Economia

Vitória de Trump pode prolongar juros altos no Brasil, avaliam economistas

Risco fiscal americano, associado ao corte de impostos prometido por Trump e à possibilidade de guerras tarifárias, pode representar desafios significativos para a economia sob o novo governo republicano

Donald Trump, presidente eleito dos EUA, dança enquanto sobe ao palco durante um comício de campanha na Van Andel Arena em Grand Rapids, Michigan, em 5 de novembro de 2024 (KAMIL KRZACZYNSKI /AFP)

Donald Trump, presidente eleito dos EUA, dança enquanto sobe ao palco durante um comício de campanha na Van Andel Arena em Grand Rapids, Michigan, em 5 de novembro de 2024 (KAMIL KRZACZYNSKI /AFP)

André Martins
André Martins

Repórter de Brasil e Economia

Publicado em 6 de novembro de 2024 às 14h02.

Tudo sobreDonald Trump
Saiba mais

A vitória do ex-presidente Donald Trump na eleição presidencial dos Estados Unidos pode resultar em juros elevados por mais tempo no Brasil, avaliam economistas ouvidos pela EXAME. Trump venceu, com folga, a democrata Kamala Harris ao atingir 277 delegados no Colégio Eleitoral, segundo projeções de diversos veículos de comunicação do país. Ele alcançou essa marca após vencer no estado de Wisconsin.

Segundo Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, o impacto imediato da eleição é a depreciação do câmbio em países emergentes, como o México, com risco de se espalhar para outros mercados, como a China.

O economista afirma que o risco fiscal americano, associado ao corte de impostos prometido por Trump e à possibilidade de guerras tarifárias, pode representar desafios significativos para a economia sob o novo governo republicano.

“É um período inflacionário se Trump seguir esse caminho e dificulta também a nossa desinflação. Vai dar mais trabalho para o Banco Central e devemos ter juros elevados por mais tempo”, diz Vale.

Entre as principais propostas de Trump está o aumento das tarifas de importação praticadas pelos Estados Unidos. As porcentagens passariam de 10% a 20% para todos os parceiros comerciais e até 60% para produtos da China. Existe ainda o plano de sobretaxas superiores a 100% em situações mais específicas.

Durante a campanha, Trump declarou que seu objetivo é melhorar a arrecadação fiscal e utilizar as tarifas como moeda de troca contra países, como a China, que "estão destruindo os EUA".

O candidato republicano explicou que o seu plano terá duas fases: uma redução de impostos para compensar o aumento das tarifas de importação, com impacto zero para os contribuintes americanos.

Trump quer prolongar as reduções fiscais que realizou durante o seu primeiro mandato, de 2017 a 2020, e desta vez estendê-las também à classe média.

Um estudo da Tax Foundation aponta que as medidas podem ter resultados negativos, pois as tarifas de importação podem gerar um aumento anual de 525 bilhões de dólares nos impostos dos americanos e reduzir o PIB em 0,8 ponto percentual, o que poderia eliminar 684 mil postos de trabalho.

Outra estimativa da mesma instituição aponta que relação dívida/PIB de 2065 aumentaria de seu nível projetado de longo prazo de 201,2% para 223,1%. Déficits aumentados e uma carga de dívida maior exigiriam pagamentos de juros mais altos sobre a dívida, o que reduziria as rendas americanas, aponta a Tax Foundation.

Impacto na política monetária do Brasil

O raciocínio dos economistas é que o aumento de preços resultante das tarifas pode gerar inflação, forçando o Federal Reserve, o banco central americano, a interromper o ciclo de queda de juros — e possivelmente até elevar as taxas. Outros países podem responder corrigindo suas taxas para cima, incluindo o Brasil.

Carla Beni, economista e professora da FGV, também alerta que as políticas protecionistas de Trump podem gerar um problema interno de inflação nos Estados Unidos e afetar a exportação de produtos brasileiros para o mercado americano.

“Os produtos estrangeiros vão ficar mais caros nos Estados Unidos, e a população vai decidir se compra mais caro ou não. Se ela decidir não comprar mais caro, o Brasil vai exportar menos”, explica a professora.

Beni acrescenta ainda que a política de imigração de Trump pode pressionar o mercado de trabalho americano. O republicano promete uma deportação em massa e fronteiras fechadas para imigrantes. Outro ponto destacado é o aumento de gastos com defesa, que pode pressionar ainda mais o fiscal do país.

“Ele foi extremamente agressivo nas promessas sobre a política de imigração. É preciso conferir de que forma isso vai ser feito. Tem o ponto de uma estrutura bélica muito mais apoiada, o que provoca mais gasto público para financiar guerras”, conclui Beni.

Pressão para corte de gastos

Outro fator defendido por economistas é que o resultado coloca mais pressão sobre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para realizar cortes de gastos. A avaliação do economista André Perfeito é que se Lula não estancar a piora da contas públicas o dólar em alta irá "destruir em 2024 as chances dele (ou o PT) ganhar em 2026".

"A questão agora é existencial para o governo. Como as urnas já mostraram na eleição municipal, a força do centro no Brasil mostrou sinais fortes de aderência social", diz.

Perfeito aponta que essa perspectiva de controle fiscal é positiva para o mercado de capitais no Brasil no médio prazo. "Todo o esforço do governo será estancar os gastos em 2025 para tentar criar condições mais favoráveis em 2026", afirmou.

Segundo apurou a EXAME, a pressão para o governo anunciar um corte de gastos aumentou com a vitória de Trump. 

Técnicos do governo dizem que Lula já definiu que a política de reajuste real do salário mínimo e os gastos com educação não devem ser alvo de alteração na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que será encaminhada ao Congresso.

Acompanhe tudo sobre:Donald Trumpeconomia-brasileira

Mais de Economia

Governo anuncia nova liberação de emendas e total é de R$ 7,7 bilhões até esta sexta

Câmara deve iniciar votação da Reforma Tributária na segunda-feira

China registra crescimento de 7,7% nos empréstimos e depósitos em moeda local até novembro de 2024

IBC-Br: prévia do PIB sobe 0,1% em outubro, abaixo do crescimento anterior