Economia

Urgência na economia e incógnita na política: o duplo desafio de Bolsonaro

Analistas políticos e econômicos comentaram a estratégia do governo no café EXAME Economia, realizado nesta terça-feira em São Paulo.

Fabiane Stefano, editora de EXAME, Rafael Cortez, da Tendências, e Sérgio Praça, da FGV, no Café EXAME Economia (Flávio Moret/ImageFactory/Exame)

Fabiane Stefano, editora de EXAME, Rafael Cortez, da Tendências, e Sérgio Praça, da FGV, no Café EXAME Economia (Flávio Moret/ImageFactory/Exame)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 11 de dezembro de 2018 às 13h46.

Última atualização em 11 de dezembro de 2018 às 14h07.

São Paulo - Jair Bolsonaro tem adiante o desafio monumental de aprovar reformas econômicas difíceis e essenciais, mas ainda não se sabe o que ele vai fazer para enfrentá-lo.

Este foi o tom predominante nos debates no café EXAME Economia, realizado na manhã desta terça-feira (11) em São Paulo.

A estratégia de formar maiorias parlamentares não mais loteando ministérios e sim mobilizando as chamadas bancadas temáticas, como a ruralista e a evangélica, esbarra em algumas questões.

Segundo Sérgio Praça, professor da FGV e colunista de EXAME, as bancadas não têm lideranças claras que possam servir de interlocutoras e nunca agiram de forma coesa se não em temas de seu estrito interesse.

Além disso, o presidente eleito terá que lidar com um Legislativo que recuperou protagonismo e estará cheio de novatos e ainda mais fragmentado; até o antigo fiel da balança MDB virou um partido relativamente pequeno.

O próprio PSL, partido do presidente eleito, foi um fenômeno eleitoral, mas não tem identidade e liderança claras:

"Estão definindo no WhatsApp, vai ter uma eleição online", brinca Praça em referência às brigas envolvendo os deputados eleitos Joice Hasselmann, Eduardo Bolsonaro e outros membros do partido.

A presença de um núcleo familiar próximo ao poder composto por filhos do presidente também é inédita e pode se mostrar uma vulnerabilidade, como no caso das movimentações financeiras atípicas do ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro, incluindo um cheque para a futura primeira-dama Michelle.

Praça recomenda ficar de olho nas nomeações do segundo e terceiro escalão, que podem saciar parte do apetite dos partidos e "deslocar para o andar de baixo a sujeira política".

Nesse sentido, ele acredita que um protagonismo da agenda anticorrupção do futuro ministro da Justiça, Sérgio Moro, ou de reformas eleitorais, como sugere Bolsonaro, atrapalhariam a retomada econômica pois o sistema não daria conta de conduzir tudo ao mesmo tempo.

Segundo Rafael Cortez, analista político da consultoria Tendências, não há como acusar a estratégia empregada por Bolsonaro até agora de "estelionato eleitoral", mas ele "precisa se transformar do antipetismo para algo propositivo”.

Ele alerta que não se deve esperar nem um modelo totalmente novo de presidencialismo de coalizão e nem pressão popular para aprovar temas complexos e impopulares, como a reforma da Previdência.

Roberto Caetano, redator-chefe de EXAME, José Augusto Fernandes, diretor de Políticas e Estratégia da CNI, e José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do banco Fator, no Café EXAME Economia

Roberto Caetano, redator-chefe de EXAME, José Augusto Fernandes, diretor de Políticas e Estratégia da CNI, e José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do banco Fator, no Café EXAME Economia (Flávio Moret/ImageFactory/Exame)

Reformas

A reforma da Previdência é apontada pelos economistas como prioridade total, já que sua trajetória de custos e o envelhecimento da população tornariam o teto de gastos inviável já em 2020.

José Augusto Fernandes, diretor de Políticas e Estratégia da Confederação Nacional da Indústria (CNI), prevê algum tipo de "maquiagem" no texto da reforma já em tramitação para desvincular do governo de Michel Temer.

Ele considera promissoras a presença na equipe de Rogério Marinho, relator da reforma trabalhista que deve ser confirmado secretário de Previdência, e Marcelo Guaranys, futuro secretário-executivo do superministério da Economia.

Ambos tem ampla experiência política, o que poderia compensar o viés mais acadêmico do resto da equipe anunciada até agora.

A previsão geral é que alguma reforma passe em 2019 e o otimismo do mercado com o novo governo é evidente: a CNI verificou o maior salto da confiança em 8 anos.

No entanto, a ampla capacidade ociosa não favorece forte alta do investimento, já que não são necessárias muitas aquisições de máquinas para produzir mais.

“A simples intenção de investir não cria emprego. Existe uma defasagem entre alivio do mercado com a mudança de governo e, de outro lado, o ritmo em que essas decisões serão tomadas”, disse José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do banco Fator.

Ele acha difícil vislumbrar um amplo ciclo de investimentos em um cenário onde BNDES e estatais se tiraram de cena mas ainda é quase inexistente um mercado de crédito de longo prazo.

Na sua visão, a orientação do futuro ministério das Relações Exteriores "é uma tragédia", incluindo a retórica de alinhamento automático com os Estados Unidos: "Desde o Barão de Rio Branco o Brasil não se alinha automaticamente com ninguém".

Fernandes espera pragmatismo em temas como o relacionamento com a China e resume o momento: "a eleição foi um momento de poesia e agora entramos na fase da prosa."

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