Reação de operadores londrinos à eleição de Donald Trump (Chris Ratcliffe/Bloomberg)
João Pedro Caleiro
Publicado em 18 de novembro de 2016 às 16h01.
Última atualização em 18 de novembro de 2016 às 17h31.
São Paulo – A inesperada eleição de Donald Trump para presidente dos Estados Unidos causou uma reviravolta nos mercados.
Os recursos fugiram dos emergentes e derrubaram moedas: o real foi de R$ 3,22 por dólar para R$ 3,39, chegando a encostar em R$ 3,50. O México, principal alvo de Trump, sofreu ainda mais.
O movimento já ganhou um apelido: “Trump Tantrum”, ou "a birra" com Trump, uma referência ao “Taper Tantrum” de 2013 e 2014.
O estopim naquela época foi quando Federal Reserve americano sinalizou que iria começar a diminuir ("taper") a compra de ativos, eventualmente subindo os juros, tornando o país relativamente mais atrativo para recursos que haviam buscado retorno nos emergentes.
“O volume do que aconteceu na semana passada em emergentes foi muito maior do que o naquela época, por isso o codinome”, diz Otaviano Canuto, diretor executivo no Banco Mundial.
A declaração foi no Seminário de 40 anos da Funcex (Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior), realizado na tarde dessa sexta-feira em São Paulo.
O novo "tantrum" acontece em um 2016 que estava sendo relativamente positivo para países como o nosso. Ilan Goldfajn, presidente do Banco Central, costumava citar um “interregno benigno”.
Na primeira metade do ano, as preocupações com a China foram amenizadas, os juros seguiam baixíssimos e Brasil quanto Rússia começavam a dar sinais de vida. Até que veio Brexit e Trump.
A fuga dos emergentes é resultado tanto da incerteza geral em relação ao presidente eleito quanto dos efeitos que sua agenda pode ter sobre a economia mundial.
Trump quer desregulamentação financeira e industrial, corte de impostos (especialmente dos mais ricos) e um programa de infraestrutura que gastaria US$ 1 trilhão em 10 anos.
Obama tentou e Hillary também queria mais estímulo fiscal; a diferença é que Trump estará alinhado com um Congresso e Senado republicanos, o que facilita a aprovação.
Como o desemprego americano está baixíssimo, mais estímulo significa mais inflação – ainda mais se combinado com restrição ao comércio internacional e à imigração, outras coisas que Trump promete.
Com mais inflação e mais déficit, o Federal Reserve ganha motivos para intensificar o processo de alta dos juros. E com juros mais altos e dólar mais forte, fica mais difícil reduzir os juros por aqui.
Antes de Trump, a aposta geral do mercado era que o Banco Central brasileiro iria cortar os juros em meio ponto percentual na reunião de final de novembro. Agora, cresce a chance de um corte menor: 0,25 p.p.
Um relatório do Citi na semana passada afirmou que as ações dos emergentes ainda tem muito espaço para cair e que a liquidação não deve acabar tão cedo.
Nem tudo é ruim para o Brasil: Affonso Pastore, ex-presidente do Banco Central, notou no evento que um plano de infraestrutura pode aumentar a demanda por minério de ferro.
É uma das principais commodities que o Brasil exporta e a ação da Vale, por exemplo, subiu bastante logo após a eleição (mas já voltou a cair).
Pastore nota que a depreciação nos últimos dias foi mais alta nas moedas de países com problemas políticos, como Brasil e África do Sul, do que em exportadores de commodities, como Austrália e Canadá.
“Esse choque do Trump piorou a situação do Brasil. A expectativa de sair da crise um pouco mais depressa com um pouquinho menos de custo ficou pior. Acho que vamos sair um pouquinho mais devagar e com um pouquinho mais de custo”, diz ele.
Esse “custo” pode ser entendido como uma necessidade de aprofundar o ajuste fiscal e acelerar outras reformas na economia para tornar o país mais atrativo dentro desse cenário difícil.
É o que o ministro Henrique Meirelles tem dito recentemente: “Quanto mais rápido aprovarmos as reformas, mais rapidamente o risco do país pode cair”.