Economia

Terceirização: reforma necessária ou precarização do trabalho?

Para defensores, é um marco da modernização trabalhista no Brasil. Para críticos, é o começo do fim da CLT

Reforma Trabalhista - Nova lei trabalhista - CLT (Jorge Rosenberg/Reuters)

Reforma Trabalhista - Nova lei trabalhista - CLT (Jorge Rosenberg/Reuters)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 23 de março de 2017 às 19h15.

Última atualização em 23 de março de 2017 às 19h27.

São Paulo – A Câmara dos Deputados aprovou ontem uma lei que amplia as possibilidades de trabalho temporário e permite a terceirização irrestrita.

Para defensores, é um marco da modernização trabalhista no Brasil. Para críticos, é o começo do fim da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

A principal mudança é o fim da distinção entre atividade-meio e atividade-fim. Até hoje, uma súmula do Tribunal Superior do Trabalho (TST) definia que as empresas só podiam terceirizar funções de apoio, como segurança e limpeza. Se a lei for sancionada, elas decidem o que terceirizar.

“O mundo mudou: a empresa vencedora no século passado era a vertical, que trazia tudo para dentro. Hoje a empresa vencedora é horizontal, que se insere em cadeias produtivas ou sabe criá-las”, diz Hélio Zylberstajn, professor da FEA-USP.

Um estudo da consultoria Deloitte com a CNI (Confederação Nacional da Indústria) com 17 países selecionados verificou que nenhum faz esse tipo de distinção. As entidades empresariais brasileiras são unânimes no apoio à medida.

“O projeto aprovado traz segurança jurídica às relações trabalhistas e poderá evitar discussões judiciais. Além disso, poderá estimular contratações”, diz nota da FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

O potencial da reforma de leis trabalhistas para gerar empregos também foi apontado recentemente pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. O país tem quase 13 milhões de desempregados.

Precarização, rotatividade e informalidade

Outros especialistas temem que a mudança cause uma precarização das relações de trabalho.

“A terceirização incide com mais intensidade sobre os setores historicamente discriminados: mulheres, negros e jovens. Um modelo de flexibilização plena os torna ainda mais vulneráveis do que já são”, diz Marcelo Paixão, economista licenciado da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) atualmente na Universidade de Austin, no Texas.

Segundo números da Central Única de Trabalhadores (CUT), os terceirizados ganham menos, trabalham mais, ficam menos tempo nos empregos e estão mais sujeitos a acidentes de trabalho.

Mas segundo Zylberstajn, essa diferença é fruto da própria distinção atual entre quem pode e não pode ser terceirizado. Na medida em que a terceirização chegar a setores mais nobres, a média vai mudar.

O mesmo debate é se a terceirização pode agravar a rotatividade do trabalhador brasileiro, que já é alta pelo padrão internacional, ou desincentivar a formalização, que crescia intensamente antes da crise.

"Qualquer processo duradouro de ganhos de produtividade exige relações duradouras de trabalho entre os trabalhadores e a empresa. Se ela não tem vínculos duradouros, ela se sente menos estimulado ao treinamento. É um tiro no pé. Estimula as empresas a contratos instáveis e temporários", diz Paixão.

Para Hélio, não há nada inerente à terceirização que estimule a informalidade ou rotatividade:

"Não foi revogada a CLT. Terceirizado também tem carteira assinada. O tipo de terceirização que se chama de intermediação de mão de obra é uma fraude que continua proibida."

Dois projetos

O projeto aprovado ontem é de 1998. Ele é bem mais curto e menos detalhado do que outro discutido em 2015, e que agora voltará à pauta segundo o presidente do Senado, Eunício Oliveira.

Caso os dois sejam aprovados, o presidente Michel Temer pode fazer uma combinação de sanções e vetos específicos.

O projeto de 2015 proibia que a empresa contratasse como terceirizado um funcionário que trabalhou nela como CLT nos últimos 12 meses.

Essa restrição não consta na lei aprovada ontem e alguns apontam para o risco de “pejotização”, com perda de arrecadação para o governo e prejuízo sobre a contribuição previdenciária.

Os chamados Empreendedores Individuais contribuem apenas 5% sobre o salário para a Previdência, sem contrapartida do empregador.

Outra diferença é que o projeto de 2015 obrigava o recolhimento antecipado de FGTS e INSS e a retenção dos valores. Não há essa exigência no novo texto, o que para alguns aumenta o risco de calote.

O projeto de 2015 também garante aos terceirizados dos mesmos serviços de alimentação, transporte e atendimento médico dos contratados diretamente, algo que não consta no projeto aprovado ontem.

 

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