Publicado em 8 de abril de 2024 às 11h49.
Última atualização em 8 de abril de 2024 às 11h51.
Após a divulgação do PIB de 2023, a Tendências promoveu ajustes nas projeções para crescimento da economia e para a taxa de câmbio em 2024. No caso do PIB, a estimativa foi elevada de 1,5% para 1,8% neste ano, número que ainda contempla importante desaceleração ante a expansão de 2,9% observada em 2023.
A abertura dos dados atenua essa aparente piora, sendo, em grande medida, causada pela reversão do choque positivo do setor agropecuário no ano passado e desaceleração moderada do PIB de serviços.
Com relação à taxa de câmbio, a expectativa de final de ano passou de R$ 5,00/US$ para R$ 4,95/US$, dado que os modelos ainda apontam níveis mais valorizados da variável, em contexto de robustez das contas externas e de expectativa de redução dos juros nos Estados Unidos a partir de junho.
Porém, reitera-se o alerta acerca de diversos fatores de risco para a taxa de câmbio, como as preocupações fiscais internas, a transição no comando do Banco Central, o ritmo incerto de desaceleração da China, as tensões geopolíticas e potenciais implicações das eleições norte-americanas.
A economia brasileira manteve-se estável na segunda metade do ano passado. O resultado do PIB confirmou as estimativas para o trimestre final de 2023, mas superou as primeiras projeções de pequena queda na margem. O ponto de partida mais elevado e, sobretudo, o desempenho atual relativamente acima do esperado de alguns dos determinantes econômicos de curto prazo motivaram a revisão da projeção do PIB de 1,5% para 1,8% em 2024.
Quanto aos determinantes do consumo das famílias, destacam-se os sinais de aquecimento adicional do mercado de trabalho, contrariando a visão de gradual esfriamento esperada, enquanto o mercado de crédito tem confirmado o ambiente de melhora com quitação de dívidas e gradual alta das concessões à PF. Do lado mais exógeno do consumo, os precatórios devem contribuir pontualmente para o início deste ano, enquanto o arrefecimento esperado da massa de transferências de renda do governo limita revisão mais pronunciada do consumo, ainda que o líquido seja de pequena revisão positiva para consumo e serviços em 2024.
Pelo lado industrial, esse ambiente mais resiliente da demanda interna gera efeitos positivos adicionais para transformação e construção civil, intensificando a expansão já em curso, em especial, dentro dos segmentos mais sensíveis ao ciclo econômico que começam a se beneficiar do afrouxamento das condições financeiras. O novo PAC e as iniciativas que contemplam o novo programa industrial também contribuem para esse movimento de reação dentro da indústria e investimentos.
Assim, embora o cenário básico de crescimento contemple desaceleração importante da economia, os setores mais sensíveis ao ciclo devem mostrar melhor desempenho, como construção e indústria de transformação (setores que registraram perdas em 2023). Espera-se ligeira desaceleração da atividade de serviços, acompanhando a normalização das condições de oferta e demanda de serviços às famílias pós pandemia e menor expansão de outras rubricas com peso relevante, como do mercado de seguros.
A desaceleração projetada para o PIB neste ano, portanto, precisa ser contextualizada para que se compreenda o atual momento da economia. Uma diferença importante é o menor carry over (herança estatística) frente aos anos anteriores. A segunda diferença é a mudança no perfil de crescimento, menos dependente de fatores mais exógenos ao ciclo econômico. Cerca de 60% da expansão de 2,9% do PIB no ano passado partiu de setores menos sensíveis ao ciclo, com destaque para o efeito direto da agropecuária e extrativa, com reflexos diretos para as exportações.
Quanto à taxa de câmbio BRL/USD, os modelos continuam a apontar “câmbio justo” entre R$ 4,70/US$ e R$ 4,80/US$, influenciados por aspectos como os termos de troca ainda favoráveis, que contribuem para a manutenção de saldo comercial robusto neste ano, e os baixos prêmios de risco Brasil. Adicionalmente, a perspectiva de alguma desvalorização dólar no exterior ao longo do ano atua no sentido baixista, ainda que o corte dos juros por parte do Fed a partir de meados do ano já esteja, em grande medida, precificado. No entanto, os resultados dos modelos não são garantia de que tais patamares serão alcançados, tendo em vista que os mercados ponderam os riscos presentes no horizonte relevante.
E nesse sentido, a maior parte desses riscos atua em direção desfavorável ao real. Internamente, apesar de sinais melhores da arrecadação tributária neste início de ano, a situação fiscal sugere cautela. Ao longo do ano o governo terá que tomar decisões difíceis, entre alterar a meta de primário e promover maior contingenciamento de despesas. Reiterados sinais de maior intervencionismo na economia também podem incomodar os investidores. Ainda no âmbito local, a transição de comando do BC no final do ano merecerá atenção. No exterior, eventual desaceleração mais intensa da China pesaria negativamente sobre moedas ligadas às commodities, caso do real brasileiro. Os recorrentes focos de tensão geopolítica podem passar por períodos de intensificação, elevando à aversão ao risco. Nos Estados Unidos, maior resiliência da inflação postergaria o corte dos juros, renovando o fôlego do dólar. Ainda por lá, as eleições presidenciais em novembro devam causar volatilidade no segundo semestre.
De todo modo, os fundamentos favoráveis ao real limitam os riscos de movimentos abruptos e consistentes. É fato que a variável sempre requer cuidado, diante dos diversos fatores que a influenciam e de potenciais oscilações repentinas. Por ora, nosso cenário contempla apreciação cambial no curto prazo. No entanto, diante dos riscos apontados, mantemos postura cautelosa quanto à dinâmica da variável no segundo semestre, o que está contemplado na expectativa de R$ 4,95/US$ ao final de 2024.
* Silvio Campos Neto é economista e sócio da Tendências Consultoria.
* Thiago Xavier é economista e analista da Tendências Consultoria.