como uma versão de baixo custo para carros de passeio ou uma versão de alto desempenho para modelos esporte. "Vinte anos atrás, ninguém se importava muito com baterias, mas agora há uma competição intensa e a batalha é grande", disse ele.