Economia

Quanto vale uma cédula de 2 mil pesos? Na Argentina, quase nada

Com o país à beira da hiperinflação, Banco Central vai lançar nova nota. Mas este valor, hoje, compra apenas uma caixa de bombom. Amanhã, já não se sabe...

Argentina: saiba o impacto da inflação no país (Bianca Alvarenga/Exame)

Argentina: saiba o impacto da inflação no país (Bianca Alvarenga/Exame)

Agência o Globo
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Agência de notícias

Publicado em 5 de maio de 2023 às 16h22.

Última atualização em 5 de maio de 2023 às 17h02.

Com uma taxa de inflação acima de 100% nos últimos 12 meses (na região, superada apenas pela Venezuela), o governo argentino finalmente cedeu às pressões dos setores econômicos — e da sociedade em geral — que pediam a impressão de uma cédula acima dos mil pesos, a de maior valor que circula atualmente no país.

As cédulas de 2 mil pesos já estão prontas, aguardando um processo burocrático para chegar ao bolso dos argentinos. Mas, afinal, o que se pode comprar com 2 mil pesos num país no qual sua moeda nacional, que neste ano completou 31 anos de vida, é a mais desvalorizada da América Latina?

O que dá para comprar com 2 mil pesos na Argentina?

Uma caixa de bombons serenata de amor, 2 litros de óleo de girassol e duas latas de atum, entre outros exemplos.

Um capuccino pequeno, nesta sexta-feira dia 5 de maio de 2023, custa 940 pesos. Mas ninguém sabe quanto este instante de relaxamento custará quando, enfim a nova cédula entrar em vigor. Afinal, ontem, dia 4 de maio, a mesma xícara na mesma cafeteria custava 670 pesos.

Dois mil pesos, num supermercado de Buenos Aires, rendem hoje muito pouco. Uma compra semanal para uma família de quatro pessoas custa atualmente, em média, entre 30 mil e 40 mil pesos, dependendo da variedade e quantidade de produtos. Ou seja, para pagar em dinheiro, seria preciso usar 40 cédulas da atual maior denominação — ou 20 notas com o novo valor de 2 mil pesos.

Valor da cesta básica na Argentina

De acordo com o Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (Indec, o IBGE local), em abril passado a cesta básica mensal de alimentos custava 191.228 mil pesos. Essa é a renda que determina se uma pessoa está abaixo ou acima da linha da pobreza.

Em refeitórios populares que alimentam milhares de argentinos diariamente nos bairros mais pobres da capital e da Grande Buenos Aires, voluntários comentam que um pacote de macarrão de marca nacional num supermercado de uma região humilde da cidade custa 500 pesos.

Num supermercado num bairro nobre de Buenos Aires, como Palermo, Recoleta ou Belgrano, meio quilo de macarrão da marca Barilla custa 1.725 pesos. Ou seja, o cliente entra com a maior nota do país no bolso e sai apenas com um pacote de macarrão.

Com 2 mil pesos, uma pessoa não compra sequer duas pastas de dente da marca Colgate com efeito Luminous White (1.299 pesos), e não consegue pagar uma lata de leite em pó da Nestlé, de 800 gramas, que custa 2.938 pesos.

Revistas e gastos além da alimentação

Num jornaleiro portenho, uma revista especial sobre as camisetas do River Plate, um dos times mais importantes do país, é vendida por 2.490 pesos. Uma carteira econômica numa loja num shopping portenho pode custar 9.100 pesos — e sem ser de couro.

Na rede de comidas rápidas McDonald's, 2 mil pesos são suficientes para comprar um combo de hambúrguer duplo com queijo, uma bebida e batata frita (1.450 pesos), mas não são suficientes para levar um combo da promoção Copa do Mundo, que inclui um hambúrguer de frango completo, uma bebida, batata frita e um brinde (2.300 pesos).

A nota de 2 mil pesos vai facilitar um pouco a vida, num país no qual ainda persiste o hábito de pagamento em espécie. Táxis em Buenos Aires não aceitam pagamentos virtuais, de nenhum tipo — o que explica a preferência dos turistas por aplicativos como Uber e Cabify. Muitos comércios preferem pagamento em dinheiro, e oferecem descontos de até 20%.

Valor da cédula de mil pesos

A célula de mil pesos, em circulação desde 2017, equivale atualmente a US$ 4,30. Quando foi lançada podia comprar US$ 55,5. Hoje, com mil pesos uma pessoa pode tomar um ou dois cafés, dependendo do bairro em que estiver.

Com 2 mil consegue tomar um café acompanhando pelas tradicionais medialunas (croissants). Um alfajor da Havanna custa 420 pesos, ou seja, menos de US$ 1.

Alguns valores impressionam especialmente os turistas, por exemplo, o custo do transporte. Uma corrida de táxi do aeroporto internacional de Ezeiza até o centro da cidade pode custar em torno de 8 mil pesos (com Uber pode ficar ainda mais em conta), na cotação atual da moeda americana, equivalente a US$ 17. Para isso, o turista precisaria de "apenas" quatro notas de 2 mil pesos. Numa cidade como Nova York, um táxi do aeroporto até o centro fica em cerca de US$ 60.

Contenção da inflação argentina

Em clima de campanha eleitoral para a Presidência de 22 de outubro, o governo do presidente Alberto Fernández vinha resistindo aos pedidos de emissão de notas de valores mais altos. Para a Casa Rosada, a decisão implica admitir que a inflação está nas nuvens, o que poderia provocar um impacto negativo nas urnas.

Antes da eleição de outubro, em 13 de agosto os argentinos participarão das Primárias Abertas Simultâneas e Obrigatórias (Paso), que mostrarão a força real de cada um dos candidatos. Nas últimas pesquisas que circularam no país, comentam analistas locais, o candidato de extrema direita Javier Milei, cuja principal proposta é a dolarização da economia para conter a inflação, está na liderança, com chances de vencer. Seria uma derrota história para o peronismo e para os partidos tradicionais do país.

A inflação é hoje uma das principais preocupações dos argentinos. Em 2022, o país teve um aumento de preços de 94,8%, e nos últimos 12 meses a taxa já superou 100%. O drama da escalada de preços começou na década de 1940, nos primeiros governos do general Juan Domingo Perón. No quesito inflação, os piores anos desde a redemocratização do país, em 1983, foram os de 1989 (3.079%) e 1990 (2.314%).

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