Economia

Secovi propõe que construtoras não devolvam dinheiro em distrato

Atualmente, as decisões judiciais permitem que as empresas retenham de 10% a 30% do dinheiro pago por consumidores quando eles desistem da compra

Construtoras: Secovi quer impedir que os consumidores desistam da compra de imóvel na planta durante a obra (Raul Junior/Divulgação)

Construtoras: Secovi quer impedir que os consumidores desistam da compra de imóvel na planta durante a obra (Raul Junior/Divulgação)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 10 de março de 2017 às 14h54.

São Paulo - Após vários meses de reuniões sem acordo entre empresários, consumidores e governo, a regulamentação dos distratos de imóveis pode tomar novos rumos.

O Sindicato da Habitação de São Paulo (Secovi-SP) apresentou na quarta-feira, 8, ao presidente da República, Michel Temer, a proposta de liberar os incorporadores da obrigação de devolver os valores recebidos durante a obra, uma vez que já foram utilizados na construção do empreendimento imobiliário.

Hoje, não há lei sobre o tema, mas as decisões judiciais costumam permitir que as empresas retenham entre 10% a 30% do valor pago pelos consumidores.

"Queremos que o distrato tenha um rito de solução através do mercado e que não traga para a empresa a obrigatoriedade de indenizar o consumidor", afirmou Flávio Amary, presidente da entidade.

Se o consumidor não concluir a compra por qualquer motivo quando a obra ficar pronta, o empresário sugere a revenda a terceiros ou o leilão.

"Ele terá que vender o imóvel para um terceiro em vez de obrigar o incorporador a devolver o dinheiro", disse. "Se ficar inadimplente ou não achar um comprador, o imóvel pode ir para um leilão", acrescentou.

Segundo Amary, é preciso inibir os cancelamentos dos contratos de compra de venda de imóveis negociados na planta, pois isso já é o que estabelece a legislação.

A lei 4.591/64, mais conhecida por lei de incorporação imobiliária, prevê em seu artigo 32 que "os contratos de compra e venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de unidades autônomas são irretratáveis".

"A nossa proposta é que se cumpra a lei. O contrato já é irrevogável e irretratável", afirmou o presidente do Secovi-SP.

A proposta foi apresentada pessoalmente em Brasília a Michel Temer e ao ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, que ainda irão analisar o assunto antes de se posicionarem oficialmente.

Agora, o sindicato vai preparar um texto para complementar a lei 4.591/64, com alguns parágrafos reforçando que os contratos de compra e venda de imóveis não podem ser desfeitos. Para Amary, essa é uma proposta fácil de ser defendida pelo governo, pois cumpre a lei à risca ao inibir o distrato.

Desde o ano passado, o debate sobre a regulamentação das rescisões se intensificou. Nas propostas na mesa até aqui, havia consenso de que a futura regra envolveria a devolução de valores, mas surgiram divergências sobre a base de cálculo do reembolso.

Entidades de defesa do consumidor defendem que a devolução seja calculada sobre porcentual do valor já pago pelo imóvel, mas o setor da construção diz que o reembolso deve ser sobre o valor do contrato. Sem um consenso das partes, caberia ao governo dar uma palavra final na formulação da regra. Já com a proposta do Secovi-SP, o governo não teria que arbitrar cálculo algum.

Viabilidade

Para o especialista em mercado imobiliário Alberto Mattos, advogado do escritório PMMF, a proposta do Secovi-SP dificilmente será viável.

"A proposta faz sentido, mas acho difícil que passe", disse. Ele explica que há uma prática ampla no Judiciário de acatar o distrato, mesmo que a lei de incorporação estabeleça o contrário. "Essa proposta vai esbarrar no entendimento dos juízes, que tendem a proteger os consumidores", comentou Mattos.

Ele acrescentou que há falta de proteção aos incorporadores. Nos casos em que o mutuário deixa de pagar o financiamento da casa própria, por exemplo, o imóvel é retomado pelos bancos, sem devolução de dinheiro pago pelo consumidor.

"Isso não acontece da mesma forma para o incorporador, e isso cria insegurança jurídica, encarecendo a produção de imóveis".

O advogado Ricardo Negrão, sócio do escritório NF&A, avalia que a proposta dos empresários da construção precisa ser discutida com mais profundidade, pois há muitas chances de esbarrar no Código de Defesa do Consumidor (CDC), que veta a perda total de valores pagos pelos compradores em uma negociação.

Se o adquirente ficar sujeito a não ter reembolso dos valores pagos, a lei de incorporação não vai prevalecer, segundo Negrão. "Ao se leiloar a unidade do adquirente, é preciso prever que parte do valor voltará para ele, caso contrário o CDC vai barrar".

Acompanhe tudo sobre:ConstrutorasGoverno Temer

Mais de Economia

BNDES vai repassar R$ 25 bilhões ao Tesouro para contribuir com meta fiscal

Eleição de Trump elevou custo financeiro para países emergentes, afirma Galípolo

Estímulo da China impulsiona consumo doméstico antes do 'choque tarifário' prometido por Trump

'Quanto mais demorar o ajuste fiscal, maior é o choque', diz Campos Neto