O impacto no fluxo de caixa acontece por conta da criação do modelo de split payment – de pagamento automático de impostos sobre o consumo à União, estados e municípios (Germano Lüders/Exame)
Publicado em 14 de abril de 2025 às 12h19.
A reforma tributária trará impactos significativos para a gestão das micro e pequenas empresas, exigindo uma revisão do fluxo de caixa e da formação de preços, adverte Charles Gularte, contador e Chief Services Officer (CSO) da Contabilizei, startup de contabilidade. Em entrevista ao programa Macro em Pauta da EXAME, o especialista aponta que embora a reforma tenha como objetivo simplificar o sistema e ampliar a base de contribuição, a mudança na forma de recolhimento de impostos afetará diretamente os pequenos negócios.
"As micro e pequenas empresas vão precisar olhar mais para a sua gestão financeira do que olham hoje. Na formação de preço, historicamente elas o formam olhando mais o preço do mercado do que de fato a composição do custo, impacto e regime tributário. Mas a reforma vai exigir dos pequenos negócios uma adaptação importante", afirma o especialista.
Esse impacto no fluxo de caixa acontece por conta da criação do modelo de split payment – de desconto automático de impostos sobre o consumo à União, estados e municípios. O mecanismo vai modificar a dinâmica para aquelas que fazem transações financeiras via cartões, PIX e boletos.
Atualmente, os empresários recebem o valor das vendas e fazem o pagamento dos impostos no mês seguinte. Mas, com a reforma, o imposto será debitado no momento da transação financeira, reduzindo o montante que entra no caixa das empresas.
Gularte observa que o pequeno empresário já enfrenta desafios na gestão financeira e a mudança no recolhimento de imposto exigirá um acompanhamento mais próximo do fluxo de caixa.
"A falta de planejamento pode comprometer o pagamento de fornecedores, contas básicas e até salários", diz. "A pequena empresa vai precisar rever como administra seus recebimentos para garantir que haja recursos suficientes para cobrir os custos operacionais."
Com a mudança no recolhimento de impostos, o contador também considera fundamental calcular o preço com mais precisão. Principalmente dado o histórico dos pequenos negócios de, em geral, precificam seus produtos e serviços olhando para a concorrência, sem considerar detalhadamente a composição dos custos e o impacto tributário.
"Cada empresário precisará entender a carga tributária incidente sobre suas vendas, quem são seus clientes (pessoa física ou jurídica) e avaliar se o regime tributário atual ainda é o mais vantajoso", afirma.
A observação valerá principalmente para as empresas do Simples Nacional, caso da maioria das micro e pequenas companhias.
A reforma tributária traz o conceito de não cumulatividade, permitindo que empresas abatam impostos pagos em etapas anteriores da cadeia produtiva. No entanto, o Simples Nacional, apesar de preservado em seu formato atual, não dará créditos tributários aos seus contratantes.
A ausência dessa possiblidade, de acordo com o CSO da Contabilizei, pode prejudicar a competitividade das pequenas empresas e exigir que elas revejam o regime em que estão inscritas, já que a depender do contratante, ele pode preferir comprar de empresas que geram crédito tributário.
"A empresa pode ser micro e estar em qualquer regime, no Simples, no Lucro Presumido ou no Real. Se ela optar por não ficar no Simples ou no que está se chamando de regime híbrido do Simples Nacional, – em que ela vai poder complementar seu recolhimento e gerar esse crédito para quem compra –, a empresa vai precisar refazer o seu preço. Se ela não fizer, perderá competitividade e clientes", afirma Gularte.
Com esse novo cenário, pequenos empresários terão a possibilidade de mudar de regime tributário duas vezes ao ano, o que antes só podia ser feito uma vez.
A mudança é aprovada pelo especialista por permitir ajustes estratégicos conforme o perfil da clientela e a sazonalidade das vendas. "Se no primeiro semestre uma empresa atende mais clientes pessoa física, pode optar por um regime. Se no segundo semestre atende mais empresas, pode mudar para gerar créditos tributários aos seus compradores", diz ele.
Apesar dos desafios, o especialista acrescenta que a reforma tributária também traz pontos positivos, como a simplificação do sistema tributário e a maior eficiência na arrecadação, que pode resultar na redução das alíquotas ao longo do tempo.
Para garantir que a transição seja bem-sucedida, o pequeno empresário deve buscar apoio especializado, destaca o CSO da Contabilizei, especializada no atendimento a pequenos negócios.
"O mais importante é não esperar para se adaptar. É preciso revisar o fluxo de caixa, simular novos cenários tributários e entender como estruturar os preços. Quem se preparar desde já terá mais chances de manter a saúde financeira do negócio".