Aviões estacionados no Aeroporto de Viracopos, em Campinas (Alexandre Battibugli/Exame)
João Pedro Caleiro
Publicado em 26 de setembro de 2019 às 16h38.
Última atualização em 21 de novembro de 2019 às 16h07.
O Senado confirmou nesta quinta-feira (26) a criação da empresa NAV Brasil, estatal que deve assumir as atribuições relacionadas à navegação aérea, atualmente a cargo da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero).
O projeto de lei de conversão (PLV 4/2019) segue para sanção presidencial. O texto é oriundo da Medida Provisória 866/2018, aprovada nesta quarta-feira (25) pela Câmara dos Deputados e que perderia a vigência na sexta-feira (27).
A iniciativa vem do governo Michel Temer mas teve apoio do governo atual, que costuma colocar a privatização das estatais como uma de suas prioridades.
Segundo o governo, a intenção é diminuir o prejuízo da Infraero, que perdeu receita após a privatização de aeroportos rentáveis, e concentrar na nova empresa os serviços que não serão privatizados.
O planejamento do governo anterior, se mantido, é de conceder à iniciativa privada todos os demais aeroportos sob administração da Infraero, que seria privatizada ou extinguida. O texto autoriza transferir empregados da Infraero a outros órgãos públicos em caso de extinção, privatização, redução de quadro ou insuficiência financeira.
O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) foi relator da matéria e autor do PLV, defendido também por Vitor Hugo, líder do governo Bolsonaro na Câmara:
Contrariando o NOVO, PSOL e PCdoB, aprovamos na CD a MP 866, q cria a NavBrasil, q protegerá a vida d nossas famílias nos céus do País (navegação e defesa aéreas), sem intenção do Gov de aumentar despesas p o Estado (a não ser, por exemplo, no caso extremo de colapso do sistema).
— Vítor Hugo (@MajorVitorHugo) September 25, 2019
A economia para a estatal será de R$ 250 milhões ao ano com a passagem dos ativos e do pessoal para a NAV Brasil. Entretanto, ela perde também a receita das tarifas aeroportuárias relacionadas à navegação aérea.
A aprovação foi criticada pelo Partido Novo, partido com o histórico de votação mais alinhado com o governo:
Mais uma estatal criada.
A MP da NAV Brasil, que havia sido proposta no governo anterior, teve seu prazo postergado pelo governo atual e foi aprovada ontem na Câmara e hoje no Senado.
A bancada do @novonacamara manteve a coerência e votou contra. pic.twitter.com/Izz5OILZUM
— NOVO 30 (@partidonovo30) September 26, 2019
O NOVO é contra novas estatais. Por isso, propusemos duas emendas (infelizmente rejeitadas) à MP 866, que cria a NAV Brasil para assumir funções da Infraero: que fosse extinta caso a Infraero não seja privatizada em até dois anos e que sobrevivesse de seus recursos apenas. pic.twitter.com/SRx2Hsk29C
— Marcel van Hattem (@marcelvanhattem) September 26, 2019
A nova estatal incorpora todos os ativos e passivos relacionados à navegação aérea hoje concentrados na Infraero.
Inicialmente, serão transferidos para a NAV Brasil os empregados da Infraero ligados à navegação aérea, que incluem serviços como telecomunicações, estações de rádio, torres de controle e medição meteorológica.
A NAV Brasil será subordinada ao Ministério da Defesa, por meio do Comando da Aeronáutica, e, por decreto, o Executivo poderá transformar a empresa em sociedade de economia mista.
A Força Aérea continuará responsável pela área de infraestrutura de navegação vinculada à defesa e soberania nacionais.
O texto especifica que a nova empresa, em razão de suas atribuições e da estrutura integrada do Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro, atuará de forma complementar à manutenção da soberania sobre o espaço aéreo brasileiro.
Ainda de acordo com o projeto de lei de conversão, a sede da nova estatal não será mais prevista no texto da MP. A redação original previa como sede a cidade do Rio de Janeiro.
Um acórdão de 2016 do Tribunal de Contas da União (TCU), citado na exposição de motivos do Executivo, previa a necessidade de um plano de reestruturação da Infraero com a divisão das atividades.
Os terminais de passageiros e de cargas, os serviços de pista de pouso e decolagem, de fiscalização e de supervisão continuarão a cargo da Infraero.
A medida provisória prevê quatro formas de a NAV Brasil contar com pessoal para suas atividades. A primeira é a transferência dos empregados da Infraero que trabalham com os serviços de navegação aérea. Entres eles, incluem-se aqueles com formação e treinamento reconhecidos pelo Comando da Aeronáutica para atuação em gerenciamento dos órgãos, controle de tráfego aéreo, informação de voo de aeródromo, telecomunicações aeronáuticas, meteorologia aeronáutica ou informações aeronáuticas.
Também serão transferidos os psicólogos que atuam na prevenção de acidentes e incidentes de tráfego aéreo; os técnicos de equipamentos e sistemas de navegação aérea; os empregados de serviços administrativos desses órgãos de navegação; e os que trabalham em serviços de conservação em localidades nas quais a Infraero disponha apenas de órgão de navegação aérea e não haja serviços de controle de tráfego.
Estão nessa situação cerca de 1,8 mil funcionários. Novos empregados deverão ser contratados pelas regras da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) com concurso público de provas ou de provas e títulos.
Alternativamente, para complementar o quadro de pessoal técnico e administrativo, a NAV Brasil poderá contratar pessoal por tempo determinado, segundo a Lei 8.745, de 1993.
O contrato poderá ser de quatro anos, prorrogável por mais um ano, no máximo. O salário poderá ser igual ou menor que o dos empregados existentes, e os novos contratados não poderão exercer cargos em comissão e funções gratificadas.
Outra contratação temporária permitida segue as regras da reforma trabalhista aprovada em 2017. Por meio de processo seletivo simplificado, esses funcionários poderão ser contratados por dois anos, admitida prorrogação se o prazo total ficar nos dois anos.
As situações permitidas para essa contratação previstas na MP são de serviço cuja natureza ou transitoriedade justifique a contratação por tempo predeterminado e para “atividades empresariais de caráter transitório”.
Esses funcionários também não poderão exercer funções gratificadas ou cargos em comissão e somente poderão ser contratados novamente pela NAV Brasil depois de seis meses da rescisão anterior.
A NAV Brasil contará ainda com a cessão de servidores e empregados públicos e militares colocados à disposição. Esses profissionais poderão ocupar ou não cargos em comissão, e a empresa deverá reembolsar os órgãos de origem pelas despesas desse pessoal.
A MP permite à nova estatal participar de planos de previdência complementar por meio de adesão a entidade fechada já existente, como a da Infraero.
Por dois anos, a Infraero poderá prestar apoio técnico e administrativo à NAV Brasil, com remuneração limitada aos custos envolvidos.
Outra mudança feita pela MP 866 é a inclusão dos serviços de navegação aérea entre os serviços considerados essenciais para efeitos da lei que regula a greve (Lei 7783/89). Essa lei prevê restrições de paralisação nesses casos.
As tarifas de navegação aérea que farão parte da receita da NAV Brasil são a Tarifa de Uso das Comunicações e dos Auxílios à Navegação Aérea em Rota; a Tarifa de Uso das Comunicações e dos Auxílios-Rádio à Navegação Aérea em Área de Controle de Aproximação (perto do aeroporto); e a Tarifa de Uso das Comunicações e dos Auxílios-Rádio à Navegação Aérea em Área de Controle de Aeródromo (aeroportos menores). Esse tipo de tarifa é pago pelas companhias aéreas.
Uma novidade incluída pela MP na Lei 6.009, de 1973, que estipula essas tarifas, é o poder dado ao comandante da Aeronáutica de reajustar anualmente os valores pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), além de outras revisões quando necessárias.
O projeto de lei de conversão prevê que o aumento máximo será o acumulado pelo IPCA, mas poderá ser menor. Já as revisões continuarão a depender de aprovação do Ministro da Defesa e de manifestação da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).
A NAV Brasil também terá como fontes de recursos o desenvolvimento de convênios e contratos e a exploração de direitos autorais e intelectuais.
Editada no final do governo Michel Temer, a MP 866/2018 havia sido revogada pela MP 883, como procedimento necessário para a votação da MP 870/2019, da reforma administrativa, e teve sua tramitação suspensa. Como a MP 883 perdeu eficácia por não ter sido analisada no prazo, a MP 866 voltou a valer.
Com informações da Agência Câmara