Fazenda: IRPJ e CSLL podem ser afetados por mudança na base de cálculo (EDU ANDRADE/Ascom/MF/Flickr)
Diretora de tributos da Moore Brasil
Publicado em 6 de abril de 2023 às 14h31.
Última atualização em 6 de abril de 2023 às 16h04.
Não, ninguém aguenta mais falar sobre ICMS. Mas sim, a gente precisa continuar falando. Na semana passada o Governo apresentou os principais pontos que irão compor o projeto de lei complementar do novo arcabouço fiscal do país, que irá substituir o regime do teto de gastos. Entre fórmulas matemáticas para definição de limites de despesa, um ponto parece ser bastante óbvio: para que o arcabouço pare de pé, precisaremos de mais receitas. E se precisaremos de mais receitas, vocês bem sabem de onde elas costumam sair.
A ideia de um aumento na carga tributária caiu como água fervendo nas costas dos contribuintes já escaldados. Diante de uma reação tão negativa, o Governo apressou-se para tranquilizar não tranquilizando: não teremos criação de novos tributos, não aumentaremos alíquotas, mas cobraremos impostos daqueles que não pagam. Tudo muito confuso, como deve ser.
E se tudo está confuso, podemos ir ao suspeito de sempre: a base de cálculo. E é aqui que o ICMS cruza o caminho do imposto de renda da pessoa jurídica (IRPJ) e da contribuição social sobre o lucro líquido (CSLL) – ambos de competência federal.
Em um país de dimensões continentais, não basta ser um Estado legal e bacana para atrair empresas a se instalarem a milhares de quilômetros de seus fornecedores ou clientes. Era preciso mais. E foi assim, nesta guerra fiscal onde mais tarde descobrimos que todo mundo sai perdendo, que os estados sempre se valeram da possibilidade de criação incentivos fiscais para atração de negócios e empresas. E são estes incentivos as tais “subvenções” que agora tomaram conta do noticiário econômico.
A proposta, ainda não apresentada em detalhes, partiria da possibilidade de incluir, na base de cálculo do IRPJ e CSLL, estes benefícios fiscais de ICMS concedidos pelos Estados. Na prática seria tributar a subvenção, ou, tributar um benefício fiscal.
Se você está achando confuso até aqui, fique calmo, vai piorar.
O Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, vem adiantando que esta tributação irá incluir apenas as subvenções para custeio e não aquelas para investimento. Seria simples, não fosse o fato de que por anos a fio isso foi pauta de discussão nas esferas administrativa e judicial. Como separar subvenção para custeio da subvenção para investimento?
Teoricamente, e sempre vale o disclaimer de que estamos no Brasil, subvenção para investimento seria aquela em que o Estado exigiria alguma contrapartida da empresa beneficiada, como a construção de fábricas ou dispêndios em pesquisa e desenvolvimento. Já a subvenção para custeio seria aquela em que não existe nenhum tipo de contrapartida. Parece simples, mas há um problema. Como diferenciar as duas? Até que ponto algo pode ser interpretado como uma contrapartida? Só mais um tijolinho na imensa construção da nossa insegurança jurídica.
Pois bem. Em 2017, em um esforço para colocar um ponto final na guerra fiscal, a Lei Complementar 160 trouxe uma previsão que parecia encerrar com a polêmica classificação das subvenções: seriam todas, independente da natureza, classificadas como subvenção para investimento.
Contudo, a pretensa simplificação trazia consigo uma nem tão pequena bomba relógio: ao considera-las como investimento, todas as subvenções poderiam ser excluídas da base de cálculo do IRPJ e CSLL. Esta é a medida que o Ministro alega custar aos cofres públicos cerca de 90 bilhões de reais.
Mas esta alteração pode não ser tão simples assim. Isto porque existe também um entendimento de que a tributação pela União deste tipo de benefício poderia gerar um esvaziamento ou redução de incentivo concedido legitimamente por um Estado. Uma guerra fiscal entre União e Estados.
Vale lembrar: em terra de normas confusas, quem sonha com solução mágica normalmente acorda abraçado com o judiciário. E nem sempre o sonho é bom.