Economia

Pós-pandemia: dívida dos mais pobres fará desigualdade explodir em 5 anos

Postos para trabalhadores menos qualificados estão ameaçados com o fim de auxílios emergenciais do governo, diz a Oxford Economics

Favela contrasta com prédios residenciais, no Rio: Famílias de alta renda ainda estão gastando 11% abaixo das tendências pré-coronavírus; as de baixa, 2% a mais (John Seaton Callahan/Getty Images)

Favela contrasta com prédios residenciais, no Rio: Famílias de alta renda ainda estão gastando 11% abaixo das tendências pré-coronavírus; as de baixa, 2% a mais (John Seaton Callahan/Getty Images)

Ligia Tuon

Ligia Tuon

Publicado em 10 de agosto de 2020 às 15h50.

Última atualização em 10 de agosto de 2020 às 16h14.

Enquanto os mais pobres se endividam, os ricos poupam mais.

A tendência que governos e Bancos Centrais tentam amenizar mundo afora desde o começo da crise do coronavírus pode ter sido enfraquecida por ora, mas as chances desse cenário piorar depois do fim dos auxílios emergenciais a empresas e vulneráveis são grandes.

O alerta é feito em relatório da Oxford Economics, que vê o risco de forte deterioração do cenário de desigualdade global nos próximos cinco anos em função da pandemia.

Desigualdade de renda após pandemias: Avanço no índice de Gini (%) (mais alto indica mais desigualdade) (Oxford Economics/Divulgação)

Esse movimento é alimentado desde a década de 1980, de um lado, pela forte migração de receitas à parte mais rica da população, e, de outro, pelo endividamento crescente das famílias mais pobres (veja gráfico mais abaixo):

"As famílias mais pobres gastam mais de sua renda em bens essenciais, como moradia e alimentação básica. Quando sua renda cai, eles ainda precisam gastar com o necessário e, portanto, são frequentemente forçados a se endividar", diz.

Os ricos, por outro lado, geralmente consomem quase a capacidade máxima de seu desejo de consumo, portanto, qualquer receita adicional vai para a poupança para apoio futuro.

Além disso, "evidências de pandemias anteriores apontam para um aumento na desigualdade de renda, uma vez que a carga do ajuste econômico recai desproporcionalmente sobre os trabalhadores pouco qualificados", diz o documento.

Em contextos de pandemia, o trabalho de baixa qualificação também é mais frequentemente prejudicado, em função das políticas de isolamento, que prejudicam a confiança no uso de serviços presenciais:

"Uma característica única desta pandemia é que a capacidade de trabalhar em casa está se revelando um fator chave na determinação das perdas de empregos", diz a Oxford Economics.

Em outras palavras, os postos mais ameaçados são aqueles que não podem ser feitos facilmente em casa (por exemplo, restaurantes), e que também são tipicamente mal pagos.

As perdas entre os mais pobres também foram maiores durante a crise financeira global de 2008.

Efeito vai se perpetuando

Há três formas de descrever a desigualdade numa sociedade, explica a consultoria:

  • De renda, que tem profundas implicações de curto prazo;
  • De riqueza, que resulta no aprofundamento da divisão ao longo do tempo: a renda é gerada e frequentemente consumida durante a vida de uma família. A riqueza, no entanto, pode ser herdada e passada de geração em geração.
  • De consumo, que mostra como o consumo de bens e serviços está espalhado por toda a economia: A queda nos gastos do consumidor nos últimos meses foi muito maior para os grupos de renda mais alta, pois mais gastos podem ser adiados.

Essa última forma de medir desigualdade é importante, pois os gastos são frequentemente suavizados ao longo da vida dos indivíduos por meio de empréstimos, poupanças e auxílios emergenciais e, por isso, podem diferir da renda em alguns momentos.

Famílias de alta renda ainda estão gastando 11% abaixo das tendências pré-coronavírus, em comparação com uma alta de 2% entre as mais pobres.

Histórico

A desigualdade de renda cresceu substancialmente desde a década de 1980 nas economias avançadas, especialmente no Reino Unido e nos Estados Unidos, depois das mudanças tecnológicas no mercado de trabalho e com a fragilidade dos sindicatos, diz a consultoria:

Entre 2017 e o início dos anos 1980, a parcela da renda detida pelo 1% do topo dobrou de 11% nos EUA e 6% no Reino Unido para 21% e 13%, respectivamente.

Nas últimas três décadas, a distribuição de riqueza na França, no Reino Unido e nos EUA também se tornou ainda mais inclinada para o topo da pirâmide social. Em média, os 50% mais pobres tinham apenas 6% da riqueza total em meados dos anos 80; em 2014, isso caiu pela metade para apenas 3%.

Nesse período, a riqueza dos 10% mais abastados cresceu rapidamente de 53% para 71%.

O gráfico abaixo mostra um aumento acentuado nas receitas (linha vermelha) para o 1% mais rico desde a década de 1980, o que contribuiu para que a dívida (linha azul) atingissem níveis que não eram vistos desde Segunda Guerra Mundial:

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Gráfico mostra um aumento acentuado nas receitas para o 1% mais rico desde a década de 1980, o que contribuiu para que a dívida atingisse níveis que não eram vistos desde Segunda Guerra Mundial (Oxford Economics/Divulgação)

 

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