O presidente russo, Vladimir Putin: tudo indica que a Rússia sofrerá a maior queda do consumo em mais de duas décadas (Maxim Zmeyev/Reuters)
Da Redação
Publicado em 16 de fevereiro de 2015 às 19h31.
Moscou - As famílias russas estão suportando o impacto das consequências negativas da crise na Ucrânia e da derrocada dos preços do petróleo.
Tudo indica que o país sofrerá a maior queda do consumo em mais de duas décadas, o que agravará a recessão.
Esmagadas pela desvalorização de 44 por cento do rublo nos últimos doze meses e pela alta dos preços, as vendas varejistas devem sofrer o que, segundo previsões da Otkritie Capital, será o maior declínio desde o colapso da União Soviética em 1991, quando as economias foram eliminadas e as famílias tiveram que aguentar a escassez de alimentos e a hiperinflação.
Esse fato tem assustado consumidores como Svetlana Korotkova, que está acumulando cereais e bens enlatados para montar o que ela chama de “colchão de segurança”, lição aprendida a partir da privação da era da Perestróica, na década de 1980.
“Os recursos do governo são muito limitados agora, portanto não espero uma grande ajuda”, disse Korotkova, uma contadora de 42 anos que falou enquanto passeava por um shopping em Tula, a cerca de 200 quilômetros ao sul de Moscou.
Seis anos depois de ordenar um aumento de 33 por cento das pensões no auge da última crise, o presidente Vladimir Putin agora está atrelando as mudanças nos pagamentos de aposentadorias à inflação do ano passado e dirigindo a maior parte de um programa de US$ 37 bilhões para apoiar os credores e a indústria: quase metade do somatório será utilizada para recapitalizar os bancos. Em 2009 e 2010, quando era primeiro-ministro,
Putin aplicou o maior pacote de estímulos no G20, segundo estimativas do Goldman Sachs Group Inc., equivalente a 9,8 por cento da produção econômica.
Recessão iminente
Aquele programa contrasta fortemente com os atuais planos do governo para combater a recessão que, segundo previsões dos economistas, durará quatro trimestres. Com pouco alívio à vista para o consumo, que representa cerca de metade da economia, a Rússia corre o risco de ter uma crise mais prolongada, segundo Natalia Akindinova, diretora do Centro de Desenvolvimento da Escola Superior de Economia em Moscou.
“Agora, o plano contra a crise está mais focado nos bancos e nos setores industriais, mas não nos setores que mais estão sofrendo”, disse Akindinova. “Os que mais sofrem são o comércio, a construção e os serviços”.
Os consumidores estão diminuindo os gastos desde que o rublo perdeu quase metade do seu valor frente ao dólar nos últimos 12 meses. A volatilidade implícita do rublo em um mês pulou para quase 90 no começo de janeiro antes de conter o aumento para 37 no dia 12 de fevereiro. Essa taxa é quase o dobro do nível da seguinte moeda mais volátil de um mercado emergente, o real brasileiro.
Segundo previsões do Ministério da Economia, a inflação, que subiu para 15 por cento em relação ao ano anterior em janeiro, terá um pico de até 17 por cento na próxima primavera boreal, um patamar não visto desde 2002.
Pressão
A pressão sobre as finanças da Rússia está aumentando em meio às sanções dos EUA e da União Europeia e à superabundância mundial de petróleo que diminuiu os preços do petróleo bruto quase 50 por cento no ano passado.
O governo teve um déficit de 0,5 por cento da produção econômica no ano passado. Com os preços do petróleo bruto a US$ 50 por barril, esse déficit poderia se ampliar para 3,8 por cento, segundo o ministro da Economia, Alexei Ulyukayev.
As dificuldades financeiras sofridas pelos consumidores estão turvando vários setores, de importadores de vinho e serviços de streaming de música até hotéis de luxo e varejistas como a O’Key Group SA e a Euroset Holding NV.
A O’Key, uma varejista russa de alimentos com foco em grandes supermercados, responsabilizou a crise econômica e a proibição retaliatória de importar alguns alimentos de países europeus e outros pelo declínio no número de consumidores, que no trimestre passado provocou uma queda de 5,1 por cento em suas vendas comparadas.
“De certa forma, dessa vez eles estão preparados para sacrificar os consumidores e fazer com que eles paguem a maior parte do preço”, disse Liza Ermolenko, economista da Capital Economics Ltd., com sede em Londres, por e-mail. “Esse segmento da economia vai sofrer a maior parte do ajuste necessário”.