Joia da coroa: outrora uma admirada estatal com produção de 3,5 milhões de barris por dia, a PDVSA agora bombeia apenas 700 mil barris, um recorde de baixa (Juan Barreto/AFP)
Ligia Tuon
Publicado em 28 de janeiro de 2020 às 11h38.
Última atualização em 28 de janeiro de 2020 às 11h44.
Diante do colapso econômico e duras sanções, o governo socialista do presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, propôs oferecer participações majoritárias e o controle de sua indústria de petróleo a grandes corporações internacionais, uma medida que acabaria com décadas de monopólio estatal.
Representantes de Maduro conversaram com a russa Rosneft, com a espanhola Repsol e com a italiana Eni. A ideia é permitir que as empresas assumam instalações petrolíferas controladas pelo governo e reestruturem algumas dívidas da petroleira estatal Petróleos de Venezuela em troca dos ativos, de acordo com pessoas com conhecimento do assunto.
A proposta, que poderia oferecer um bálsamo para o frágil setor petrolífero do país, está em fase inicial e enfrenta grandes obstáculos. A legislação venezuelana teria que ser alterada, há divergências sobre como financiar as operações e as sanções dos Estados Unidos impedem qualquer empresa americana de negociar com o regime Maduro sem permissão. As sanções também desencorajaram empresas de fora dos EUA a investir na Venezuela.
Outrora uma admirada estatal com produção de 3,5 milhões de barris por dia, a PDVSA agora bombeia apenas 700 mil barris, um recorde de baixa, apesar de operar nas maiores reservas do mundo. A situação financeira da empresa está em frangalhos: as reservas em moeda forte do banco central caíram para o menor nível em três décadas, enquanto as reservas de caixa do governo totalizam menos de US$ 1 bilhão.
Para que o Tesouro dos EUA mude sua política, quase certamente exigiria a aprovação do líder da oposição, Juan Guaidó, que é apoiado por Washington e líder da Assembleia Nacional, onde as leis são aprovadas.
Embora Guaidó e a oposição apoiem o aumento da participação e investimento estrangeiros na Venezuela, não querem fazer nada que ajude Maduro a sobreviver. A oposição pressiona para que Maduro renuncie e permita novas eleições presidenciais.
A PDVSA pede novos investimentos às empresas. Se a proposta for aprovada, as companhias querem receber pelo fluxo operacional, disseram duas pessoas. As negociações levantaram a possibilidade de transformar algumas das dívidas da PDVSA em capital para as empresas, disseram as pessoas.
PDVSA e Rosneft não responderam a um pedido de comentário. A Repsol não quis comentar, assim como Eni e o Tesouro dos EUA.
Várias prestadoras de serviços dos EUA, como a Chevron, possuem licenças temporárias para operar na Venezuela. Não está claro o que aconteceria com essas licenças se o governo Maduro fosse em frente com a proposta.
O petróleo tem sido a joia da coroa da Venezuela, um recurso tão precioso que restrições severas ao controle e investimento estrangeiro são estabelecidas na Constituição.
Mas a crise do país, resultado de má gestão, queda dos preços do petróleo, corrupção e pressão estrangeira, levou Maduro a abrir mão de muitos princípios socialistas recentemente.
Discretamente, o presidente da Venezuela eliminou controles sobre o câmbio e importações, permitindo o crescimento de uma economia de mercado dolarizada e limitada. Em outra medida, também iniciou conversas confidenciais com credores de cerca de US$ 60 bilhões em títulos, alguns deles dos EUA, oferecendo atrelar as dívidas a uma empresa de perfuração estrangeira que receberia os direitos dos campos de petróleo como meio de recuperar a dívida, segundo pessoas a par do assunto.
(Com a colaboração de Rodrigo Orihuela, Olga Tanas e Alex Vasquez).