Barroso participou do I Fórum Esfera Internacional, realizado por João Camargo e Camila Funaro Camargo, da Esfera Brasil (STF/Divulgação)
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Publicado em 13 de outubro de 2023 às 18h27.
Última atualização em 19 de outubro de 2023 às 13h35.
No primeiro dia do I Fórum Esfera Internacional, em Paris, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, afirmou que a Corte tem uma atuação diferenciada no Brasil na comparação com outras no mundo, destacou o protagonismo exercido pelo Supremo e disse que assuntos de diferentes interesses vão parar na mais alta instância da Justiça brasileira.
“O Supremo tem de se comunicar com a sociedade. Os três Poderes devem dar cumprimento à Constituição que, no Brasil, é abrangente: cuida dos sistemas tributário e previdenciário, saúde, educação, meios de comunicação e indígenas. Temos uma ampla judicialização no país porque é fácil chegar no Supremo para questionar leis e políticas públicas. É preciso que o interesse seja muito chinfrim para não chegar ao Supremo Tribunal Federal”, afirmou Barroso.
No evento promovido pela Esfera Brasil, nesta sexta-feira, 13, o presidente do STF defendeu uma agenda que pode unificar o país. Ele disse que o momento é de “pacificação e civilidade” e que a Constituição deve ser a bússola para orientar a busca por denominadores comuns.
“Devemos enfrentar a pobreza e a desigualdade, incentivar a inovação, investir em ciência e tecnologia para não ficarmos para trás, superar o preconceito contra a livre iniciativa e o empreendedorismo e dar prioridade à educação básica. Sem crescimento, não haverá o que distribuir”, ressaltou.
Barroso falou sobre segurança jurídica, desenvolvimento e sustentabilidade e apontou problemas em diferentes áreas: “Temos alta litigiosidade nas relações do trabalho, só sabemos o custo ao final, alta litigiosidade tributária e complexidade do sistema, com um compliance dificultoso. A reforma tributária pode atenuar nesse sentido. Temos também alta litigiosidade na saúde para acesso a medicamentos de alto custo”.
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Ele lembrou que entre os desafios a serem enfrentados estão a falta de saneamento básico para metade dos lares brasileiros e o déficit habitacional que é de 6 milhões de casas, mas ressaltou as oportunidades postas. E não deixou de enfatizar o fato de o Brasil ter paz, democracia e sustentabilidade.
“Assumir a liderança ambiental no mundo: essa é a grande vocação do Brasil. Temos condições para isso, com a matriz energética limpa e renovável e a Amazônia. Conciliar o espaço de preservação ambiental e a bioeconomia. Quem sabe um Vale do Silício ambiental seja um bom caminho?”, questionou.
Fórum Esfera Internacional
Além das autoridades brasileiras e francesas, estão reunidos grandes nomes do empresariado para debater novas oportunidades de negócios e alianças entre Brasil, França e União Europeia.
A CEO da Esfera Brasil, Camila Funaro Camargo, lembrou a parceria histórica entre o Brasil e a França em áreas como saúde, educação, cultura e economia e ressaltou a importância de o acordo entre Mercosul e União Europeia sair do papel.
“O acordo entre os dois blocos vai criar uma das maiores áreas de livre-comércio do mundo. No caso do Brasil, o sucesso do acordo pode gerar um aumento de até US$ 125 bilhões no PIB [produto interno bruto] em 15 anos, segundo estimativa da Secretaria de Comércio Exterior”, disse a executiva.
O embaixador do Brasil na França, Ricardo Neiva Tavares, destacou a oportunidade para buscar convergências sobre os temas da ampla agenda de cooperação entre os dois países.
“A Embaixada quer aprofundar a relação com a França, defender os nossos interesses e promover a cooperação bilateral em todos os campos. É uma histórica e tradicional amizade, estamos em um ciclo muito produtivo, dinâmico e de grandes oportunidades”, disse. E complementou: “Com o PPI [Programa de Parcerias de Investimentos] e o novo PAC [Programa de Aceleração do Crescimento], podemos aumentar a atuação francesa no Brasil”.
Brasil: o melhor negócio do mundo
No primeiro painel, o empresário Wesley Batista, do Grupo J&F, anunciou que o grupo pretende investir R$ 38 bilhões no Brasil até 2026. Segundo ele, o montante representa mais de 85% de todos os planos de investimento do grupo no mundo e contempla a geração de 30 mil empregos diretos no país. “Isso fala por si só em como estamos otimistas com os rumos do Brasil, que é um país que caminha com segurança fiscal e instituições fortes. O Brasil é de novo a bola da vez”, disse.
O protagonismo brasileiro foi exaltado pelo ex-presidente francês Nicolas Sarkozy, que defendeu que o Brasil se torne membro do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). “O Brasil é uma potência demográfica e econômica e também precisa ser uma potência política. Nenhum país da América Latina é membro permanente do Conselho. A América Latina está ausente dos grandes debates e isso é injusto e perigoso”, afirmou.
A melhoria no ambiente de negócios foi o tema da fala do ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Vinícius de Carvalho. Ele contou que o órgão definiu uma agenda para garantir mais transparência tributária e regulatória no Brasil: “Queremos aumentar a competitividade dos negócios e isso passa por simplificação”.
Comércio e varejo
O CEO global do Carrefour, Alexandre Bompard, afirmou que o grupo investirá no digital, com um plano dedicado, € 3 bilhões entre 2022 e 2026. Ele conversou com o empresário Abilio Diniz, do Conselho da Península Participações e membro do conselho de administração do Carrefour.
“Temos uma equipe incrível e cientistas de dados. O conceito digital first (digital primeiro, na tradução) tem de ser divulgado com pedagogia e capacitação na empresa. É uma mudança de cultura”, disse.
O Carrefour é o principal empregador privado no Brasil, com 150 mil funcionários. O executivo revelou que vai inaugurar no primeiro trimestre de 2024 um Atacadão na França. O nome, criado no Brasil, será mantido. Mas a implantação do modelo enfrentou resistências. “Havia preconceito com o Atacadão. É interessante para as classes populares, ainda mais com a perda do poder de compra da população”, afirmou o CEO.
Bompard ainda mandou um recado aos empresários brasileiros: “A França enfrenta dificuldades, mas tem um potencial e um futuro excepcional. As reformas têm de ser colocadas em prática. Acreditem na França”.
Sustentabilidade
O terceiro painel tratou de sustentabilidade e transição energética. O governador do Pará, Helder Barbalho, defendeu a floresta viva e disse que a agenda ambiental posiciona o Brasil como protagonista da diplomacia mundial. Segundo ele, a bioeconomia gera 387 mil empregos na Amazônia: “Isso de uma atividade que ainda não foi explorada. Nossa projeção é que até 2040, se investirmos, teremos condições de exportar produtos de bioeconomia, chegando a US$ 120 bilhões”.
A exploração de petróleo na Foz do Amazonas entrou em pauta e o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse que a aprovação do projeto é uma questão de segurança jurídica.
“A margem equatorial, que teve a infelicidade de ser batizada pela ANP [Agência Nacional do Petróleo] como Foz do Amazonas, mas não tem nada a ver com a foz do rio, faz parte de um bloco leiloado em 2014, que foi pago pelos vencedores. A AGU [Advocacia-Geral da União] já se manifestou dizendo que os leilões foram válidos. O que queremos é que a gente avance, dentro do que o Ibama aprovar, não vamos tergiversar sobre a área ambiental, mas é uma questão de previsibilidade e segurança jurídica”, defendeu.
Para Jeremy Oppenheim, cofundador da Systemiq, o Brasil está na situação perfeita para liderar uma nova economia nos próximos anos. “O Brasil tem uma das energias mais limpas do mundo e dispõe de uma quantidade enorme de recursos. A tarefa consiste em passar da teoria à prática. Uma coisa que o Brasil não quer fazer é ser deixado à beira da estrada: é preciso tomar decisões complexas para isso”.
A ex-secretária de Estado do Meio Ambiente da França Brune Poirson falou sobre as mudanças em curso: “Acelerar a transição energética permitirá ao Brasil estar no âmago das trocas comerciais e ser uma potência para atrair novos investimentos”.
Brasil-França e as perspectivas socioeconômicas
O último painel debateu as oportunidades para o desenvolvimento nacional. O empresário Abilio Diniz cobrou um crescimento econômico maior. “Estamos vivendo um momento glorioso no Brasil. A inflação está caindo, juros também começam a descer. O desemprego está diminuindo e a economia começa a se recuperar. O trabalho que o presidente Lula está fazendo, dos ministros, está tudo certinho. Está tudo bem para crescer 3%. Mas é isso que precisamos?”, questionou.
Segundo Abilio, o Brasil se atrasou na história: “Sempre teve potencial, foi o país do futuro, e está na hora desse futuro chegar, mas está faltando ambição”.
Já a secretária executiva da Casa Civil Miriam Belchior lembrou que o presidente Lula impõe desafios permanentes: “O presidente é tão otimista quanto o Abilio. Mas, às vezes, a memória é curta, porque, em janeiro, a previsão de crescimento era de 0,78%, e já estamos com previsão de crescimento de 3%, dez meses depois. Em janeiro, se alguém dissesse que o Brasil iria crescer 3%, ouviria que não vai – e está acontecendo”.
Ela disse que o governo vem construindo as condições para crescer mais: “Dentro da agenda de desenvolvimento, estão lançadas as bases para a transição ecológica para uma economia de baixo carbono”.
O presidente do Banco Master, Daniel Vorcaro, avaliou que os nove meses de governo Lula trouxeram estabilidade ao mercado. “Estamos em um país que já deu certo, de certa maneira. A inflação está num momento de controle. O Brasil tem uma experiência maior que a dos países europeus no controle de inflação, e a agenda do governo tem dado tranquilidade para o mercado imaginar um cenário futuro melhor”, disse.
Ele, no entanto, pontuou: “Custo de capital é algo que assola bastante o brasileiro e as empresas e tem de ser combatido para além de todos os problemas de complexidade tributária, jurídica e trabalhista. Tem reflexos na inflação e em toda a política implementada pelo Banco Central recentemente”.
O ex-ministro do STF Ricardo Lewandowski falou da importância de equilibrar exportações e importações entre Brasil e França. “Precisamos aperfeiçoar essas trocas para que o Brasil possa exportar itens de maior valor agregado. Por isso, considero do maior interesse a conclusão do acordo Mercosul-União Europeia”.
Para o gerente de Relações Institucionais do banco BTG Pactual e ex-ministro Fábio Faria, todo governo tem erros e acertos, mas o Brasil vem amadurecendo: “O país nada mais é que a nossa casa, e se a gente gasta mais do que ganha, uma hora vai acabar ficando sem ter o que comer. O governo tem pautas de olho no social, o que é muito importante e relevante, mas não pode deixar de olhar sempre para o fiscal”.
No fórum, o secretário-geral do Palácio do Eliseu (sede da Presidência da França), Alexis Kohler, disse que o governo francês “acredita profundamente no potencial do Brasil”. Destacou que, com a eleição de Emmanuel Macron, foi definida uma agenda com três eixos para combater o baixo crescimento: investimento, trabalho e inovação. “Com uma reforma tributária maciça, reduzimos impostos das empresas, eliminamos o imposto de solidariedade sobre fortunas e seguimos reduzindo impostos sobre produção”, afirmou.
O fórum é transmitido pelo YouTube da Esfera Brasil e pelo portal da EXAME, com tradução simultânea