Economia

Seca deve fazer conta de luz subir a partir de setembro, com bandeira amarela

Governo vê ainda problema estrutural pela demanda do acionamento de usinas térmicas nos horários de pico de demanda, diante da instabilidade da energia sola e eólica

Agência o Globo
Agência o Globo

Agência de notícias

Publicado em 26 de agosto de 2024 às 06h55.

Última atualização em 26 de agosto de 2024 às 06h58.

Tudo sobreEnergia elétrica
Saiba mais

A conta de luz dos brasileiros deve ficar mais cara a partir de setembro. O governo já está ciente de que a bandeira amarela na conta de luz deve ser acionada no mês que vem devido à queda no nível dos reservatórios com a seca em todo o país.

Além do problema de curto prazo, deve começar a pesar mais para os consumidores os gastos com o acionamento de usinas térmicas para dar conta da demanda no horário de pico. E esta é uma segunda fatura, que será acertada no reajuste anual das distribuidoras de energia.

Em relação à bandeira amarela, uma taxa extra na conta de luz, a definição será feita pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) na próxima sexta-feira. A expectativa é que seja acionada em setembro, mas que não dure muito se as chuvas prometidas para o início do período úmido, em outubro, se confirmarem. O custo adicional da bandeira amarela é de R$ 1,88 a cada 100 quilowatt-hora (kWh) de energia usados. Em agosto, a bandeira é verde, sem custo extra na tarifa.

Mas há outro movimento mais permanente que aumenta o custo de geração de energia no segundo semestre de cada ano, principalmente devido à mudança da matriz energética do país, com alta da participação da solar e eólica, que já responde por 31,4% da geração. Esse problema vem sendo enfrentado por outros países, mas tem ficado mais evidente no Brasil desde o ano passado e deve pesar no reajuste anual das distribuidoras em 2025.

Fontes intermitentes

As duas fontes de energia renovável, embora mais sustentáveis do ponto de vista ambiental, são intermitentes, ou seja, têm grande variação de oferta, porque são dependentes da luz do sol e do vento. No caso da solar, há uma queda brusca da geração de energia no início da noite — e nem sempre a eólica está disponível neste momento.

Por isso, em um período curto de tempo, outras fontes precisam compensar a geração solar e atender a demanda maior. Tipicamente, dada às características do Brasil, as hidrelétricas cumprem este papel, principalmente as do Norte, como Belo Monte, Jirau e Santo Antônio. Mas, na avaliação do governo, a ajuda que pode ser dada pela geração hidráulica já está no limite, principalmente nos períodos de seca, como o atual, em que os reservatórios ficam mais baixos e dificultam o funcionamento das hidrelétricas.

Dados do Operador Nacional do Sistema (ONS, que faz a gestão do sistema elétrico no país, que é quase totalmente interligado) mostram que entre 11h e pouco depois de meio-dia da última terça-feira, a geração solar colocou quase 30 mil megawatts (MW) no sistema. Pouco depois das 18h, essa geração estava abaixo de 100 MW — a média do consumo diário fica em 80 mil MW. O pico da demanda, acima de 91.000 MW, ocorre entre 18h e 19h, horário do tombo na geração solar.

A preocupação mais urgente é com a capacidade de geração de energia nos horários de pico em outubro, quando já está mais quente, o que aumenta o uso de ventiladores e ar-condicionado, mas as chuvas ainda não se consolidaram.

Prevenção a apagão

Para evitar o risco de “apagão” nos horários de pico, o ONS pediu ajuda ao governo para que todos os instrumentos estejam disponíveis, entre eles as térmicas, que são mais caras. Uma das propostas é a antecipação da operação da térmica da Neoenergia em Pernambuco, inicialmente prevista para 2026.

— Hoje, o ONS tem todos os recursos na mão. Pode ser que venham picos de preço, porque o ONS usa esse recurso para atender os consumidores. Tudo que eu não quero é chegar em casa e estar sem luz — diz o presidente da consultoria Thymos, João Carlos Mello.

Ao contrário da última crise, em 2021, as usinas só são ligadas por cerca de seis horas em dias específicos, quando as hidrelétricas e as eólicas não conseguem compensar a queda brusca da geração solar no fim do dia. Há três anos, foram acionadas por seis meses ininterruptamente, já que a água dos reservatórios baixou para níveis mínimos.

— Não há um risco de faltar energia como em 2021 ou como no racionamento de 2001. Tem uma preocupação pontual para atender a demanda por energia nessas horas críticas — explica Diogo Lisboa, do Centro de Estudos em Regulação e Infraestrutura da FGV.

O governo também tem avaliado outras medidas. Uma delas é o incentivo ao programa de resposta de demanda, quando o operador pede para grandes empresas consumidoras desligarem sua produção em determinado momento do dia para evitar estresse no sistema. Na avaliação de integrantes do Ministério de Minas e Energia, é preciso atuar nas duas pontas para conseguir administrar a situação, com a disponibilidade das térmicas e de grandes consumidores, como as indústrias.

Resposta da demanda

De acordo com a equipe do ministro Alexandre Silveira, o cenário “não é confortável”, porém não causa riscos ao sistema. É preciso fazer gestão de recursos, disse uma autoridade envolvida nos estudos. Levantamento do ONS em posse do governo demonstra uma coincidência de carga elevada e baixa geração nas usinas eólicas no fim da tarde e início da noite. Outra medida em estudo é a importação de energia da Argentina e do Uruguai.

Presidente da Frente Nacional dos Consumidores de Energia e ex-diretor geral do ONS, Luiz Barata defende que o Brasil precisa avançar no programa de resposta da demanda, para não ficar tão dependente das térmicas, mais caras. Ele lembra que o deslocamento da produção de grandes consumidores de energia, como as indústrias, não é obrigatório, mas que tende a ser considerado vantajoso para não pagar mais pela energia.

— Precisamos buscar alternativas para aquelas pessoas que disputam se pagam a conta ou se compram comida. E os grandes consumidores só vão concordar em reduzir o consumo se não afetar o negócio.

Segundo Lisboa, da FGV, o Brasil está bem posicionado para o desafio atual, mas precisa garantir a disponibilidade de energia a um preço competitivo e não uma “disponibilidade a qualquer preço”.

A cota extra em setembro está na conta de vários analistas de inflação, mas a expectativa é de que o ano se encerre com bandeira verde, contando com bom volume de chuva a partir de outubro ou novembro. Se as chuvas não vierem, o nível dos reservatórios do Sudeste e do Centro-Oeste podem começar a preocupar.

Para Desirée Brandt, sócia-executiva e meteorologista da Nottus, as chuvas devem se consolidar em outubro, o que deve dar conforto para o setor elétrico. O economista-chefe do Banco BMG, Flávio Serrano, vê risco de 25% de que o ano termine com bandeira amarela, com impacto de 0,09 ponto percentual no IPCA. Ele projeta 4,20% para o índice deste ano, abaixo do teto da meta, de 4,5%.

Acompanhe tudo sobre:Energia elétricaEletricidadeImpostos

Mais de Economia

Oi recebe proposta de empresa de tecnologia para venda de ativos de TV por assinatura

Em discurso de despedida, Pacheco diz não ter planos de ser ministro de Lula em 2025

Economia com pacote fiscal caiu até R$ 20 bilhões, estima Maílson da Nóbrega

Reforma tributária beneficia indústria, mas exceções e Custo Brasil limitam impacto, avalia o setor