Cocaina com nota de euro: traficantes de cocaína e mineiros ilegais utilizam os serviços de alguns dos cambistas para converter dólares obtidos irregularmente em pesos (Perturbao/WikimediaCommons)
Da Redação
Publicado em 28 de janeiro de 2016 às 21h54.
Eles estão em shoppings de alto padrão, no aeroporto internacional e até mesmo nas escadarias do banco central do país. A maioria exibe documentos aduaneiros carimbados, o que faz com que pareçam não apenas inofensivos, mas oficiais.
Contudo, centenas de cambistas que vendem dólares a preços reduzidos na Colômbia fazem parte da estrutura do próspero mercado ilegal de drogas e ouro do país, alguns deles ligados a guerrilhas marxistas, segundo membros e ex-membros do governo.
Traficantes de cocaína e mineiros ilegais utilizam os serviços de alguns dos cambistas para converter dólares obtidos irregularmente em pesos. Os clientes aproveitam o desconto de 10 por cento em relação à taxa usada pelos bancos e pelos investidores.
Após décadas de violência, a Colômbia vem corrigindo o rumo.
O país é um destino turístico seguro, parece estar perto de um acordo de paz histórico com os guerrilheiros de esquerda e seus traficantes mais notórios foram mortos ou capturados. Contudo, bilhões de dólares gerados pelo crime organizado continuam impregnados na vida cotidiana.
A quantidade de áreas plantadas com coca cresceu 44 por cento em 2014, segundo a Organização das Nações Unidas, o que significa que a Colômbia cultiva mais do que o Peru e a Bolívia juntos. A exploração ilegal de ouro é, atualmente, um negócio tão grande quanto o da cocaína, disse o ministro da Defesa, Luis Carlos Villegas, em entrevista. O dinheiro sujo é abundante.
“Essas pessoas estão recebendo dinheiro de grupos ilegais, traficantes de drogas ou máfias criminosas”, disse um funcionário que atua na repressão aos cambistas, sob a condição de anonimato. “Eles não pedem documentos e não preenchem declarações de câmbio”.
As regras são tão ignoradas que alguns cambistas exercem seu ofício em frente à entrada principal do banco central. Não há cabines ou documentos à vista, mas os dólares são vendidos abertamente aos passantes. Alberto Boada, secretário do conselho do banco, disse que as autoridades tributárias, e não o banco, deveriam policiar a atividade. Ele acrescentou que os cambistas recebem boa parte de seu dinheiro dos turistas.
Shoppings e marxistas
Outros têm um ponto de vista mais severo. As pessoas que ajudam a lavar dinheiro são tão vitais para o comércio de drogas quanto os produtos químicos usados para processar folhas de coca e transformá-las em cocaína, disse Juan Ricardo Ortega, que tentou reprimir os cambistas quando chefiava a agência tributária e aduaneira, a Dian, entre 2010 e 2014.
A Dian diz que está trabalhando com o banco central para frear o comércio ilegal.
No luxuoso shopping Hacienda Santa Bárbara, no norte de Bogotá, uma dezena de cambistas que oferecem dólares a baixos preços exibem documentos da Dian.
Mas eles muitas vezes não pedem documento de identidade e impressões digitais, nem preenchem o formulário de declaração exigido -- controles que permitiriam que as autoridades identificassem discrepâncias entre compras e vendas.
Em meio às cafeterias e às lojas de roupas do shopping, duas casas de câmbio lavavam dinheiro do tráfico de drogas para o grupo rebelde marxista conhecido como Farc, segundo o Tesouro dos EUA, que bloqueou os ativos das empresas e praticamente proibiu cidadãos americanos de fazerem negócios com elas.
A diferença entre as taxas oferecidas pelos cambistas e a taxa do mercado aumentou nos últimos anos, uma evidência da “oferta abundante de dinheiro”, disse Ortega.
Alto risco
Maria Isabel Loffsner, vice-diretora de controle cambial da Dian, reconheceu que as casas de câmbio são um negócio que tem um “alto risco” de ser usado para lavagem de dinheiro.
É por isso, disse ela, que a Dian vem trabalhando com o banco central em novas regras.
Um ex-investigador da agência aduaneira descreveu as casas de câmbio ilegais como uma ramificação do sistema de tráfico de cocaína.
“O serviço que essas pessoas oferecem é coletar os dólares de um cliente fora da Colômbia e devolver o dinheiro a ele em pesos, cobrando uma comissão de 10 a 20 por cento”, disse o ex-investigador, que pediu anonimato por temer pela segurança de sua família.
“Eles colocam imóveis como garantia em caso de o dinheiro ser apreendido. Se são perdidos US$ 3 milhões, então eles entregam um apartamento avaliado em US$ 3 milhões”.