(Pattanaphong Khuankaew/Thinkstock)
João Pedro Caleiro
Publicado em 25 de julho de 2018 às 16h18.
Última atualização em 25 de julho de 2018 às 16h45.
São Paulo - 2018 não está sendo um ano positivo para a conclusão de negociações coletivas entre empresas e trabalhadores.
A quantidade de negociações fechadas caiu 39,6% no primeiro semestre do ano em relação ao mesmo período do ano passado.
Os dados foram divulgados nesta quarta-feira (25) no Salariômetro, relatório feito mensalmente pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), com dados do Ministério do Trabalho e Emprego.
A queda chama a atenção porque as negociações coletivas foram justamente um dos instrumentos mais fortalecidos pela reforma trabalhista, em vigor desde novembro.
A reforma define que decisões de comum acordo entre patrões e trabalhadores possam prevalecer sobre a lei em algumas questões (como banco de horas, trabalho remoto e parcelamento de férias) mas não em outras (como décimo-terceiro salário).
De acordo com Hélio Zylberstajn, professor da FEA-USP e coordenador do projeto, a relação é na direção oposta:
"O número de conclusões está em queda não porque a negociação está fraca, mas porque agora ela é para valer e pode tocar em coisas importantes, que muitas vezes são difíceis de fechar".
Outro fator complicador seria a contribuição sindical. A reforma eliminou o imposto sindical obrigatório, mas sindicatos que conseguiram aprovar a cobrança em assembleia querem incluí-la nos acordos.
No entanto, a reforma define que a autorização para o desconto precisa ser feita expressamente pelo funcionário, uma regra que as empresas não querem assumir o risco jurídico de descumprir.
José Silvestre, coordenador de relações sindicais do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos, nota que a tradição brasileira sempre foi de que os benefícios se estendem a todos, sindicalizados ou não, e que é inviável conseguir autorizações individuais:
"Isso é impossível; só o sindicato dos metalúrgicos tem cerca de 3 mil empresas. A estratégia dos sindicatos é aprovar o desconto em assembleia, valendo para todo mundo respeitando o direito de oposição, mas as empresas não concordam e não fazem o recolhimento".
Outra causa apontada para o travamento das negociações é o fim da chamada ultratividade. Uma súmula do Tribunal Superior do Trabalho (TST) definia que um acordo continuaria valendo após sua data de vigência se nenhum outro fosse negociado no lugar, algo que a reforma eliminou.
"Antes, as empresas não queriam colocar nada novo porque seria para sempre. Agora, há disputa em relação a cláusulas: os trabalhadores não querem perder e as empresas gostariam de tirar alguma coisa. Mas enquanto não fecha, as empresas continuam praticando o acordo velho que já caducou", diz Helio.
Em relação a aumentos salariais, os dados de 2018 mostram que os reajustes medianos foram mais baixos (2,8%) do que no ano anterior (5%).
No entanto, quando comparados com a inflação, o dado muda de direção: a proporção de reajustes acima da inflação (medida pelo INPC) foi maior do que em 2017 (84,6% contra 79,1%).
"Está mais difícil fechar a negociação, mas os aumentos reais são mais frequentes", resume o boletim.
A queda da inflação também é citada por Zylberstajn como um obstáculo para a conclusão das negociações: aomo a alta dos preços estava mais intensa no passado recente, ficou difícil para o líder sindical aceitar um acordo com reajuste muito baixo, ainda que acima da inflação.
José concorda que a questão das negociações não pode ser dissociada da crise econômica, que retira poder de barganha dos trabalhadores, mas acredita que o número de acordos tende a crescer no futuro apesar de ajustes ainda serem necessárias.
"Ainda é cedo para perceber claramente os efeitos e numa conjuntura mais favorável, certamente as negociações teriam outro desfecho. Mas também não dá para imaginar um financiamento sindical só por contribuições espontâneas. Não é assim em nenhuma das economias capitalistas avançadas", diz ele.